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9 de Março - Mês Dedicado a São José

Da Jornada que São José fez a Belém com a Virgem
Para Obedecer ao Edito de Cesar

FONTE

              Havia já a soberana Senhora chegado ao nono mês da maravilhosa Conceição do Verbo Divino, quando se publicou em Nazaré a notícia de que mandava Cesar Augusto, imperador segundo dos romanos, que naquele tempo regia grande parte do mundo conhecido, e gozava de suma paz no seu império, que todos os seus vassalos se alistassem naquelas cidades onde tinham sua origem, a fim de pagarem certo tributo em sinal de reconhecimento e vassalagem.
            Remeteu o Imperador esta ordem a Quirino, Governador da Síria, o qual, por edito público, a fez promulgar em todas as províncias da sua jurisdição.
            Para obedecer pronto a este decreto, viu-se São José obrigado a passar a Belém, que era o solar de toda a estirpe régia de Davi, donde o Santo procedia.
            Este era o ambicioso projeto do Imperador Augusto; mas a providência incompreensível de Deus dispôs que juntamente fosse Maria Santíssima, não sendo obrigada, com seu esposo São José, não só para que ali nascesse o Verbo Divino humanado, segundo a profecia de Miquéias, que no capítulo 5, versículo 3, claramente anunciara que o Messias havia de ter Belém por pátria, mas para ficar por aquele meio descrito, nos fatos romanos, a família e progênie de Jesus Cristo enquanto homem, de cujo assentamento se valeram São Justino Mártir e Tertuliano para convencerem os ímpios.
            Distava Belém de Nazaré trinta léguas com pouca diferença, indo a Virgem Maria montada em um jumento, que São José guiava, e acompanhados de um boi, para suprir com a venda da carne do mesmo os gastos do tributo e da viagem e para solenizar o dia em que nascesse feito homem o Primogênito do Pai Eterno, distribuindo-a pelos pobres.
            Seriam cinco horas da tarde do dia quinto da sua jornada, quando São José e a Virgem chegaram a Belém, e entrando na cidade para buscarem abrigo, e descansarem de tão larga viagem, não foi possível achar aposento. Seguia a honestíssima Rainha e seu Esposo, de porta em porta, procurando agasalho entre o tumulto de muita gente que ali havia concorrido para obedecer ao Decreto do Imperador romano.
            Caminhando pela cidade, chegaram à casa onde estavam os oficiais do registro público, e ali se alistaram e pagaram o competente tributo. Logo prosseguiram em sua diligência, buscando cômodo em outras muitas casas, mesmo de parentes e amigos, e em todas respondiam ao pacientíssimo São José, como diz São Lucas, que não havia lugar para se hospedarem.
            Grande foi a aflição da Senhora, vendo-se entre tanta multidão de gente contra o seu gênio modesto e retraído; porém, o Santo e fidelíssimo São José sentia muito mais aquela extrema impossibilidade, em que se via, de não poder acomodar sua Santíssima Esposa, donzela tão delicada, que ainda não tinha feito quinze anos, a quem ele amava, e venerava sobre tudo, vendo estar tiritando, em uma noite tão fria, a formosura dos Anjos, exposta a todos os rigores do tempo, sem descanso, sem casa, sem abrigo; mas, sem dúvida, não foi pequena a glória para o nosso Santo achar-se entre as trevas da noite, aspereza da estação, desprezo dos parentes, e, desamparado dos amigos, ser ele só o único e fiel amparo e consolação da Rainha dos céus e Senhora do mundo.
            A ingratidão dessa gente deu motivo a que São José e sua Esposa para sair da cidade e procurarem uma caverna, que estava junto aos muros, para a parte do Oriente, na qual, como receptáculo comum, costumavam albergar-se os pastores e pobres peregrinos. Esta concavidade estava aberta no penhasco, e a ela seguia-se outra que servia de redil com uma manjedoura feita na mesma penha.
            Uma vez entrados, os santos Esposos puseram-se de joelhos, dando graças ao Senhor pelos altos juízos, com que dispunha os seus Mistérios, e logo começaram ambos a limpar a gruta com grande e santa emulação. São José acendeu uma pequena fogueira porque o frio era grande, e acercaram-se dela para receber algum calor, e do pobre sustento, que levavam, comeram, ou cearam com incomparável alegria de suas almas. Depois deram graças a Deus, e a Virgem rogou a seu Esposo José que se recolhesse a descansar e dormir um pouco, pois já era alta noite.
            Nessa ocasião, entra também a Virgem em êxtases e, de repente, radiante de felicidade, aperta nos braços contra o peito um menino, seu filho. Veio, como vêm os raios do sol, como a luz atravessa o cristal e o ilumina com seus raios, fazendo sobressair a sua transparência e pureza.
            Pura, sem mácula, antes do parto, pura e sem mácula ficou depois.
            Voltando a si do êxtase, ouviu São José o vagido de uma criança e correu pressuroso para junto de sua Virginal Esposa, encontrando-a com seu divino Filho nos braços.
            Foi São José o primeiro homem que mereceu e gozou, neste mundo, ver, com os próprios olhos, nascido o que não tem princípio, o imenso reduzido a lugar, o resplendor do Pai Eterno disfarçado na fraqueza humana.
            A Virgem depôs seu divino Filho sobre as palhas da manjedoura, tendo por travesseiro uma pedra que cobrira com panos e que ainda se mostra na Terra Santa e é reverenciada e beijada, com devotas lágrimas, pelos peregrinos.
            Junto estavam o jumento em que tinha viajado a Virgem e o boi que os Sagrados Esposos levaram para festejar o nascimento, e que com seus bafos aqueciam o divino recém-nascido. Sendo muito o frio, a Virgem Maria cobriu o tenro corpo do Menino com o seu véu, e São José com a sua capa.
            A alegria e júbilos que teria a soberana Senhora com o nascimento de seu amado Filho, não há entendimento ou língua que o possa compreender ou declarar vendo a Deus incriado nascido no tempo, ao Deus imenso e insensível apertado em seus braços, já adorando-o como Senhor, já beijando-o como Menino; e sendo também incompreensíveis as consolações celestiais, que, nesta ocasião, recebeu o bem-aventurado São José. Alegrava-se o Santo, vendo aquela joia divina, que o Pai Eterno lhe havia confiado, e considerando-se enriquecido com tão altos títulos de que Deus o havia feito participante na pessoa de seu Filho, repartindo com ele a dignidade real e fazendo-o não só guarda, aio e camarista do Rei da Glória, mas também pai legal por o haver adotado como Filho, e Filho de sua Esposa, gerado por obra e graça do Espírito Santo.
            Alegrava-se pelos bens incomparáveis de sua Esposa, tomando em seus braços a Jesus, doce prenda, em que estava recopilada toda a onipotência do Pai Eterno, que, ainda que pequenino no corpo, não só enchia todo o mundo, mas vinha para o reparar.
            Alegrava-se e também se confundia, vendo que, no segredo desta dignidade suprema de pai de Cristo, que o Altíssimo lhe concedera por um privilégio de graça mui especial, não só ficara excedendo a Patriarcas, Profetas, Evangelistas e Apóstolos, mas a todas as criaturas até as angélicas, pois que a Mãe e o Filho de Deus, elegendo-o para esposo e pai, quiseram, de algum modo, ser menos que ele.

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A vida de São José pela Associação de Adoração Contínua a Jesus Sacramentado. Livraria Francisco Alves. 1927.

8 de Março - Mês Dedicado a São José

Vida de São José com a Virgem Maria na casa de Nazaré
       
FONTE
      Após as cerimônias do matrimônio, começou São José a preparar sua casa com aquele incomparável contentamento que recebeu na posse e companhia da soberana Senhora, na qual notava os tesouros imensos das excelências e virtudes que Deus tinha depositado em seu coração.
       Notara a providência solícita, que aplicava ao bom governo da sua casa; o alinho, a limpeza e o asseio dela, exercendo as ocupações domésticas com tal perfeição, como se toda a vida as tivera usado. Experimentava a contínua caridade com que o tratava, como se de outra coisa não cuidasse; e de tal maneira se empregava nas obras ativas, que não faltava as da religião e contemplação, concordando, sem faltar à gravidade decente e humildade profunda, a temperança prudente com a penitência exata, e assim nas demais virtudes.
            Tudo isto causara no venturoso Santo tão grande admiração e reverência, que a terra, que a Virgem pisava, tinha por digna de veneração, observando, interiormente, maravilhosos efeitos da companhia de tão santa Esposa, assim nos afetos da pureza, como no desprezo eficaz das coisas terrenas e mundanas. Causara-lhe a formosura da Virgem tantos motivos de perfeição e efeitos de virtude, que andava o bem-aventurado José todo espiritualizado, parecendo-se com aquela sarça ardente que admirou Moisés no monte Horeb, a qual ardia e não se queimava, fazendo também em 
si possível o que Salomão teve por dificultoso, que era poder alguém trazer fogo no seio sem se abrasar, isto é, habitar um homem moço com sua esposa donzela e formosa, conservando o mesmo estado virginal juntamente com o matrimônio. Esta dificuldade da fraqueza humana venceu o nosso Santo, que, com estar casado com a mesma beleza e formosura, vivendo e comendo na mesma casa com a Virgem, procedeu com tanta pureza, que não teve lugar em seu peito nem ainda um pensamento que não fosse reto e puro. Verdade seja que estava a Virgem cheia de castidade tão intensa e eficaz, que movia os corações de todos à pureza de pensamentos.
            Para corroborar mais esta pureza, em que ambos os Santos esposos desejaram permanecer heroicamente cândidos, renovaram o voto de virgindade que tinham feito, e, nesta conformidade, suplicou logo a Virgem ao Altíssimo o aumento da graça para seu Esposo, e o Senhor, condescendendo propício a tão humildes rogos, operou no espírito de São José efeitos tão divinos, que não podem reduzir a palavras. Infundiu-lhe de novo perfeitíssimos hábitos de todas as virtudes, e o confirmou em graça por modo admirável, ficando o Santo Esposo na virtude de castidade em grau mais excelente que a pureza dos Serafins.
            Quão profundamente devia estar radicada em São José aquela virtude, para conviver diariamente com sua esposa a Virgem das virgens! A virgindade, a mais nobre de todas, a mais zelosa e delicada, e tal, que toda se turbou, quando houve de falar só com um Anjo porque o viu em forma de homem! Por outro princípio, devia São José com tal cautela ser custódia de tal virgindade, que havia de dar, exteriormente, a entender ao mundo o contrário, para que o parto santíssimo de Maria não fosse reputado ilegítimo, e a Mãe não arriscasse a vida e a reputação. De quanta prudência, pois, devia ser dotado São José para negócio tão difícil? De quanta circunspecção, de quanta capacidade, de quanta advertência, de maneira que tratasse com a Virgem por um modo que lhe mostrasse uma segurança de amante Esposo, e lhe tivesse um reverente respeito de pessoa estranha?
            Basta dizer que chegou a tanto o seu prudentíssimo trato que pode enganar o próprio demônio.
            Desta forma, reduzido ao mais puro exemplar de candura, dispôs-se o venturo São José a viver na companhia de sua puríssima Esposa com uma união sociável a mais perfeita e excelente. Oh que amor tão doce, tão verdadeiro e inseparável, unido com o maior vínculo do amor divino! Guardaram-se neste santo Matrimônio os ápices da perfeição, e esta união de pensamentos e semelhança de virtudes e costumes foi a primeira base em que o Espírito Santo estabeleceu a vida conjugal dos santíssimos Esposos com as consequências que pondera São Bernardino de Sena, dizendo:
            “Por atenção e respeito à Santíssima Virgem, foi preciso que este Varão fosse de maravilhosa graça e virtude, principalmente em três coisas: na união matrimonial, convivência contínua e administração solícita”.
            “O certo é que a honra, que o ditosíssimo José recebia da Rainha do céu, foi tão grande, que a podiam cobiçar os Serafins, segundo a veneração com que o tratavam, como a quem Deus havia constituído cabeça e príncipe da sua casa, chamando-lhe Senhor, do que admirado o devotíssimo Gerson exclamou: “Ó admirável alteza tua, José! Ó dignidade incomparável! Que a Mãe de Deus, a Rainha do céu, e Senhora do mundo não julgasse coisa indigna da sua grandeza chamar-te Senhor!”.
            Diz um cronista da Virgem que, “não obstante ser São José santo e reto, depois que se desposou com a soberana Princesa, se deixava respeitar e servir dela, guardando em tudo a autoridade de cabeça e de varão, ainda que a temperava com a rara humildade e prudência, à imitação dos Padres antigos e Patriarcas, de quem não devia degenerar, para que as mulheres fossem obedientes e sujeitas a seus maridos. E a Senhora – conclui – o servia com incomparável respeito e prontidão, e muitas vezes de joelhos. Servia-o à mesa, dava-lhe o lugar para se assentar, trazia-lhe a comida, administrava-lhe a bebida, e depois disso lhe mandava São José que se assentasse”.
            Ó incomparável regalia de São José! Como dignos exemplares dos bons esposos, eram ambos solícitos no trabalho, tudo fazendo por suas mãos, não só para não comer o pão ocioso, mas para que, à custa do seu suor, pudessem remediar a pobreza. De todos os bens, que herdaram de seus pais, e de seu patrimônio fizeram depositário os pobres e herdeiro a Deus, reservando unicamente para si a casa, em que a Virgem havia nascido e seus pais lhe deixaram, com alguns pobres móveis, sem os quais não se podem acomodar à vida comum de família.
            Estava a humilde, porém ditosa casa, habitação dos dois Esposos, repartida em três aposentos: em um dormia São José, que talvez, para imitar o rigor de seu bisavô Jacó, repousasse sobre a dura terra com uma pedra à cabeceira; em outro trabalhava e tinha os instrumentos de seu ofício; no terceiro assistia e dormia a Rainha dos céus em uma cama feita pelas mãos do Santo, e, sem criado ou serva, derribavam esses valorosos desposados, com dois golpes, o poder do reino da carne e do mundo, desprezando deleites e riquezas, para voarem, sem embaraços, pelo caminho das virtudes; e porque haviam de ser pais de Cristo, que foi pobre e elegeu os pobres, ganhavam o alimento com o trabalho de suas mãos em uma honestíssima pobreza. Desta maneira, ainda que Nazaré admirava as resplandecentes virtudes dos virginais Esposos, ignorava, contudo, o tesouro encoberto, que possui neles.

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A vida de São José pela Associação de Adoração Contínua a Jesus Sacramentado. Livraria Francisco Alves. 1927

7 de Março - Mês Dedicado a São José

Como São José conheceu a misteriosa
Conceição do Verbo na Virgem, e não a quis receber em Matrimônio;
Declaração do Anjo ao mesmo Santo
            De volta a Nazaré, foram se acentuando os sinais da maternidade na Virgem Maria. Como Deus salvaria a honra de sua virgindade, perante os homens e aos olhos de São José? Este pensamento teve a Virgem Maria, mas o que teria sido uma angústia para uma alma de natureza vulgar, preocupada consigo mesma, não podia perturbar a serenidade daquela que tinha dito: “Eu sou a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a sua palavra”. – Os que se reconhecem instrumentos de Deus e se entregam a Ele na plenitude da fé, põem n’Ele toda sua confiança. Maria, diz Bossuet, entregou-se a Deus e permaneceu em paz.
            São José que não tinha sido iniciado no mistério do qual a Virgem Maria, por humildade e reserva, guardara o segredo, percebeu o seu estado. As aparências levariam a crer na infidelidade, mas o respeito à sua virtude afastava toda a suspeita. Não podendo penetrar nos desígnios de Deus, ele estava perplexo e na dúvida de recebê-la em matrimônio, isto é, de recebê-la em sua casa, para conviver com ela. Em sua justiça humana, tomou o partido que lhe pareceu melhor, qual o de afastar-se da cidade, fugindo daquele lugar para não denunciá-la, o que era obrigado a fazer pela lei.
            São José, em vez de fazer juízo temerário, via e ouvia o que se passava, sem dizer coisa alguma contra a Virgem Maria, tornando-se por isso o defensor da boa reputação, entre os cristãos.
            Versado como era nas sagradas escrituras e com a ciência infusa, lembrou-se que os Profetas asseguraram que uma Virgem seria a Mãe do Messias e então, em sua humildade, pensara: Ah! Que sou indigno; é preferível que me afaste secretamente por causa da minha indignidade e que não habite em sua companhia.
            Deus, porém, não quis deixá-lo neste estado por muito tempo. Uma noite, o Anjo do Senhor, o mesmo que lhe ordenou que comparecesse ao Templo e aceitasse a Virgem Maria como esposa, apareceu-lhe durante o sono e lhe disse: “José, filho de Davi, não temas receber Maria por tua mulher: porque o que nela se passa é obra do Espírito Santo. Ela dará à luz um filho e o chamará – Jesus (Salvador) – porque Ele há de salvar o seu povo dos seus pecados”.
            E tudo isto aconteceu, para que se cumprisse o que disse o Senhor pelo profeta: “Eis que a Virgem conceberá e dará à luz um filho. E chamarão o seu nome Emmanuel, que quer dizer: Deus conosco”.
            Certificado assim São José pela revelação do Anjo na evidência do mistério, despertou com o espírito sereno e cheio de incomparável júbilo, conheceu, manifestamente, a excelência de sua puríssima esposa, a quem reputou por Mãe verdadeira do mesmo Deus, dispondo-se, com o mais profundo desvelo e afeto, a servi-la e venerá-la, e nela ao mesmo Senhor, que trazia em seu virginal seio! Logo convocando os seus amigos e parentes, para a celebração das cerimônias externas a que os judeus chamavam casamento, recebeu-a como sua esposa; e viveram sempre como irmãos.

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A vida de São José pela Associação de Adoração Contínua a Jesus Sacramentado. Livraria Francisco Alves. 1927.

6 de Março - Mês Dedicado a São José

Encarnação do Verbo Divino e Visita da Virgem Maria à Sua Prima Santa Isabel
                        Corria o quarto mês depois dos Desposórios, quando o Senhor, encontrando na puríssima Virgem todas as virtudes heroicas correspondentes ao seu agrado, quis estender o braço da Onipotência à maior de suas obras, dispondo a Encarnação inefável do Verbo Divino no virginal seio de Maria Santíssima.
            Para isto, entrando já o tempo alegre da primavera, a 25 de Março, enviou Deus o Arcanjo São Gabriel por embaixador de tão alto mistério, o qual por sua natural sutileza, penetrando a clausura da porta, apareceu, em forma humana e refulgente, à ditosíssima Virgem, que estava só e recolhida, orando no cubículo interior da sua pobre casa de Nazaré. Saudou-a com uma profunda veneração e com termos mui novos e especiais, como a sua Rainha e Senhora, em quem adorava os mistérios altíssimos de seu Criador. Deu-lhe a saber que o Verbo Divino tinha resolvido tomar a forma de homem para remir e salvar a humanidade e a tinha escolhido para sua Mãe augusta, ficando sem detrimento, antes muito mais pura, a sua virginal integridade, concorrendo para isso a virtude do Espírito Santo, que também era a do Altíssimo.
            Ouvindo a Virgem o que lhe anunciava o Anjo, se turbou, e ele, para alentar a sua humilde modéstia e corroborar a sua fé na Onipotência divina, lhe advertiu que sua prima Isabel também havia concebido um filho sem embargo de a ter posto a natureza em esterilidade e os anos em velhice.
            Confortada a Virgem com as palavras do Anjo, e esperando este pela sua resposta e consentimento, pôs a Rainha dos céus os joelhos em terra e, erguendo o coração e as mãos a Deus, aniquilando-se diante dele, disse, com profunda humildade: Eis aqui a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a sua palavra; e no mesmo instante, por virtude do Espírito Santo, concebeu Maria Santíssima em seu puríssimo seio ao Filho de Deus, dignando-se o Verbo eterno, sem horror, de trocar o seio celestial do Pai pelo sagrado seio virginal de sua Mãe, passando a Virgem Maria de consorte de um pobre carpinteiro a ser Esposa do Arquiteto do Céu, como ponderou Santo Agostinho.
            Há dúvida com relação à hora em que se realizou essa divina embaixada, se pela manhã, ao meio dia ou à tarde, nascendo daí o louvável costume que a Igreja tem em dizer àquelas horas a saudação angélica da Ave Maria. Pensam alguns que fora à meia noite em ponto.
            Executado o profundo mistério da Encarnação do Verbo, e certificada a soberana Virgem pela embaixada do Anjo de que Santa Isabel, sua prima, havia já seis meses, gozava a milagrosa fortuna da fecundidade, concebendo também um filho, que seria grande diante de Deus e dos homens, resolveu, inspirada pelo Espírito Santo, ir visitá-la imediatamente, porque entendeu ser este o beneplácito do Altíssimo, o qual, com a presença do Verbo eterno, queria santificar esse filho, sendo esse um dos principais intentos desta visita.
            A Virgem Maria partiu, pois, a 28 de Março para a cidade de Karem, onde residia sua prima, indo acompanhada de alguma parenta ou amiga, ou fazendo parte de alguma caravana, tendo de percorrer trinta léguas até as montanhas da Judéia, por caminhos ásperos e fragosos.
            Chegada à casa de Santa Isabel foi recebida por ela com a saudação: “Bendita sois vós entre as mulheres, bendito é o fruto do vosso ventre. Donde me vem a honra de ser visitada pela Mãe do meu Senhor. Porque mal a vossa saudação me feriu os ouvidos, a criança que eu trago, estremeceu. E bem-aventurada sois vós que crestes, porque se hão de cumprir aquelas coisas que vos foram ditas da parte do Senhor”.
            A Virgem Maria, ao ouvir a saudação de Santa Isabel, deixa transbordar seu coração e entoa esse admirável cântico de profissão de fé, hino de humildade de gratidão, profecia do futuro – o Magnificat.
            Sucedeu esta misteriosa visita poucos dias depois da Encarnação do Verbo, pelos fins de Março, ou princípios de Abril, mas a Igreja determinou que se celebrasse esse mistério a 2 de Julho, porque, realizando-se a festa da Encarnação em tempo de Quaresma, em que a Igreja está toda ocupada em celebrar a Paixão de Jesus Cristo, não era próprio, nem justo celebrar com galas esse acontecimento.  A estada da Virgem Maria em casa de sua prima Santa Isabel foi de perto de três meses, e os documentos evangélicos levam a crer que não assistira ao nascimento de São João Batista por dizer São Lucas que ai estivera perto de três meses e não três meses como seria preciso para completar os nove da gestação de Santa Isabel, e por mencionar sua volta a Nazaré antes do nascimento de São João Batista e mesmo pelo decoro e pudicícia da Santa Virgem.


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Fonte: A vida de São José pela Associação de Adoração Contínua a Jesus Sacramentado. Livraria Francisco Alves. 1927.

5 de Março - Mês Dedicado a São José

Desposórios Misteriosos do Bem-Aventurado São José com a Puríssima Virgem Maria

            Estando próximo o feliz tempo da Redenção humana, ardentemente suspirado por tão dilatados séculos, ordenou Deus que Maria Santíssima tivesse por esposo a São José. Convinha que assim fosse por muitas razões misteriosas e oportunas, referentes ao crédito do Verbo Divino, à nossa utilidade e a outros fins ocultos.
            Havia onze anos que a Santíssima Virgem estava consagrada a Deus no Templo de Jerusalém, para onde fora desde o terceiro ano de sua idade. Apresentada por seus ditosos pais Joaquim e Santa Ana, ali se havia despedido de todo o comércio humano, transformada no amor casto e puro daquele Sumo bem, que nunca desfalece, e a quem de todo o coração só desejava ter por Esposo, repetindo para esse fim o voto expresso de castidade inviolável, que, antecipadamente, lhe havia feito; porém, a tão impensado preceito resignada a prudentíssima donzela na mais heroica obediência, suspendeu o seu juízo, e só o teve em esperar e crer melhor, que o Patriarca Abraão, na esperança contra a esperança. Era costume e instituição do Templo que ao chegarem as Virgens que nele se educavam, à idade competente de poderem casar, serem mandadas aos Sacerdotes ou para casa de seus pais para tomarem estado, ou do mesmo Templo, com o seu consentimento, saírem casadas; e, como à Santíssima Virgem lhe haviam falecido seus ditosos pais, e ela já contava quatorze anos, idade competente para o matrimônio, consultaram os Sacerdotes com os seus parentes o que deviam fazer e, por inspiração divina, escolheram a São José para seu Esposo. Ao mesmo tempo que a Virgem Santíssima se ocupava em suplicar a Deus, falara o Altíssimo ao interior do Sumo Sacerdote Abiathar, mandando-lhe que se ocupasse com o casamento da Virgem Maria, filha de São Joaquim e Santa Ana, por quem tinha especial cuidado e grande amor. O Sumo Sacerdote já havia intimado a Virgem a cumprir o uso do Templo e costume do povo, mas pela reposta que lhe dera a incomparável donzela, de ter feito voto de perpétua virgindade, e estar por seus pais consagrada para servir a Deus naquela clausura sem limitação de tempo, se achava embaraçado e confuso; pois, de um lado, estava a obrigação do voto e, de outro, o receio de quebrar o antigo costume fundado na Lei.
            Nesta colisão, ordenou orações a Deus, para que inspirasse o que se devia fazer e a Virgem não cessava de pedir ao Senhor que a conservasse no estado virginal, tendo aviso do céu que o se propósito estava a cargo de Deus e que fizesse o que o Sumo Sacerdote ordenasse.
            Nesta mesma ocasião, ouviu-se uma voz que saiu do Propiciatório (lâmina de ouro na Arca do Testamento, donde se ouvia a voz de Deus) do Templo que dizia assim: É tempo que se realize o oráculo de Isaías: “Sairá uma haste da raiz de Jessé e uma flor desabrochará desta haste. Que todos os membros da família de Davi deponham uma haste de amendoeira no Templo. Aquele a quem pertencer a haste que florir e sobre o qual o Espírito de Deus vier repousar sob a forma de pombo, deverá ser o esposo da Virgem”. A ordem do Senhor foi publicada por arautos, ao som da trombeta sagrada, por todo o país de Judá, e todos os jovens da família de Davi (em número de 23) se apresentaram. Depois que cada um colocou a vara no altar do Propiciatório, foram oferecidos sacrifícios a Deus que fez florescer a vara de Aarão, para que renovasse esse prodígio.
            O Sumo Sacerdote saiu do Santo dos Santos e declarou que nenhuma das varas florescera, a não ser a de Agabo que, por meio de mágicas, fizera florescer a sua, cujas flores logo se estiolaram, mas que faltava um dos descendentes de Davi, chamado José, e ordenou que o fossem buscar.
            Habitava São José só numa pequena casa em Tiberíades, na margem do lago e, estando construindo um oratório, o Anjo lhe apareceu e disse que interrompesse o trabalho e que, como outrora tinha Deus confiado o seu homônimo, o patriarca José, a administração do trigo do Egito, assim o celeiro que continha a colheita da salvação lhe seria confiado.
            São José não compreendeu essas palavras e continuou a orar pelo advento do Messias, quando foi chamado ao Templo.
            São José, em vista do seu voto de virgindade, não queria comparecer e só o fez depois que o Senhor, aquém implorara, manifestou a sua vontade no sentido de se apresentar, aceitando a mão da Virgem Maria e tornando-se o guarda de sua inviolável virgindade. Comparecendo São José, a prova foi renovada e sua haste floresceu e, ao ser-lhe entregue, um pombo esvoaçou por sobre sua cabeça. São José era um varão de quarenta anos, formoso como vimos e duma disposição corpórea muito elegante.
            Foi santificado antes de nascer, nunca tendo pecado mortalmente, era virgem e tinha feito voto de virgindade, que o Espírito Santo lhe certificou que não perderia, por ter Maria Virgem também feito.
            Assim a desposou só para a servir, e por obediência a Deus. Ao saberem do voto um do outro, ambos ficaram muito alegres e, no dia seguinte, foram celebrados os esponsais, tendo a Virgem quatorze anos e São José quarenta.
            O ato era solene e constava de três cerimônias. A primeira consistiu em São José entregar à sua divina Esposa, como era costume entre os noivos, em sinal de estreita união de seus corações, um anel, no qual estava engastada uma pedra preciosa e provavelmente também esculpida em hebraico a palavra Mazal, que quer dizer – boa fortuna, ou boa estrela, e nunca mais bem verificada que em semelhante desposório.
            Na segunda cerimônia foi o glorioso Santo cobrir com parte de sua capa, reverentemente, a beatíssima Virgem, como fórmula e rito daquele ato, em demonstração de mútua fidelidade e proteção recíproca dos desposais. A terceira cerimônia se colige do Livro de Tobias, onde, no capítulo 7º, se escreve que Raquel, quando entregara sua filha Sara a Tobias para sua esposa, pegando Raquel na mão direita da filha e na de Tobias, disse: O Deus de Abraão, e o Deus de Isaac, e o Deus de Jacó seja convosco, ele vos ajunte e lance sobre vós a sua benção; de cujo texto e cerimônia usada entre os hebreus é crível e provável que os Sacerdotes do Templo se servissem nos felicíssimos desposórios do casto Esposo com a puríssima Virgem. Sendo dada finalmente a benção sacerdotal, segundo o costume hebraico, partiram os felicíssimos Esposos para Nazaré, pátria de ambos, indo a Virgem para a casa que herdara de seus venturosos pais, onde permaneceu um ano separada de São José, ocupando-se na confecção de seu enxoval até se realizar o matrimônio judaico que consistia na vida em comum dos esposos.
            Os judeus distinguiam no enlace matrimonial a promessa, os esponsais e o casamento. A primeira fazia-se nos primeiros encontros, seguindo-se depois os esponsais, que duravam um ano, durante o qual a jovem preparava seu enxoval e reunia seu dote, sendo finalmente recebida em casa do esposo pelo matrimônio. Tinham, portanto, significações diferentes das que chamamos casamento, e o que eles chamavam casamento era apenas uma solenidade externa, uma formalidade legal da habitação conjunta do casal.
            Celebrado tão misterioso ato, se contraiu entre os Santos Esposos, São José e a Virgem Maria, não só um verdadeiro e legítimo casamento, porém o mais perfeito e quase celeste, sem que o voto de virgindade, que havia entre os contraentes, prejudicasse a essência do vínculo daquelas duas vontades mais puras unidas em um só querer; pois, como diz o Doutor Angélico, foram ambos os Esposos certificados por Deus de sua perseverança e integridade do voto; e acrescenta São Francisco de Salles que, sendo São José vigilantíssimo em guardar suas virtudes debaixo da chave da humildade, tinha um particular cuidado em ocultar a preciosa pérola da sua virgindade, e que por isso consentira no Desposório com o fim de que nenhuma pessoa a pudesse conhecer e ficar assim mais oculta. Neste sagrado e estreito vínculo, é certo que Maria Santíssima recebeu um Esposo, que foi o Custódio e o Protetor da sua honra e da sua pureza; um Esposo o mais idôneo, que entre todos os filhos de Israel escolheu o Altíssimo com vigilante cuidado: um fidelíssimo guarda da Joia mais preciosa, particularmente engastada no coração do Senhor; sendo o ditoso São José elevado à mais sublime fortuna e suprema dignidade, que se pode imaginar neste mundo. Recebeu São José por sua legítima Esposa a Virgem Maria, Senhora tão incomparável e excelente, que só Deus é maior que ele. Não pode haver elogio, por maior que seja, que comparado com esta dignidade, não seja muito diminuto. Mais alta nobreza adquiriu São José desposando-se com a Santíssima Virgem, que toda a que herdara de seus régios e ilustres progenitores; pois, sendo a Senhora rainha dos céus, da terra e de todos os santos, São José foi diretamente promovido às grandezas, honras e títulos supremos, a que a fortuna régia costuma elevar. Basta dizer que o bem-aventurado São José desposou a imaculada Virgem Maria, Rainha e Senhora soberana de todas as criaturas, para se verificar nele a participação de toda a enchente de virtudes e felicidades. Oh que divina união (exclama São Francisco de Salles) entre a Virgem Maria e o Glorioso São José! União, que bastou, para que o Bem dos bens eternos, Cristo Senhor nosso, pertencesse a São José, assim como pertenceu à sua Esposa, segundo a graça que o fez participante de todos os bens de sua amada.
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A vida de São José pela Associação de Adoração Contínua a Jesus Sacramentado - Livraria Francisco Alves, 1927