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SERMÃO DO DOMINGO DA SEXAGÉSIMA



Fontes Franciscanas
III
SANTO ANTÔNIO DE LISBOA
Volume I
Biografia e Sermões
Livro de 1998
Tradução: Frei Henrique Pinto Rema, OFM



Sermão do Domingo da Sexagésima

SUMÁRIO
Segundo Evangelho, na Sexagésima: Saiu o semeador a semear. Intróito da Missa: Levanta-te: porque dormes senhor?
Epistola: De bom grado suportais.
A história de Noé e sua Arca. Em primeiro lugar, um sermão para os pregadores a respeito do pregador sumo: Semeou Isaac na terra de Gerara.
Um sermão sobre a construção da Arca de Noé e o que ela figura: Faz uma Arca.
Um sermão contra os luxuriosos: E enquanto lança a semente, uma parte caiu junto do caminho.
Um sermão contra os falsos religiosos: E outra parte caiu sobre pedras.
Um sermão contra os avarentos e os usurários: E outra parte caiu entre os espinhos.
Um sermão aos ativos e contemplativos: Uma parte, porém, caiu em boa terra.

Exórdio. Sermão aos pregadores.

1. Saiu o semeador a semear 1.
 Aos pregadores fala Isaias2: Bem-aventurados vós os que semeais sobre as águas. As águas, como diz S. João no Apocalipse 3, são os povos. Deles escreve Salomão nas Parábolas4: Todos os rios saem o mar e ao mar voltam. Nota que é dupla a amargura, a da culpa original e a da morte corporal. Portanto, todos os rios, isto é, todos os povos saem do mar, isto é, da amargura da culpa original. Por isso, pôde dizer David5: Eis que fui concebido na iniqüidade. E o Apóstolo6: Todos nascemos filhos da ira. E voltam ao mar, ou seja, à amargura da morte corporal. Daí o dizer do Eclesiástico7: Quão pesado jugo está sobre os filhos de Adão desde o dia em que eles saem do ventre de sua mãe; e ainda: Ó morte, quão amarga é a tua memória8. Destas duas afirmações diz o Senhor ao pecador: És terra, pela imundície da concepção, e voltarás à terra 9pela incineração do teu corpo. Bem-aventurados, portanto, vós os que semeais sobre as águas.
A semente, como diz Deus no Evangelho de hoje, é a palavra de Deus10. Portanto, para merecer ser bendito entre os bem-aventurados, lançarei entre vós a semente, em nome de Jesus Cristo, que saiu do seio do Pai e veio ao mundo espalhar a sua semente11, porque um e o mesmo é o Deos do Novo e do Velho Testamento12, Jesus Cristo, Filho de Deus. Por isso, diz em Isaías13: Eu mesmo, que falava, eis aqui estou.Eu, que falava aos vossos pais pelos profetas, estou presente pela realidade da Encarnação14. Por isso, façamos concordar ambos os Testamentos em honra dum só Deus, para utilidade dos ouvintes, segundo aquilo que Ele mesmo me conceder. Digamos, pois: Saiu o semeador etc15.

2. No presente domingo, lê-se na Igreja o Evangelho do semeador e da semente, recita-se e canta-se a história de Noé e da construção da arca; e no Intróito da missa canta-se: Levanta-te; porque dormes, Senhor16? e lê-se a Epístola de S. Paulo aos Coríntios17: Suportais de bom grado os insensatos. Em nome do Senhor, portanto, poremos de acordo tudo isto.
Saiu etc. Neste Evangelho são dignas de pôr em relevo seis coisas: o semeador, a semente, o caminho, a pedra, os espinhos e a boa terra. E na história desde dia igualmente se notam seis coisas: Noé e os cinco compartimentos da arca: o primeiro para o esterco, o segundo para o armazém, o terceiro para os animais ferozes, o quarto para os mansos, o quinto para os homens e as aves18. mas atende com muito cuidado que o quarto e o quinto, nesta concordância, se tomam por um só compartimento. Diga-se, portanto: Saiu o semeador etc.

A Arca de Noé e a Igreja de Cristo.
3. O semeador é Cristo ou quem o anuncia; a semente é a palavra de Deus19; o caminho são os luxuriosos; a pedra, os falsos religiosos; os espinhos, os avarentos e os usurários; a boa terra, os penitentes e os justos; e que isto seja verdadeiro provemo-lo com autoridades.
O semeador é Cristo. Lê-se no Gênesis20: Isaac semeou na trra de Gerara e recolheu no mesmo ano o cêntuplo. Isaac interpreta-se gozo21 e simboliza Cristo22, alegria dos santos, que, no dizer de Isaías23, obterão o gozo e a alegria: gozo da humanidade glorificada de Cristo; alegria da visão de toda a Trindade. Este nosso Isaac semeou na terra de Gerara, que se interpreta desterro24, e significa este mundo, do qual o Profeta25escreve: Ai de mim, porque se prolongou o meu desterro, isto é, a minha peregrinação. Na terra de Gerara, portanto, ou seja, neste mundo, semeou três espécies de sementes: a santidade duma vida louvável, a pregação do reino celeste, a operação de milagres.
E no mesmo ano recolheu o cêntuplo. Advirta-se que toda a vida de Cristo se diz ano de perdão e benignidade. Assim como no ano há quatro estações: o Inverno, a Primavera, o Verão e o Outono, também na vida de Cristo houve o inverno da perseguição de Herodes, por causa da qual fugiu para o Egito; a primavera da pregação, e então apareceram as flores26, isto é, as promessas da vida eterna27, e a voz da rola, isto é, do Filho de Deus,se ouviu na nossa terra: Fazei penitência, pois que está próximo o reino dos céus28; o estio da Paixão, de que escreve Isaías29: Meditou no seu espírito austero num dia de ardência. Cristo, num dia de ardência, isto é, da sua Paixão30, meditou no seu espírito austero, inflexível para suportar a Paixão, enquanto pendia na cruz, como condenaria o diabo, livraria o gênero humano do seu poder e infligiria aos pecadores obstinados a pena eterna. Isto dizia noutro lugar o mesmo profeta31: O dia da vingança está no meu coração. Houve o outono da sua Ressurreição, em que, sacudidas as palhas da humilhação e o pó da morte, aquela humanidade, unida ao Verbo, gloriosa e imortal, foi posta de novo no celeiro, isto é, à direita do Pai. Com razão se diz, pois: E no mesmo ano recolheu o cêntuplo, isto é, escolheu os Apóstolos a quem foi dito: Recebereis o cêntuplo32 etc. Ou então, recebeu o cêntuplo, isto é, a centésima ovelha, ou seja, o gênero humano, que transportou, cheio de alegria, sobre os seus próprios ombros pregados à cruz, até a companhia das nove ordens de anjos33. Vê-se, portanto, abertamente que o semeador é Cristo.

4. Este é Noé, a quem disse o Pai: Faz uma arca de madeiras aplainadas; farás na arca uns pequenos compartimentos, e calafetá-los-ás com betume por dentro e por fora. E hás-de fazê-la do seguinte modo: o comprimento da arca será de trezentos côvados, a largura de cinqüenta côvados e a altura de trinta côvados34. Noé interpreta-se descanso35 e significa Jesus Cristo36, que diz no Evangelho37: Vinde a mim todos os que trabalhais no Egito, no lodo da luxúria e no tijolo da avareza, e estais sobrecarregados com o jugo da soberba, e eu vos farei descansar. Este, como se diz no Gênesis38, nos consolou dos trabalhos e das fadigas das nossas mãos, nesta terra que Deus amaldiçoou. A este disse o Pai: Faz para ti uma arca. A arca é a Igreja39. Saiu, portanto, Cristo a semear; saiu também a fabricar a sua Igreja de madeiras aplainadas, isto é, de santos puros e perfeitos; e calafetou-os com o betume da misericórdia e da caridade40: por dentro no afeto, e por fora no efeito das obras. O seu comprimento é de trezentos côvados por causa das três ordens que nela existem: Noé, Daniel e Job, isto é, os Prelados, os célibes e os casados41. A largura de cinqüenta côvados refere-se aos penitentes da mesma Igreja42. Com efeito, no qüinquagésimo dia depois da Páscoa foi conferida aos Apóstolos pelo Espírito Santo a infusão da graça; e no Salmo cinqüenta, Tem piedade de mim, ó Deus,promete-se aos penitentes a remissão dos pecados43. A altura de trinta côvados refere-se aos fiéis da mesma Igreja, por causa da fé na Santíssima Trindade. Saiu, portanto, Cristo do seio do Pai e veio ao mundo para semear e construir a sua Igreja, na qual se conserva a semente não corruptível, mas que permanece por séculos de séculos.

5. Segue acerca da semente: A semente é a palavra de Deus44. Dela escreve Salomão nas Parábolas45: De manhã lança à terra a tua semente. De manhã, isto é, no tempo da graça, que afasta as trevas do pecado. Ó pregador, lança à terra a tua semente da palavra; a tua, sito é, a que te foi confiada. E vê quão devidamente a palavra de Deus se diz semente. Assim como a semente deitada na terra germina e cresce – primeiramente, como diz o Senhor em S. Marcos46, produz a erva, depois a espiga e por último o trigo maduro na espiga –também a palavra de Deus, semeada no coração do pecador, primeiramente produz a erva da contrição47. de que se lê no Gênesis48: Produza a terra, isto é, o espírito do pecador, a erva verde da contrição; depois, a espiga da confissão49, que se levanta ao alto pela esperança de se ver perdoado; por último, o trigo maduro da satisfação50, de que fala o Profeta51: Os vales, isto é, os penitentes humildes, abundarão do trigo da satisfação perfeita, de modo que a pena corresponda à culpa52. Com razão, pois, se diz: Saiu o semeador a lançar a sua semente.

6. Mas porque nem todos possuem a fé, e nem todos obedecem ao Evangelho53, por isso segue: E quando lança a semente, uma parte caiu junto do caminho e foi calcada aos pés e as aves do céu comeram-na54. E o primeiro compartimento na arca de Noé foi a esterqueira. O caminho calcado aos pés, portanto, e a esterqueira significam os luxuriosos. Daí o dito de Salomão nas Parábolas55: A prostituta assemelha-se ao esterco no caminho. E Isaías56 impropera o luxurioso: Puseste o teu corpo como a terra e como o caminho para os transeuntes, isto é, para os demônios57, que ao passarem conculcam a semente para que não germine58. Por isso, diz Isaías noutro lugar59: Será pisada aos pés a coroa de soberba dos bêbados de Efraim. Efraim interpreta-se fértil60 e significa a abundância dos bens temporais. Os bêbados são os luxuriosos, inebriados com o cálix de ouro de Babilônia, isto é, da abundância temporal; a coroa de soberba é o pensamento altivo no coração impuro. Este é pisado aos pés dos demônios, quando desde o pensamento do coração impuro chega até à embriaguez da luxúria; e, desta forma, na terra maldita não pode germinar a semente do Senhor.
 Também os próprios demônios se chamam aves, por causa da soberba61, do céu, isto é, do ar, em que habitam62. Eles comem e arrebatam a semente do coração do luxurioso, para que não frutifique. Donde Oséias63: Os estranhos, isto é, os demônios, comeram a sua força, que é a virtude da palavra divina. Não se diz que tivesse caído no caminho, mas junto do caminho, porque o luxurioso não recebe a palavra dentro do ouvido do coração, mas passa-lhe levemente junto do ouvido do corpo, como se fora mero som. Estes são os compartimentos da esterqueira, que apodreceram como jumentos no seu esterco64, dos quais diz o Salmo65:Foram destruídos em Endor, que se interpreta fogo de geração66, ou seja, foram destruídos no ardor da luxúria; tornaram-se como esterco da terra. Deste esterco geram-se quatro vermes: a simples fornicação, o adultério, o incesto, o pecado contra a natureza. A simples fornicação, solteiro ou solteira, é pecado moral; e fornicação significa morte da forma, morte da alma, formada à semelhança de Deus. O adultério é uma espécie de aproximação ao tálamo de outrem. O incesto é o abuso de consangüíneas ou afins67, Há pecado contra a natureza quando de qualquer modo se derrama sêmen fora da matriz da concepção, isto é, fora do útero da mulher. Todos estes são caminho conculcado pelo demônio e esterqueira. E por esta causa, a semente da palavra divina desaparece neles, e o diabo arrebata o que fora semeado.

7. Segue: E outra caiu em lugar pedregoso; e uma vez nascida secou, porque lhe faltava umidade68. e o segundo compartimento na arca de Noé foi o armazém. A pedra e o armazém significam os falsos religiosos: pedra, porque se gloriam da excelência da sua religião; armazém, porque vendem as mercadorias da sua vida pelo dinheiro do louvor humano. Diga-se portanto: E outra caiu sobre terreno pedregoso. Dele fala o profeta Abdias69, improperando o religioso soberbo: A soberba do teu coração elevou-te, a ti que habitas nas fendas do rochedo. Soberba70 vem de super (sobre) e de eo, is (ir); e o soberbo como que caminha sobre si. A soberba do teu coração, ó religioso, elevou-te, isto é, levou-te para fora de ti, para que vãmente caminhasses sobre ti, tu que habitas nas fendas do rochedo. A pedra é qualquer religião da Igreja. Dela escreve Jeremias71: Nunca faltará neve nos penhascos do campo. O campo é a Igreja; o penhasco do campo é a religião fundada sobre o rochedo da fé. A neve é a alvura do entendimento e do corpo, que não deve nunca abandonar a religião. Mas, ai! ai! quantas fendas, quantos cismas, quantas divisões e dissensões existem no rochedo, isto é, na religião! Se a semente da palavra divina cair sobre ela, não frutifica, porque não possui a umidade da graça do Espírito Santo, que habita, não nas fendas da discórdia, mas na mansidão da unidade. Entre eles, escreve S. Lucas72,havia uma só alma e um só coração. Na religião há fendas, de verdade, porque há contenda no capítulo, dissonância no coro, murmuração no claustro, gastrimargia73 no refeitório, petulância da carne no dormitório. Com muita razão, pois, diz o Senhor: E outra caiu sobre terreno pedregoso, e uma vez nascida secou, porque,como escreve S. Mateus74, não tinha raiz, ou seja, humildade, raiz de todas as virtudes75. Disto abertamente se conclui que a fenda da religião se abre com um coração soberbo. A religião não pode produzir fruto, porque não tem em si a raiz da humildade.
 Tal religião é o armazém; de fato, depois das dissidências internas, procuram os louvores externos. Com efeito, na praça pública, os falsos religiosos vendem, como se fossem comerciantes, gêneros sofísticos; sob o hábito religioso e à sombra de falso nome apetecem ser louvados, revestem certo fingimento pessoal de perfeição junto dos homens; querem parecer santos, mas não o querem ser. infelizmente, a religião, que devia conservar as mercadorias das virtudes, os aromas dos costumes, é destruída e transforma-se em armazém público. Daí, a deploração de Joel76: Foram demolidos os celeiros, isto é, os claustros dos cônegos, arruinados os armazéns, isto é, as abadias dos monges, porque se perdeu o trigo. No trigo, alvo no interior e avermelhado na casca, significa-se a caridade, que mantém a pureza para consigo e o amor para com o próximo. Por isso, este trigo perdeu-se, por ter caído sobre terreno pedregoso; e uma vez nascido secou, porque não ter raiz da humildade nem a humildade da graça septiforme. Daqui se deduz que da perda do trigo, isto é, da falta de caridade, se destrói o armazém de toda a religião.

  8. Segue: E outra caiu entre espinhos; e cresceram ao mesmo tempo e sufocaram-na77 Lc 8, 7 (Vg... exortae spinae...).. E no terceiro compartimento na arca de Noé foi o dos animais ferozes. Vê quão bem concordam os espinhos e os animais ferozes, que simbolizam os avarentos e os usurários: espinhos, porque a avareza seduz, fere e faz sangue; animais ferozes, porque a usura arrebata e estrangula. Diz, por isso, o Senhor: E outra caiu entre os espinhos, os quais, como Ele mesmo glossa, são as riquezas78, que seduzem o homem e o retardam. Para que Pedro, seduzido por elas, não fosse retardado, diz ao Senhor: Eis que nós deixamos tudo e te seguimos79. Comentário de S. Bernardo80: Procedeste retamente, Pedro, pois carregado não podias seguir o corredor.
 Os espinhos também ferem. Donde Jeremias81: O Egito é um novilha elegante e formosa; do Aquilão virá quem a aguilhoe. O Egito, que se interpreta trevas82, é o avarento, rodeado das trevas da ignorância. Chama-se-lhe novilha por dois motivos: a lascívia da carne a instabilidade do entendimento; é elegante, por causa da multidão dos filhos e dos vizinhos; é formosa, por causa da posse de propriedades e beleza de vestidos. Do Aquilão vem o diabo, que aguilhoa esta novilha. Da parte do Aquilão,na frase de Jeremias83, manifesta-se todo o mal; e com o aguilhão da avareza espicaça-a, a fim de correr por aqui e por acolá a ajuntar espinhos, isto é, riquezas. Sobre eles escreve Isaías84: Os espinhos reunidos serão queimados pelo fogo.
 O espírito fere e ferindo faz sangue85: Toda a alma, diz Moisés86, existe ou vive no sangue; o sangue da alma é a virtude, em que vive a alma. O avarento perde, portanto, a vida da alma, isto é, a virtude, quando deseja reunir riquezas. Donde a afirmação do Eclesiástico87: Não há coisa mais iníqua do que amar o dinheiro. Ele despoja-se em sua vida das próprias entranhas, isto é, das virtudes88.
 Sobre isto acrescenta o Senhor: E cresceram ao mesmo tempo os espinhos e sufocaram-na. Daí a palavra de Oséias89: Sobre os seus altares crescerão a lapa e os abrolhos. A lapa é uma erva que se apega aos vestidos90; os abrolhos, de tribulo, tribulas (atribular), chamam-se assim, porque atribulam quando ferem. A lapa, portanto, e os abrolhos, para o homem, são as riquezas, que se lhe apegam quando passa e o atribulam. Crescem sobre os seus altares, isto é, sobre os corações dos avarentos, em que deve oferecer-se a Deus um sacrifício, a saber, o espírito contribulado91. E sufocam a semente da palavra de Deus e o sacrifício do espírito contribulado.

9. Estes espinhos e os animais ferozes, conforme dissemos, significam, para nós, os pérfidos usurários. Deles escreve o Profeta92: É teu este mar tão grande e de longos braços; nele pululam répteis sem número, animais pequenos e grandes. Pelo meio deles transitarão os navios. Nota as palavras: Este mar é o mundo cheio de amargura; é grande, por suas riquezas; largo por suas delícias, porque largo é o caminho que conduz à morte93. Mas para quem? Não para os pobres de Cristo, que entram pela porta estreita94, mas para as mãos dos usurários, mãos que já se apoderaram do mundo inteiro. É a sua usura que empobrece as igrejas, despoja os mosteiros dos seus bens. Por isso, o Senhor se queixa deles por boca de Joel95: Um povo forte e inumerável invadirá a minha terra; os seus dentes serão como os do leão, os seus queixais como os dum leãozinho. Este povo reduziu a minha vinha a um deserto e tirou a casca à minha figueira; ele a despojou inteiramente; os seis ramos tornaram-se brancos.
 Um povo maldito de usurários, forte e inumerável, cresceu sobre a terra. Os seus dentes são como os dentes dum leão. Nota duas propriedades no leão: um pescoço inflexível, feito dum só osso96, e o fedor dos dentes97. Assim o usurário é inflexível, porque não reverencia a Deus nem teme o homem98; os seus dentes cheiram mal, por motivo de existir sempre na sua boca o estrume da pecúnia e o esterco da usura. Os seus queixais são como leãozinhos, porque arrebata, mastiga e devora os bens dos pobres, dos órfãos e das viúvas. Ele reduz a vinha, isto é, a Igreja do Senhor, a um deserto, ao reter as suas propriedades com usuras, e tira a casca da figueira do Senhor, isto é, a cada de alguma comunidade, e despoja-a inteiramente ao apropriar-se, por usuras, dos bens oferecidos pelos fiéis à mesma comunidade. E, por isso, os seus ramos tornaram-se brancos, isto é, os monges e os cônegos, ali professos, são mortificados pela fome e pela sede. Eis as mãos que distribuem esmolas! Nelas foi encontrado o sangue dos pobres. Deles ainda se ajunta no Salmo: Ali, isto é, no mundo,existem répteis sem número etc.
 Nota aqui três gêneros de usurários: Há quem pratique a usura à socapa: são os répteis, que se escondem e rastejam e são inumeráveis. Há outros que procedem abertamente, mas não em grande quantidade, a fim de parecerem misericordiosos: são os animais pequenos. Outros são pérfidos, desesperados, e usurários profissionais, que recebem e praticam a usura diante de todos, às claras, como em plena praça pública: são os animais grandes, mais cruéis que os restantes. Mas o caçador, o diabo, os apanhará e os abaterá com o machado da morte eterna, a não ser que restituam o mal adquirido e façam depois penitência. E para que a possam fazer, os navios, isto é, os pregadores da Igreja, devem transitar e lançar a semente da palavra de Deus para o meio deles. Mas por exigência dos nossos pecados, os espinhos das riquezas e os animais ferozes das usuras sufocam a palavra tão constantemente semeada, e por este motivo não produzem fruto de penitência.

10. Segue: E outra caiu em terra boa, e uma vez nascida deu fruto99, uma trinta, outra sessenta e outra cem100. E o quarto compartimento na arca de Noé foi o dos animais mansos, e o quinto o dos homens e das aves. Vede, caríssimos, que nas sobreditas três coisas: no caminho dos luxuriosos, que é a esterqueira, no rochedo dos soberbos religiosos, que é o armazém, nos espinhos dos avarentos e dos usurários, que são os animais ferozes, não pode frutificar a semente da palavra de Deus. E, por isso, os fiéis da Santa Igreja, no Intróito da missa de hoje, clamam no Senhor: Levanta-te, porque dormes101?
 Nota que dizem três vezes: Levanta-te, por causa destes três objetos: o caminho, o rochedo e os espinhos.Levanta-te, portanto, Senhor, contra os luxuriosos, caminho do diabo, que, por dormirem no peado, crêem que tu dormes. Levanta-te contra os falsos religiosos, que são como pedra sem a umidade da graça. Levanta-tecontra os usurários, que são como espinhos pungentes, e ajuda a livrar-nos102 das suas mãos. Nestes três objetos, a semente da tua palavra, Senhor, não pode frutificar, mas quando caiu em boa terra, produziu fruto.

11. E vê como concordam bem a terra boa, os animais mansos, os homens e as aves, que significam os justos e os penitentes, os ativos e os contemplativos. A boa terra, que o Senhor abençoou, é o entendimento do justo, do qual se escreve no Salmo103: A terra toda te adore e te cante salmos; cante um salmo ao teu nome. A terra toda compreende o Oriente, o Ocidente, o Aquilão (Norte) e o Austral (Sul). De fato, o entendimento do justo deve ser terra oriental, pela consideração do seu nascimento; ocidental, pela lembrança da sua morte; aquilonar (norte), considerando as tentações e misérias deste mundo; austral (sul), pela contemplação da felicidade eterna. Portanto, a terra toda, isto é, o entendimento bom do justo, te adore, ó Deus, em espírito e verdade104 e de coração contrito: este é o fruto a trinta por um; e te cante salmos na confissão do teu nome e na acusação do seu crime: este é o fruto a sessenta por um. Nestas duas coisas devemos cantar salmos a Deus nos seis dias de vida laboriosa. E cante um salmo ao teu nome na satisfação de obra e na perseverança final: e este é o fruto a cem por um e número perfeito.

12. Por outras palavras: A boa terra é a Santa Igreja105, a arca de Noé106, que em si contém animais mansos, homens e aves. Os animais mansos significam os fiéis casados que se aplicam a obras de penitência, dão do seu aos pobres, a ninguém lesam107. Deles escreve o Apóstolo108 na Epístola de hoje: De bom grado sofreis os insensatos, sendo vós mesmos sensatos. Porque sofreis quem vos põe em escravidão, quem vos devora, quem vos rouba, quem se exalta, quem vos dá na cara.Estes produzem fruto a trinta por um. Os homens significam os continentes e os ativos, que verdadeiramente são homens, por usarem da razão; estes submetem-se ao trabalho da vida ativa, expõem-se ao perigo a favor do próximo, pregam a vida eterna pelo exemplo e pela palavra, vigiam-se a si e aos seus súditos109. estes, como ajunta o Apóstolo110, vivem no trabalho e na aflição, em muitas vigílias, na fome e na sede, em muitos jejuns, no frio e na nudez, etc.: E estes produzem fruto a sessenta por um.  As aves na parte superior da arca significam as virgens e os contemplativos, que, elevados ao ar por meio das penas das virtudes, contemplam111 o rei na sua glória112. Não digo que eles sejam arrebatados no corpo, mas em espírito são arrebatados na contemplação ao terceiro céu113, contemplando com a sutiliza do espírito a gloria da Trindade. Ali escutam com o ouvido do coração o que não podem exprimir em palavra114, nem ainda compreender com o entendimento: E estes são os que rendem cem por um.
 Rogamos-te, pois, Senhor Jesus, que nos faças terra boa, capaz de receber a semente da tua palavra e produzir fruto digno de penitência115, para que possamos viver eternamente na tua glória. Auxilia-nos, tu que és bendito por séculos de séculos. Assim seja.

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1.Lc 8, 5.
2.Is 32, 20 (Vg... super omnes...).
3.Cf. Ap 17, 15
4.Cf. Ecle 1, 7.
5.Sl 50, 7 (Vg. Ecce enim...).
6.Cf. Ef 2, 3.
7.Cf. Ecli 41, 1.
8.Ecli 41, 1.
9.Cf. Gen 3, 19 e Glo. Ord., ibi.
10.Lc 8, 11.
11.Glo. Ord., Lc 8, 5.
12.Cf. INOC., Epístola 196, PL 218, 1510
13.Is 52, 6.
14.Cf. Glo. Int., ibidem.
15.Os três últimos parágrafos refletem dependência de AGOST,. Sermo ad populum, c. 1, PL 38, 24.
16.Sl 43, 23
17.2Cor 11, 19.
18.Cf. Glo. Ord., Gen 6, 14.
19.Cf. Glo. Ord., Mt 13, 4.
20.Gen 26, 12 (Vg. omite, muda).
21.Glo. Int., Gen 24, 3.
22.Glo. Int., Gen 26, 12.
23.Is 35, 10.
24.JERON., De nominibus hebracis, PL 23, 823.
25.Sl 119, 5 e Glo. Int., ibi.
26.Cant 2, 12 (Vg. muda).
27.Cf. Glo. Int., ibidem
28.Mt 4, 17.
29.Is 27, 8.
30.Glo. Int., ibidem.
31.Is 63, 4 (Vg. Dies enim...).
32.Cf. Mt 19, 29.
33.Cf. Glo. Ord., Lc 15, 4-6.
34.Gen 6, 14-15.
35.Glo. Ord., Gen, 5, 32.
36.Cf. Glo. Int., ibidem
37.Mt 11, 28.
38.Gen 5, 29 (Vg. Iste consolabitur nos...).
39.Cf. Glo. Int., Gen 6, 14.
40.Cf. Glo. Int., ibidem.
41.Cf. Glo. Ord., Job 1, 1; Ez 14, 14. Repare-se nas categorias de pessoas existentes na Igreja: prelados (a hierarquia), os célibes (sacerdotes e religiosos) e os casados
42.Cf. Glo. Ord., Gen 6, 15.
43.Cf. Glo. Ord., Is 3, 3.
44.Lc 8, 11.
45.Ecle 11, 6.
46.Mc 4, 28 (Vg. primum...).
47.Cf. Glo. Ord e Int., ibidem.
48.Gen 1, 11.
49.Cf. Glo. Ord e Int., Mc 1, c.
50.Cf. Glo. Ord e Int., ibidem.
51.Sl 64, 14; cf. Glo. Ord., ibi.
52.Cf. P. LOMB., Sent. IV, dist 16, 2, p. 840.
53.Rom 10, 16 (Vg. muda).
54.Lc 8, 5.
55.Cf. Ecli 9, 10 (Vg. ajunta).
56.Is 51, 23.
57.Glo. Int., ibidem.
58.Cf. Lc 8, 12.
59.Is 28, 3.
60.Cf. Glo. Int., Gen 41, 52.
61.Cf. GREG., Moralium XIX, 1, 2, PL 76, 95-96.
62.Cf. Glo. Ord., Lc 8, 5.
63.Os 7, 9 (Vg. Comederunt alieni...).
64.Joel 1, 17.
65.Sl 82, 11.
66.Glo. Ord.,Sl 82, 9.
67.P. LOMB., Sent. IV, dist 41- 7-8, p. 986.
68.Lc 8, 6.
69.Ab 1 3 (Vg... in scissuris petrarum.).
70.Cf. GREG., Moralium XIX, 1, 2, PL 76, 96.
71.Cf. Jer 18, 4.
72.Atos 4, 32 (Vg. muda).
73.A mesma palavra, mas a principiar por c, aparece no sermão do quarto domingo depois de Pentecostes. Significa ela a concuspiscência da gula. O original grego utilizado pelo Santo é mais expressivo.
74.Mt 13, 6 (Vg. non habebant...).
75.BERN., In die Paschae sermo 3, PL 183, 275.
76.Joel 1, 17.
77.Cf.Lc 8, 7 (Vg…exortae spinae…)
78.Cf. Lc 8, 14; Mt 13, 22.
79.Mt 19, 27.
80.O texto não é de S. Bernardo, sim do Abade GODOFREDO, a quem pertence a autoria de Declamationes 2, PL 184, 438.
81.Jer 46, 20 (Vg. muda).
82.Glo. Ord., Is 19, 1.
83.Jer 1, 14.
84.Is 33, 12 (Vg... igni...).
85.Cf. GREG., In Evangelia homilia 15, 1, PL 76, 1131.
86.Cf. Lev 17, 14.
87.Ecli 10, 10.
88.Ecli 1. c. e Glo. Int., ibidem.
89.Os 10, 8 (Vg. ajunta).
90.Cf. ISID., Etym., XVII, 9, 66, PL 82, 631.
91.Sl 50, 19.
92.Sl 103, 25-26.
93.Cf. Mt 7, 13.
94.Cf. Mt 1. c.
95.Joel 1, 6-7 (Vg. muda).
96.Cf. ARIST., De part. an., IV, 10, 686ª, 21-22.
97.Cf. ARIST., De hist. an., VIII, 5, 594b, 26-27.
98.Cf. Lc 18, 2.
99.Lc 8, 8.
100.Mt 13, 8 (Vg. muda).
101.Sl 3, 23.
102.Sl 43, 26 (Vg. muda).
103.Sl 65, 4.
104.Jo 4, 23.
105.Cf. Glo. Ord. e Int., Job 26, 7.
106.Cf. Glo. Int., Gen 6, 14.
107.Cf. Glo. Ord., Gen 6, 15.
108.2Cor 11, 19-20.
109.Cf. Glo. Ord., Gen 1. c.
110.2Cor 11, 27.
111.Cf. Glo. Ord., Gen 1. c.
112.Is 33, 17.
113.Cf. 2Cor 12, 2.
114.Cf. 2Cor 12, 4.
115.Mt 3, 8.



Sermão do Domingo da Septuagésima

Fontes Franciscanas
III
Santo Antônio de Lisboa
Volume I
Biografia e Sermões
pelo Frei Henrique Pinto Rema, OFM
 Livro de 1998

  

SERMãO DO DOMINGO DA SEPTUAGÉSIMA

       Desde o século IX que no Ocidente o Ano Litúrgico começa no primeiro Domingo do Advento. O Doutor Evangélico escolhe a Septuagésima para iniciar o seu Opus muito provavelmente por nesta semana se ler o Genesis, primeiro livro da Bíblia, consoante consta da reforma do Papa Inocêncio III, entre 1213 e 1216,  reforma essa que mais tarde foi adotada pelo Ordo franciscano. Cf. Atas 1981 p.113.
        Os sermões da Septuagésima ao Pentecostes devem ter sido redigidos em definitivo talvez em 1224 ou, mais provavelmente, no biênio 1223-1224. Cf. Atas 1981 p.128.

SUMÁRIO
Primeiro Evangelho, na Septuagésima:
Reino dos Céus é semelhante a um pai de família.
Divide-se em duas cláusulas.

Intróito da Missa:
Rodearam-me.

Epistola:
Ignorais acaso que os corredores do estádio.

Fato histórico:
No princípio criou Deus o céu e a terra.

1 - Na primeira cláusula deste Evangelho podem-se encontrar pelo menos os seguintes argumentos de Sermões ou assuntos de prédicas:
Em primeiro lugar, o sermão para formar o coração do pecador acerca das propriedades do tijolo:
Pega um tijolo.
Um sermão acerca dos sete artigos da fé:
No primeiro dia, disse Deus: Faça-se a luz.
Um sermão para o Natal do Senhor: 
No primeiro dia, disse Deus: Faça-se luz.
Um sermão acerca do Batismo e daqueles que violam as promessas nele feitas:
Faça-se o firmamento.
Um sermão acerca da Paixão de Jesus Cristo e da fé da Igreja:
Produza a terra.

2 - Na segunda cláusula do Evangelho:
Em primeiro lugar um sermão aos penitentes sobre o coração contrito:
Entrando Saul.

Um sermão contra os ricos:
Senhor preparou um verme.

Um sermão aos que se confessam:
Faça-se firmamento.

Um sermão aos penitentes e aos claustrais:
Quem pôs o ónagro em liberdade.

Um sermão acerca do amor de Deus e do próximo:
Façam-se dois luzeiros.

Desta mesma sentença se pode elaborar um sermão para a festa dos apóstolos S. Pedro e S. Paulo:
Pedro foi o luzeiro maior, que presidiu ao dia, isto é, aos judeus:
S. Paulo o luzeiro menor, que presidiu à noite, isto é, aos gentios.

Um sermão aos contemplativos e acerca da propriedade da ave:
O homem nasce para o trabalho.

Um sermão acerca da dupla glorificação:
Da alma e do corpo: Será mês de mês


Exórdio. Sermão para formar o coração do pecador

1. No princípio criou Deus o céu e a terra 1.
A Ezequiel2, ou seja, ao pregador3, fala o Espírito Santo: E tu, filho do homem, pega num tijolo e desenha nele a cidade de Jerusalém. O tijolo, pelas quatro propriedades que possui, significa o coração do pecador4. Forma-se de duas tábuas5, é levado a uma extensão determinada, consolida-se pelo fogo, torna-se vermelho. Também o coração do pecador deve formar-se entre as duas tábuas de ambos os Testamentos. De fato, no meio dos montes, isto é, dos dois Testamentos, como diz o Profeta6, passarão as águas, a saber, as águas da doutrina7. E diz bem: forma-se, pois que o pecador, deformado pelo pecado, recebe forma pela pregação de ambos os Testamentos. O tijolo é levado a uma extensão determinada, já que a amplidão da caridade alarga o coração estreito do pecador. Donde a palavra do Salmo8: O teu mandamento é imensamente grande; e a caridade é a mais larga do que o oceano. O tijolo consolida-se pelo fogo, uma vez que o espírito, cheio de humores e dissolúvel, através do fogo da tribulação se consolida, a fim de que não se derrame no amor das coisas temporais, porque, na frase de Salomão9, o que a fornalha faz ao ouro, a lima ao ferro, o mangual ao grão, isto faz a tribulação ao justo. O tijolo torna-se vermelho. Nisto se nota a audácia do zelo santo, de que fala o Profeta10: O zelo da tua casa, isto é, da Igreja ou da alma fiel, devorou-me. E Elias11: Ardo de zelo pela casa de Israel.
No tijolo, portanto, notam-se quatro coisas: A ciência de cada um dos Testamentos, para instrução do próximo; a abundância da caridade, para o amar; a paciência da tribulação, para suportar o opróbrio por amor de Cristo; a audácia do zelo, para dar cabo de todo e qualquer mal. Pega, conseguintemente, num tijolo e desenha nele a cidade de Jerusalém.

2. A Jerusalém espiritual é tripla: a primeira é a Igreja militante; a segunda, a alma fiel; a terceira, a pátria celeste12. Pegarei, portanto, em nome do Senhor, num tijolo, isto é, no coração de qualquer ouvinte, e desenharei nele a tripla cidade, isto é, os artigos (da fé) da Igreja, as virtudes da alma, os prêmios da pátria celeste, sob o número sete13, trazendo à colação sentenças de ambos os Testamentos, e expondo-as.

I – Os sete dias da criação e os sete artigos da fé

3. No princípio criou Deus o céu e a terra, etc. Entenda-se o continente e o conteúdo14. Deus Pai, no princípio, ou seja, no Filho, criou e recriou15. Criou em seis dias, descansando ao sétimo; recriou com seis artigos da fé, prometendo no sétimo o descanso eterno.

No primeiro dia disse Deus: Faça-se a luz, e a luz foi feita16. O primeiro artigo de fé é a Natividade. No segundo dia, disse Deus: Faça-se o firmamento no meio das águas e separe umas águas de outras águas17. O segundo artigo da fé é o Batismo. No terceiro dia, disse Deus: Produza a terra erva verde e que dê semente, e árvores frutíferas que produzam fruto segundo a sua espécie18. O terceiro artigo é a Paixão. No quarto dia, disse Deus: Façam-se dois grandes luzeiros no firmamento19. O quarto artigo é a Ressurreição. No quinto dia, fez Deus os voláteis no ar20. O quinto artigo é a Ascensão. No sexto dia, disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem e semelhança; e inspirou no seu rosto o sopro de vida, e o homem tornou-se alma vivente21. O sexto artigo é o envio do Espírito Santo. No sétimo dia, Deus descansou de todas as obras que tinha feito22. O sétimo artigo é a vinda a juízo, em que descansaremos de todas as nossas obras e fadigas.

Invoquemos, portanto, o Espírito Santo, amor e união entre o Pai e o Filho, para que nos conceda unir e concordar de tal modo os sete dias e sete artigos, que daí lhe provenha honra e edificação para a sua Igreja.

4. No primeiro dia, disse Deus: Faça-se a luz, etc. Esta luz é a sabedoria de Deus Pai a iluminar todo o homem que vem a este mundo23, e que habita uma luz inacessível24. Dele diz o Apóstolo aos Hebreus25: Ele é o resplendor e a figura da sua substância; e o Profeta26: Na tua luz veremos a luz; e no livro da Sabedoria27: A sabedoria é o candor da luz eterna. Desta, pois, disse o Pai: Faça-se a luz, e a luz foi feita. Isto mais abertamente glossa S. João, ao referir: O Verbo se fez carne e habitou entre nós28. E Ezequiel29, com o mesmo pensamento, mas com diferentes palavras, afirma: Fez-se sentir sobre mim a mão do Senhor, isto é, o Filho, no qual e pelo qual tudo foi feito. A luz, por conseguinte, que era inacessível e invisível, fez-se visível na carne, iluminando o que se sentava nas trevas e na sombra da morte30. Sobre esta iluminação conta o quarto evangelista31 que Jesus cuspiu em terra, fez lodo e limpou os olhos do cego de nascença. A saliva, que desce da cabeça do Pai, significa a sabedoria32. A cabeça de Cristo, diz o Apóstolo, é Deus33. A saliva une-se, portanto, ao pó, isto é, a divindade une-se à humanidade, a fim de que se faça luz nos olhos do cego de nascença, que é o gênero humano, feito cego no primeiro pai34. Disto se deduz claramente que no dia em que Deus pronunciou: Faça-se a luz, nesse mesmo dia, isto é, no domingo, a Sabedoria de Deus Pai, o nascido da Virgem Maria, afugentou as trevas existentes sobre a face do abismo35, quer dizer, do coração humano. Por isso, nesse mesmo dia, canta-se na Missa da Luz36: A luz refulgirá, etc37; e no Evangelho38: Uma luz do céu rodeou os pastores.

5. No segundo dia disse Deus: Faça-se o firmamento no meio das águas e separe umas águas de outras águas39. O firmamento no meio das águas é o batismo a dividir as águas superiores das inferiores, isto é, os fiéis dos infiéis. E com razão se dizem águas inferiores, porque se dirigem a coisas inferiores e se abandonam diariamente às suas fraquezas. Porém, as águas superiores significam os fiéis, que, segundo o Apóstolo40, devem procurar as coisas que são do alto, onde está Cristo sentado à direita de Deus.

E nota que estas águas se chamam cristalinas, pois o cristal, atingido ou ferido pelos raios do sol, transmite centelhas ardentes41. Assim, o varão fiel, iluminado pelos raios do sol, deve emitir centelhas de reta pregação e de boas obras que inflamem o próximo. Mas, ai! ai! rompido o firmamento, as águas superiores precipitar-se-ão no mar morto, entrando juntamente com os mortos. Daí a afirmação de Ezequiel 42: Estas águas que saem do túmulo da areia oriental e que descem para a planície do deserto, entrarão no mar. O túmulo significa a contemplação, na qual, como em túmulo, se sepulta e esconde um morto Cf. 43. O homem contemplativo, morto para o mundo, sepulta-se e esconde-se da conturbação dos homens. Daí o dizer Job 44: Entrarás com abundância no sepulcro, como se recolhe um monte de trigo a seu tempo. O justo, na abundância da graça que lhe foi conferida, entra no sepulcro da vida contemplativa, tal como o monte de trigo entra a seu tempo no celeiro. Sacudidas, pois, as palhas dos bens temporais, o seu entendimento põe-se no celeiro da plenitude celeste; e uma vez ali posto, sacia-se com a sua doçura.

6. E observa que este túmulo se chama areia oriental. A areia designa a penitência. Por isso, lê-se no Êxodo 45que Moisés escondeu na areia um egípcio morto. Efetivamente, o justo deve matar o pecado mortal na confissão e escondê-lo depois na satisfação da penitência, a qual deve sempre olhar para aquele oriente de que fala Zacarias 46: Eis o homem cujo nome é Oriente.

Diga-se: Estas águas que saem do túmulo da areia oriental, etc. Ai! quantas águas, quantos religiosos saem do túmulo da vida contemplativa da areia da penitência, do oriente da graça! Saem, digo, da casa paterna com Dina e Esaú 47, saem da face divina com o diabo e Caim 48, saem da escola de Cristo com o traidor Judas, portador da bolsa 49, e descem para a planície do deserto, para o campo da solidão de Jericó, onde, como refere Jeremias, Nabucodonosor, isto é, o diabo, na largueza dos bens temporais, arranca os olhos a Sedecias. Este é o pecador, privado da luz da razão, ao qual matam os próprios filhos, ou seja, o diabo lhe destrói as próprias boas obras 50.

Nesta planície, Caim, que se interpreta possessão51, matou Abel, que se interpreta luto52, porque a possessão da transitória abundância mata o luto da penitência. Descem, portanto, as águas para a planície do deserto. Por isso, diz-se no Gênesis 53 que tendo partido do oriente para o ocidente, encontraram uma planície na terra de Senaar. Do oriente da graça para o ocidente da culpa partem os filhos de Adão, e logo que encontram a planície do gozo mundano, habitam na terra de Senaar, que se interpreta fedor54. No fedor, pois, da gula e da luxúria edificam a casa do seu viver, não como cristãos, mas como pagãos que em vão receberam o nome do seu Deus, como diz o Senhor no Êxodo 55: Não tomes o nome do teu Deus em vão. Tomam em vão o nome de Deus os que trazem consigo, não a realidade do nome, mas o nome sem a realidade; e assim entram no mar, isto é, na amargura dos pecados, para desta chegarem depois à amargura dos tormentos.

Mas Deus fez o firmamento do Batismo no meio das águas para as dividir uma das outras; mas estes pecadores, como diz Isaías 56, transgrediram as leis, mudaram o direito, romperam a aliança eterna. Por isso, a maldição devorará a terra, e pecarão os seus habitantes; e por esta causa se tornarão insensatos os seus cultivadores. Transgridem as leis da letra e da graça, porque não querem guardar nem a lei da letra, como servos, nem a lei da graça, como filhos; mudam o direito natural, que é: Não faças aos outros o que não queres que te façam a ti 57; rompem a aliança eterna que contraíram no Batismo. Por isso, a maldição da soberba devorará a terra, isto é, os terrenos, e os seus habitantes pecarão com o pecado da avareza; aos quais se diz no Apocalipse 58: Ai dos que habitam sobre a terra!; e se tornarão insensatos os que a cultivam com o pecado da luxúria, que é insensatez e demência.

7.  No terceiro dia, disse Deus: Produza a terra erva verde 59 etc. A terra, de tero, teris (esmagar) 60, é o corpo de Cristo Cf. 61, esmagado, na frase de Isaias 62, por causa dos nossos pecados; e esta terra foi escavada e lavrada por pregos e pela lança. Dela se diz: A terra escavada dará frutos no tempo desejado. A carne escavada de Cristo deu o reino celeste 63; produziu erva verde nos Apóstolos, semente de pregação nos mártires e árvores a darem frutos nos confessores e virgens. A fé, na primitiva Igreja, era como que erva tenra; por isso, diziam os Apóstolos nos Cânticos 64: A nossa irmã, isto é, a primitiva Igreja, é pequenina pelo número de fiéis, e não tem seios com que aleitar os seus filhos. De fato, ainda não fora engravidada pelo Espírito Santo. E por isso diziam: Que faremos à nossa irmã no dia do Pentecostes, em que deverá falar a linguagem do Espírito Santo? Desta fala disse o Senhor no Evangelho: Ele vos ensinará todas as coisas e sugerir-vos-á, isto é, subministrar-vos-á65, todas as coisas 66.

8. No quarto dia, disse Deus: Façam-se dois luzeiros no firmamento. No firmamento, isto é, em Cristo, já glorificado pela ressurreição 67, existiram dois luzeiros: a claridade da ressurreição, que se nota no sol, e a incorruptibilidade da carne, que se nota na lua, tendo em conta o estado do sol e da lua antes da queda do primeiro pai, por causa de cuja desobediência todas as criaturas padecem detrimento. Donde a palavra do Apóstolo 68: Todas as criaturas gemem e estão como que com dores de parto até agora.

9. No quinto dia, fez Deus as aves do céu; com isto concorda fielmente o quinto artigo, a saber, a Ascensão, em que o Filho de Deus, semelhante a uma ave, com a carne assumida, voou para a direita do Pai. Por isso, diz ele mesmo em Isaias 69: Eu chamo do oriente uma ave, e de uma terra longínqua o varão da minha vontade. Chamo do oriente, ou seja, do monte das Oliveiras, que se encontra a oriente, do qual se diz: O que sobe sobre o céu do céu 70, isto é, à igualdade do Pai Cf. 71; uma ave, isto é, o meu Filho 72; e duma terra longínqua, isto é, do mundo73, o varão da minha vontade, que disse: O meu alimento é fazer a vontade do meu Pai, que me enviou 74

10. No sexto dia, disse Deus: Façamos o homem, etc. O sexto artigo da fé é o envio do Espírito Santo. Neste envio, a imagem de Deus, deformada e deturpada no homem, é reformada e iluminada mediante a inspiração do Espírito Santo, que inspirou no rosto do homem o sopro da vida 75, como se refere nos Atos dos Apóstolos 76: E, de repente, veio do céu um estrondo, como de vento veemente.

E nota que bem se diz veemente o Espírito Santo, por tirar o ai eterno, ou por levar para as alturas o espírito. Daí a palavra do profeta David 77: Gravada está sobre nós, Senhor, a luz do teu rosto. O rosto do Pai é o Filho; assim como pelo rosto se conhece uma pessoa, assim pelo Filho conhecemos o Pai. A luz, pois, do rosto de Deus é o conhecimento do Filho e a iluminação da fé, que foi assinalada e impressa, como um caráter, no dia de Pentecostes nos corações dos Apóstolos, e desta forma o homem se tornou alma vivente 78.

11. No sétimo dia, descansou Deus de todas as suas obras. E a Igreja, no sétimo artigo, descansará de todo o trabalho e suor, quando Deus enxugar toda a lágrima dos seus olhos 79, isto é, tirar toda a causa do choro 80; então ela será louvada pelo seu esposo e merecerá ouvir: Dai-lhe do fruto das suas mãos; e as suas obras louvem-na na assembléia do juízo 81, quando ela, juntamente com os seus filhos, ouvir o cicio da aura ligeira82: Vinde, benditos etc. 83

Com estes sete dias e sete artigos da fé, brevemente descritos no tijolo, apressemo-nos a descrever moralmente as seis virtudes da alma fiel e as seis horas da leitura evangélica, fazendo-as concordar com o dinheiro e com o sábado.

II – Os seis dias da criação e as seis virtudes da alma

12. A segunda Jerusalém, isto é, a alma fiel, em S. Mateus 84, chama-se vinha. Vejamos brevemente de que modo se deve cavar com a enxada da contrição e podar com a foice da confissão, e como se deve sustentar com as estacas da satisfação.

Deus disse: Faça-se a luz, e a luz foi feita 85. Porque, como diz Ezequiel 86, a roda estava na roda, isto é, o Novo Testamento no Velho87, e a cortina arrasta a cortina 88, isto é, o Novo Testamento expõe o Velho, concordaremos o Novo com o Velho, expondo moralmente as seis horas do Evangelho com as obras dos seis dias.

13.No primeiro dia, portanto, disse Deus: Faça-se a luz, e a luz foi feita. Escuta a concordância da primeira hora: Assemelha-se o reino dos céus ao pai de família, que saiu muito cedo 89 etc.

Nota que são seis as virtudes da alma: o arrependimento do coração, a confissão de boca, a satisfação de obra, o amor de Deus e do próximo, o exercício da vida ativa e contemplativa, a consumação da perseverança final. Quando sobre a face do abismo, isto é, do coração90, há as trevas do pecado mortal, o homem sofre a ignorância do conhecimento divino e da própria fragilidade, e não sabe discernir entre o bem e o mal. Este é o tríduo de que se fala no Êxodo 91: na terra do Egito, durante três dias, houve trevas que se podiam apalpar; em toda a parte onde habitavam os filhos de Israel havia luz. Os três dias são o conhecimento de Deus e de si mesmo e o discernimento do bem e do mal. Para os dois primeiros suplica S. Agostinho 92: Senhor, conheça-me eu a mim e a ti; do terceiro se diz no Gênesis 93 que a árvore, isto é, o discernimento da ciência do bem e do mal, estava no paraíso, isto é, no entendimento do homem.

O primeiro dia ilumina-nos para conhecer a dignidade da nossa alma. Daí a palavra do Eclesiástico 94: Filho, guarda na mansidão a tua alma e honra-a. Mas o homem miserável, constituído em honra, não o compreendeu: comparou-se aos jumentos 95. O segundo ilumina-nos para conhecer a própria fraqueza. Daí o dizer de Miquéias96: A tua humilhação achar-se-á no meio de ti. No meio de nós está o ventre, vaso de imundícies, em cuja consideração a nossa soberba se humilha, a arrogância se deprime, a vanglória desaparece. O terceiro ilumina-nos para discernir entre o dia e a noite, a lepra e a não lepra, o puro e o impuro, conhecimento que nos é muito necessário. Pois o mal é vizinho do bem, sob o mesmo erro. Muitas vezes o justo paga pelo pecador 97.

Mas, nestes três dias, as trevas são palpáveis na terra do Egito e sobre a face do abismo; porém, onde quer que há verdadeiros filhos de Israel, há luz, a respeito da qual Deus disse: Faça-se a luz. Esta luz é o arrependimento do coração, que ilumina a alma, mostrando o conhecimento de Deus, a consciência da sua própria fraqueza e o discernimento entre o homem bom e o mau.

14. Esta é a primeira manhã e a primeira hora em que saiu o pai de família, isto é, o penitente, a contratar operários para trabalhar na sua vinha, como se diz no Evangelho do presente domingo, em cujo Intróito da missa se canta: Rodearam-me, e lê-se a Epístola de S. Paulo aos Coríntios 98: Não sabeis que os que correm no estádio, etc.

Desta manhã diz o Profeta 99: De manhã, isto é, no alvorecer da graça, me porei diante de ti, direito e ereto, tal como me fizeste direito e ereto. Deus, de fato, como diz S. Agostinho 100, direito e ereto, fez o homem direito e ereto para que só tocasse com os pés a terra, isto é, exigisse da terra só o estrito necessário. Desta manhã se diz em S. Marcos 101: E muito de manhã, no primeiro dia da semana, vêm ao túmulo, nascido já o sol. E nota que diz bem: no primeiro diz da semana, pois ninguém pode vir ao túmulo, isto é, à consideração da sua morte 102, a não ser que antes repouse da solicitude dos bens temporais 103. Na manhã da contrição, diz o Profeta 104, matarei, isto é, reprimirei, todos os pecadores da terra, isto é, todos os movimentos da minha carne. Quem é esta, diz da alma penitente o Esposo, que vai caminhando como a aurora quando se levanta105? Assim como a aurora é o início do dia e o fim da noite, assim a contrição é o fim do pecado e o início da penitência. Daí o dizer do Apóstolo 106: Outrora fostes trevas; agora, porém, sois luz no Senhor; e noutro lugar: A noite passou e o dia aproximou-se 107.

15. Portanto, à primeira luz e ao romper da aurora sai o pai de família para tratar da vinha. Dela refere Isaías108: Foi adquirida uma vinha para o amado no corno filho do azeite 109; cercou-a duma sebe, e tirou dela as pedras, e edificou uma torre no meio, e construiu na mesma torre um lagar e plantou-a de bacelo escolhido. Uma vinha, isto é, a alma 110, foi adquirida para o amado, isto é, em honra do amado: no corno, isto é, na potência111 da Paixão; filho do azeite, isto é, da misericórdia, não pelas obras da justiça que nós fizemos 112, salvou a sua própria vinha, que cercou a sebe da lei escrita e da lei da graça; dela escreve Salomão nas Parábolas 113: O que desfaz a sebe, isto é, destrói a lei, mordê-lo-á a cobra, isto é, o diabo114, que ama as sombras 115, ou seja, os pecadores. Por isso, diz Job 116: Dorme à sombra, quer dizer, descansa na mente coberta de sombras, no esconderijo do canavial, isto é, no engano do hipócrita, e em lugares úmidos, isto é, nos luxuriosos 117.

Segue: E tirou dela as pedras, ou seja, a dureza do pecado; edificou a torre da humildade, ou seja, a parte superior da razão, no meio dela; e nela construiu o lagar da contrição, de que se espreme o vinho das lágrimas. E, desta forma, com os exemplos e doutrina dos santos plantou-a de bacelo escolhido. Para ela o pai de família deve muito cedo assalariar operários, a saber, o amor e o temor de Deus, que bem a cultivem.

16. Igualmente desta manhã se lê no primeiro livro dos Reis 118 que Saul, tendo entrado no meio do acampamento dos filhos de Ámon, na vigília da manhã, feriu Ámon, até que o dia aqueceu. Saul significa o penitente, ungido com o óleo da graça. Este deve na vigília matutina, isto é, de coração contrito, penetrar no meio do acampamento dos filhos de Ámon, que se interpreta água paterna 119 e significa os movimentos da carne, que desde o primeiro pai, como água fluente, chegaram até nós. A estes deve Saul ferir, até que o dia aqueça, isto é, até que o calor da graça ilumine o entendimento e o aqueça depois de iluminado.
Desta manhã se lê ainda no Profeta Jonas 120 que o Senhor preparou um verme ao romper da alvorada, e feriu a hera e ela secou. A hera, que por si só não pode elevar-se às alturas, mas, agarrando-se aos ramos de qualquer árvore 121, se dirige aos lugares mais altos, significa o rico deste mundo, que se eleva ao céu, não por si, mas pelas esmolas aos pobres, como se eles fossem os seus braços; daí a palavra do Senhor do Evangelho122: Granjeai amigos com as riquezas da iniqüidade, isto é, da desigualdade123, para que quando vierdes a precisar, vos recebam, etc. Esta hera, ao romper da alvorada, isto é, ao surgir da graça ou no coração contrito, com o dente dum verme, ou seja, com o remorso da consciência, é ferida e cortada, a fim de que, ao cair em terra, isto é, ao considerar-se terra, seque e se considere vil, dizendo com o Profeta 124: Desfaleceu o meu coração, quer dizer, a soberba do meu coração, e a minha carne, isto é, a minha sensualidade.

Depois de saboreadas estas coisas sobre o primeiro dia e a primeira manhã da contrição, passemos ao segundo dia e à terceira hora da confissão.

17. No segundo dia, disse Deus: Faça-se o firmamento no meio das águas, que separe umas águas de outras águas 125. O firmamento é a confissão, que firmemente retém o homem e o impede de se perder nos prazeres. Por isso, reprova o Senhor a alma pecadora, privada deste firmamento, por boca de Jeremias 126: Até quanto te debilitarão os prazeres, filha vagabunda? E por Isaías 127: Percorre a terra como um rio, filha do mar, porque daqui por diante já não tens cintura. A alma miserável diz-se filha do mar. Ela, como da mama do diabo, suga a voluptuosidade do mundo, que sabe a doce, mas gera sempiterna amargura. Daí a afirmação de S. Tiago 128: A concupiscência dá à luz o pecado; e o pecado, depois de ter sido consumado, gera a morte. A esta alma se diz: Percorre a terra como um rio; como se dissesse: Cinge-te com a cintura da confissão e aperta os teus vestidos, para que não caiam nas imundícies; e não queiras passar sobre a abundância dos bens terrenos, onde muitos perigaram, mas passa através da indigência e angústia da pobreza, pois que através do ribeiro se passa com segurança de ânimo. Mas a alma pecadora não tem cintura, não possui o firmamento da confissão; deste se escreve: Faça-se o firmamento no meio das águas, que separe umas águas de outras águas.

As águas superiores são as torrentes da graça; as inferiores, as torrentes da concupiscência 129, que devem estar debaixo do homem. Por outras palavras: O entendimento do justo tem águas superiores, isto é, a razão, que é a força superior da alma 130, a qual provoca o homem ao bem; e tem águas inferiores, isto é, a sensualidade, que tende sempre à queda. O firmamento da confissão, portanto, divida as águas superiores das inferiores, a fim de que o confitente, saindo de Sodoma e subindo às montanhas, não olhe para trás, como a mulher de Lot, e se converta em estátua ou rocha de sal 131, que os animais, isto é, os demônios, consomem, lambendo-o com grande avidez. Saindo também do Egito com os verdadeiros israelitas, rumo à terra de promissão, não escolha para seu guia a própria vontade, e não volte às panelas das carnes 132 e aos pepinos e às cebolas dos egípcios, isto é, aos desejos dos carnais.

Faça-se, portanto, por favor, um firmamento no meio das águas, de modo que, dada a garantia ao confessor de firme propósito de não recair, mereça na própria confissão, como se fosse na terceira hora, inebriar-se com o mosto do Espírito Santo juntamente com os Apóstolos, e, como se fosse um odre tornado novo por meio da confissão, mereça encher-se de vinho novo. Se, pois, como diz o Senhor 133, for posto vinho novo, o vinho do Espírito Santo, no odre velho dos maus dias, não só o odre se romperá, mas também o vinho se derramará, como aconteceu ao endurecido traidor Judas 134, que, semelhante a odre suspenso pelo pescoço, rebentou o ventre pelo meio, e as vísceras, que tinham bebido o veneno da avareza, se espalharam em terra.

E bem se chama a confissão hora terceira, na qual o verdadeiro confitente, como o pai de família, cultiva a vinha da sua alma. Em três coisas, pois, se deve confessar culpável: Porque ofendeu o Senhor, se matou a si mesmo, escandalizou o próximo, não dando a cada um a devida justiça: honra a Deus, vigilância a si mesmo, amor ao próximo. Por isso, no Intróito da missa de hoje, chora com as palavras 135: Rodearam-me gemidos de morte, porque ofendi a Deus; as dores do inferno rodearam-me, porque incorri em pecado mortal; e na minha tribulação, com que sou atribulado, porque escandalizei o próximo, invoquei o Senhor de coração contrito; e ele ouviu desde o seu santo templo, isto é, desde a sua humanidade, em que habita a divindade, a minha voz, a voz da minha confissão.

18. No terceiro dia disse Deus: Produza a terra erva verde, que dê semente segundo a sua espécie, cuja semente esteja nela mesma sobre a terra 136. Observa que no terceiro dia se nota a satisfação da penitência, que consiste em três obras: oração, jejum e escola, que se verificam nas três partes enunciadas.

Diga-se, portanto: Produza a terra, etc. A erva verde significa a oração. Por isso, diz Job 137 do penitente: Quem pôs o ónagro em liberdade e quem soltou as suas prisões? Eu dei-lhe uma casa no deserto e os seus tabernáculos na terra estéril. Ele despreza a multidão da cidade e não ouve a voz do exator. Estende a vista pelos montes onde pasta e anda buscando tudo o que está verde. O ónagro – de ônus (carga) e ager (campo)138 – significa o penitente que no campo da Igreja suporta o peso da penitência. A este põe o Senhor em liberdade e solta as cadeias quando, livre da servidão do diabo e das cadeias dos pecados, lhe permite se vá embora. Por isso, o Senhor diz em S. João 139 aos Apóstolos: Soltai-o e deixai-o ir.

Dá-lhe Deus casa na solidão do entendimento e os tabernáculos da vida ativa, nos quais milita na terra estéril do viver mundano. E assim, este penitente despreza a multidão da cidade, de que diz o Senhor por boca do Profeta 140: Eu sou o Senhor e não mudo e não entro na cidade; e David 141: Vi na cidade a iniquidade, quanto a Deus, e a contradição, quanto ao próximo. E não ouve a voz do exator. O exator é o diabo, que ofereceu uma vez a moeda do pecado ao primeiro pai e agora não a cessa de exigir todos os dias com usura. O penitente não ouve a voz deste exator quando não obedece à sugestão 142. Ou então, o exator é o ventre, que diariamente exige com clamor o tributo à gula, mas o penitente de forma alguma o ouve, porque se lhe obedece, não é por prazer, mas por necessidade.

Este ónagro estende a vista pelos montes onde pasta, porque posto em excelência de vida 143, olhando em redor, encontra os pastos da Sagrada Escritura 144, dizendo com o Profeta 145: Colocou-me num lugar de pastos. E, desta forma, na oração devota procura verdura, a fim de chegar por meio dos pastos da leitura sagrada a apanhar as verduras da oração devota, da qual se diz: Produza a terra erva verde.

19. Segue: E dê semente. Por esta significa-se o jejum. Donde a afirmação de Isaías 146: Bem-aventurados vós os que semeais sobre as águas, atando a pata do boi e do asno. Semeia sobre as águas aquele que ajunta à oração e à compunção das lágrimas o jejum, e desta forma ata com as cadeias dos preceitos147 a pata do boi, isto é, o afeto do espírito, e do asno, isto é, do corpo. Por isso, diz o Senhor: Este gênero de demônios, a imundície do coração e a luxuria da carne, não pode expulsar-se senão com a oração e o jejum 148. Com a oração, de fato, limpamos o coração do pensamento impuro; com o jejum refreamos a petulância da carne.

Segue o terceiro: Árvores frutíferas que dêem fruto segundo a sua espécie 149. Nas árvores frutíferas designa-se a esmola, que frutifica nos indigentes e por suas mãos é levada ao céu. E nota que se diz dar fruto segundo a sua espécie. A espécie humana é um segundo homem criado do lodo e vivificado pela alma. Deve, portanto, a esmola dar fruto segundo a sua espécie, porque a alma é alimentada pelo espiritual, o corpo pelo pão corporal. Daí o dito de Job 150: Visitando a tua espécie, não pecarás. A tua espécie é um segundo homem 151, que deves visitar tanto com a esmola espiritual quanto com a corporal; e assim não pecarás contra aquele preceito:Amarás o teu próximo como a ti mesmo 152. Nota, porém, que se diz: Cuja semente esteja nela mesma.Comentário de S. Agostinho 153: O que ordenadamente deseja dar esmola deve começar primeiro por si mesmo. / Estas três obras tornam perfeita a satisfação da penitência, bem significada pela sexta hora, a saber, o meio-dia, por volta da qual o pai de família saiu a contratar operários para a sua vinha. O meio-dia, em que mais queima o sol do que noutra ocasião do dia, designa o fervor da satisfação. Por isso, afirma-se pelo fim do Deuteronômio 154: Neftali gozará de abundância e será cheio da bênção do Senhor: possuirá o mar e o meio-dia. Neftali interpreta-se convertido ou dilatado 155 e significa o penitente, que se converte do seu mau caminho e se dilata em boas obras. Este gozará da abundância da graça no presente estado de viador e será cheio da bênção da glória, porque, para merecer consegui-la, é preciso antes possuir o mar, isto é, a amargura do coração, e o meio-dia, isto é, o fervor da satisfação.

20. No quarto dia disse Deus: Façam-se dois luzeiros no firmamento 156. A quarta virtude é o amor de Deus e do próximo. O amor de Deus designa-se na claridade do sol, o do próximo na mutabilidade da lua. Acaso não te parece uma certa mutabilidade alegrar-se com os que se alegram e chorar com os que choram? 157 Destas duas coisas se diz pelo fim do Deuteronômio 158: Com os frutos produzidos por virtude do sol e da lua encher-se-á a terra de José. Os frutos significam as obras do justo, por causa do encanto da perfeição, beleza da intenção pura, odor da boa opinião. Estes frutos são produzidos por virtude do sol e da lua, ou seja, do amor de Deus e do próximo; estas duas coisas fazem perfeito um qualquer. Este duplo amor designa-se na hora nona, por volta da qual saiu o pai de família. De fato, a perfeição do duplo amor conduz à perfeita da felicidade angélica, assim distribuída em nove ordens pelo profeta Ezequel 159, onde fala a Lúcifer, sob o tipo de nove pedras: O teu vestido é todo de pedra preciosa: o sárdio, o topázio e o jaspe, o crisólito, o ônix, o berilo, a safira, o carbúnculo e a esmeralda.

21. No quinto dia fez Deus os peixes do mar e as aves sobre a terra. A quinta virtude é o exercício da vida ativa e contemplativa; nesta, o homem ativo, semelhante ao peixe, percorre as veredas do mar, isto é, do mundo, a fim de poder socorrer o próximo que padeça necessidade; e o contemplativo, semelhante à ave, elevado no ar com a pena da contemplação, contempla o Rei na sua glória 160, conforme lho permite a sua pequenina capacidade 161. O homem, diz Job 162: nasce para o trabalho da vida ativa; e a ave para o vôo da vida contemplativa.

E nota que assim como a ave dotada de peito largo, por tomar muito ar, é retardada pelo vento, e a que tem peito estreito e agudo voa mais velozmente e sem dificuldade 163, também o entendimento do contemplativo, se se dilata em muitos e vários pensamentos, é demasiado impedido no vôo da contemplação, mas se junto e unido começar a voar, fruirá do gozo da contemplação. O exercício desta dupla vida designa-se na hora undécima, por volta da qual saiu o pai de família. A hora contemplativa refere-se ao um, porque contempla um só Deus, um só gozo; a vida ativa, portanto, refere-se aos dez preceitos do Decálogo, com os quais a mesma vida ativa se completa plenamente na vida deste exílio.

22. No sexto dia disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem e semelhança 164. A sexta e última virtude da alma é a perseverança final, que é a cauda da vítima no sacrifício, a túnica talar polimita 165 de José, sem a qual as cinco sobreditas virtudes inutilmente se possuem, e com a qual utilmente se possuem. Nela, como se fora no sexto dia, a imagem e semelhança de Deus, que nunca se deve deturpar, nunca obliterar, nunca manchar, se imprime eternamente na face da alma.

Esta tarde do Evangelho, a última hora da vida humana, em que o pai de família, por meio dum dispenseiro, isto é, de seu Filho, dá um dinheiro ao que trabalhou bem na vinha, é significada pelo sábado, que se interpreta descanso 166. Deste escreve Isaías 167: Será mês de mês, isto é, será a perfeição da glória conforme a perfeição da vida 168; e sábado de sábado, isto é, o descanso da eternidade dependerá do descanso do espírito, descanso que consiste na dupla estola da alma e do corpo 169.

A alma será glorificada por três dotes e o corpo por quatro. A alma adornar-se-á da sabedoria, da amizade e da concórdia 170. A sabedoria de Deus aparecerá na face da alma e verá a Deus tal-qual é 171, e conhecerá como é conhecida 172; a amizade será também para com Deus; donde a frase de Isaías 173: O seu fogo será em Sião, isto é, na Igreja militante, e fornalha de ardentíssimo amor em Jerusalém, isto é, na Igreja triunfante; a concórdia será para com o próximo, de cuja glória a alma gozará tanto quanto gozar dela própria. Quatro serão também os dotes do corpo: a claridade, a sutileza, a agilidade e a imortalidade, dos quais se diz no livro da Sabedoria 174: Os justos resplandecerão, eis a claridade, e brilharão como centelhas, eis a sutileza, que correm num canavial, eis a agilidade; e o seu Senhor reinará para sempre, eis a imortalidade 175. De fato, Deus não é de mortos, mas de vivos 176.

23. Para merecer esta coroa corruptível, dotada destas sete pedras, corramos, como diz o Apóstolo 177 na Epístola de hoje: Não sabeis que os que correm no estádio, correm, sim, todos, mas só um alcança o prêmio? Correi, pois, de tal maneira que o alcanceis. E todos aqueles que combatem na arena de tudo se abstêm; e eles para alcançar uma coroa corruptível; nós, porém, uma incorruptível. O estádio é a oitava parte da milha, e consta de 125 passos 178, e significa o trabalho deste exílio. Nele devemos correr na unidade da fé 179, com passos de amor 180, que são 125. Neste número designa-se toda a perfeição do amor divino. No 100, número perfeito, é designada a doutrina evangélica 181; no 20, os dez preceitos do Decálogo, que se devem cumprir literal e espiritualmente 182; no 5, o prazer dos cinco sentidos, prazer que se deve refrear 183. Quem corre em semelhante estádio recebe o prêmio, isto é, a remuneração da coroa incorruptível. Dela diz o Senhor no Apocalipse 184: Dar-te-ei a coroa da vida.

Irmãos caríssimos, imploremos humildemente e com lágrimas, a quem nos criou e voltou a criar, criou do nada e voltou a criar com o próprio sangue, se digne dar-nos os sete dons da eterna felicidade; e com Ele, princípio de todas as criaturas, mereçamos viver eternamente. Auxilie-nos Ele mesmo, que vive e reina por séculos de séculos. Assim seja.

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1.Gn 1, 1
2.Cf. Ez., 4, 1.
3.GREG., Homiliarum in Ezechielem I, homilia 12, 23, PL 76, 929
4.GREG., I, c.
5.ISID., Etym. XV, 8, 16, PL 82, 550. Neste passo St. Isidoro inspirou-se em Varrão.
6.Sl 103, 10.
7.Cf. Glo. Int., ibidem.
8.Sl 118, 96.
9.Cf. Ecli 27, 6; cf. Sab 3, 6.
10.Sl 68, 10.
11.3Reis 49, 10.
12.Cf. BEDA, In Cantica Canticorum allegorica expositio, IV, PL 91, 1142.
13.Neste mesmo sermão, à frente, ao tratar da glorificação da alma e do corpo, o Santo dirá que o justo será premiado no céu com sete dons: três a alma e quatro o corpo.
14.P. COMESTOR, Historia Scholastica, Liber Genesis 1, PL 198, 1055.
15.Cf. Gen 1, 3 e 3, 15. As palavras creare e recreare são inspiradas em AGOST., In Joannem tr. XV, e Sermo ad populum, cp. II, PL 38,24.
16.Gen 1, 3.
17.Gen 1, 6 (Vg... et dividat...).
18.Gen 1, 11 (Vg... et lignum...).
19.Gen 1, 14 (Vg Fiant luminária in...).
20.Cf. Gen 1, 20.
21.Gen 1, 26; 2, 7.
22.Cf. 2, 2.
23.Cf. Jo 1, 9.
24.Cf. 1Tim 6, 16.
25.Heb 1, 3 (Vg... splendor gloriae...).
26.Sl 35, 10.
27.Sab 7, 26 (Vg... candor est enim...).
28.Jo 1, 14.
29.Ez 3, 22.
30.Cf. Lc 1, 79.
31.Cf. Jo 9, 6.
32.Cf. Glo. Ord., Ibidem.
33.1Cor 11, 3 (Vg... Caput vero...).
34.Cf. Glo. Ord., Jo 9, 1.
35.Gen 1, 2.
36.Missa da Aurora, ou 2ª Missa do Natal.
37.Intróito da mesma missa. Cf. Is 9, 2, 6.
38.Lc 2, 9 (Vg Claritas Dei circumfulsit illos...).
39.Gen 1, 6.
40.Col 3, 1.
41.Cf. ISID., Etym. XVI, 13, 1, PL 82, 577.
42.Ez 47, 8 (Vg. muda).
43.Glo. Ord., Job 5, 26.
44.Job 5, 26.
45.Ex 2, 12 (Vg... abscondit sabulo).
46.Zac 6, 12.
47.Cf. Gen 34, 1; 28, 9.
48.Cf. Gen 4, 16.
49.Cf. Jo 13, 29-30.
50.Cf. Jer 39, 4-7.
51.Glo. Ord., Gen 4, 1.
52.Glo. Ord., ibidem.
53.Gen 11, 2 (Vg. muda).
54.Glo. Int., Ibidem.
55.Ex 20, 7 (Vg... nomen Domini Dei...).
56.Is 24, 5-6 (Vg... propter hoc...).
57.Cf. Tob 4, 16.
58.Cf. Ap 8, 13.
59.Gen 1, 11.
60.Cf. ISID., Etym. XIV, 1, 1, PL 82, 495.
61.Glo. Ord., Job 9, 24.
62.Cf. Is 53, 5.
63.HERVIEUX, Les fabulistes latins, 4, 354. Cf. WALTHER, Carmina.
64.Cant 8, 8 (Vg... parva... in die quando...; in Glossa: ...parvula...).
65.Glo. Inter., Jo 14, 26.
66.Jo 14, 26.
67.Cf. GREG., Homiliarum in Ez. I, homilia 7, 19, PL 76, 849.
68.Rom 8, 22.
69.Is 46, 11.
70.Sl 67, 34.
71.Glo. Int., ibidem.
72.Cf. Glo. Int., Is 1, c..
73.Glo. Int., ibidem.
74.Jo 4, 34 (Vg... voluntatem eius qui...).
75.Gen 2, 7 (Vg... in faciem eius...).
76.Atos 2, 2.
77.Sl 4, 7.
78.Gen 1. c.
79.Cf. Ap 21, 4.
80.Cf. Glo. Ord., ibidem.
81.Prov 31, 31 (Vg...mannum suarum et...).
82.3Reis 19, 12 (Vg. Sibilus).
83.Mt 25, 34.
84.Cf. Mt 21, 33.
85.Gen 1, 3.
86.Cf. Ez 1, 16.
87.Glo. Ord., ibidem; cf. GREG., Homiliarum in Ez. I, hom. 6, 15, PL 76, 835.
88.Cf. Ex 36, 3.
89.Mt 20, 1 (Vg...homini patrifamilias...).
90.Glo. Int., Gen 1, 2.
91.Cf. Ex 10, 21-23.
92.Cf. AGOST., Soliloquiorum II, 1, 1, PL 32, 885
93.Cf. Gen 2, 9.
94.Ecli 10, 31 (Vg. muda).
95.Sl 48, 13.
96.Miq 6, 14.
97.OVÍDIO, Remedia amoris, 323-324.
98.1Cor 9, 24.
99.Sl 5,5 (Vg. Mane astabo...).
100.Cf. AGOST., De Genesi ad litteram, VI, 12, 22. PL, 34, 348. Cf. De Genesi contra Manicheos I. c. 17, n. 28, PL 34, 187.
101.Mc 16, 2.
102.Cf. ISID., Etym. XV, 11, 1, PL 82, 551.
103.O sábado simboliza, em linguagem bíblica e aqui na pena de St. Antônio, o descanso ou repouso.
104.Sl 100, 8.
105.Cant 6, 9 (Vg... quae progreditur...).
106.Ef 5, 8 (Vg. Eratis enim...).
107.Rom 13, 12.
108.Is 5, 1-2 (Vg. muda).
109.Trata-se de hebraísmo, que significa: No cume de empinado monte, fertilíssimo de oliveiras. Singular a interpretação do Doutor Evangélico.
110.Cf. Glo. Ord., Is. 5, 1.
111.Glo. Int., ibidem.
112.Tito 3, 5.
113.Ecle 10 ,8.
114.Glo. Int., ibidem.
115.Cf. ISID., Etym. XII, 4, 2, PL 82, 442.
116.Job 40, 06.
117.Cf. Glo. Int., ibidem.
118.1Reis 11, 11 (V. muda).
119.Cf. Glo. Int., Gen 19, 38: “que se interpreta filho do meu povo”.
120.Jonas 4, 7 (Vg. muda, omite).
121.ISID., Etym. XVII, 22, PL 82, 626.
122.Lc 16, 9.
123.Vitis mystica, 6, 29, PL 184, 654.
124.Sl 72, 26 (Vg. muda); cf. Glo. Int.; ibi.
125.Gen 1, 6.
126.Jer 31, 22 (Vg. muda).
127.Is 23, 10 (Vg. muda).
128.Tg 1, 15.
129.Cf. Glo. Ord. e Int., Gen 1, 6.
130.P. LOMB., Sententiarum II, dist. 24, 4, p. 422.
131.Cf. Gen 19, 17.26.
132.Cf. Ex 16, 3.
133.Cf. Lc 5, 37 e Glo. Ord., ibi.
134.Cf. Atos 1, 18.
135.Cf . Sl 17, 5-7.
136.Gen 1, 11.
137.Job 39- 5-8 (Vg. muda, omite).
138.Na realidade, a origem do vocábulo ónagro é ónos (burro) e agros (campo), como aliás em lugar paralelo explica.
139.Jo 11, 44.
140.Mal 3, 6.
141.Sl 54, 10.
142.Cf. GREG., Moralium XXX, 18, 57, PL 76, 555.
143.Alude-se à graça existente no justo.
144.Cf. GREG., o. c., XXX, 18, 19, 58, 61, 64, PL 76, 5551 557-558, 559.
145.Sl 22, 2.
146.Is 32, 20 (Vg... super omnes aquas innectentes pedem...).
147.Glo. Int., ibidem.
148.Cf Mt 17,20.
149.Gen 1, 11.
150.Job 5, 24.
151.Cf. GREG., Moralium VI, 35, 54, PL 75, 758.
152.Mt 22, 39.
153.AGOST., Enchiridon 76, PL 40, 268.
154.Deut 33, 23 (Vg... benedictionibus...).
155.Cf. Glo. Int., Gen 30, 8.
156.Gen 1 14.
157.Rom 12, 15.
158.Deut 33, 14.
159.Ez 28, 13.
160.Is 33, 17.
161.Cf. ISID., Quaest. in Gen., c. 1, 12, PL 83, 211.
162.Job 5, 7.
163.Cf. ARIST., De part. na., IV, 12, 693b, 16-18.
164.Gen 1, 26.
165.Polimita quer dizer pintada de variegadas cores. Cf. GREG., In Evangelia homilia 25, 1, PL 76, 1189.
166.GREG., Homiliarum in Ezechielem I, homilia 6, 18, PL 76, 838; ISID., Etym. VI, 18, 18, PL 82, 251.
167.Is 66, 23.
168.Cf. GREG., 1. c.
169.Cf. GREG., In libros Moralium Praefatio, 10, 20, PL 75, 528; INOCÊNCIO III, Sermo 14, PL 217, 380
170.Cf. GUILHERME DE ST. THIERRY (e não SÃO BERNARDO, nem GUIGO CARTUSIANO, aos quais se atribuiu a obra), Epistola ad fratres de Monte Dei, III, 2, 3, PL 184, 355. Cf. Atas 1981, p.178, nota 30.
171.Cf 1Jo 3, 2.
172.Cf 1Cor 13, 12.
173.Is 31, 9; cf. Glo. Int., ibi.
174.Sab 3, 7.8.
175.Cf. INOC., o. c., PL 217, 380-381.
176.Cf. Mt 22, 32.
177.1Cor 9, 24-25.
178.Esta simbologia dos números está dentro dos processos literários do sermão medieval. Aqui St. Antônio bebe diretamente de ISID., Etym. XV, 16, 3, PL 82, 557.
179.Cf. Ef 4, 13.
180.GREG., In Evangelia homilia 29, 11, PL 76, 1219.
181.Cf. GREG., Hom. in Ez. II, hom. 6, 16, PL 76, 1007.
182.Cf. Glo. Int., Gen 18, 31.
183.Cf. Glo. Ord., Mt 25, 2.
184.Ap 2, 10.