30 de Março - Mês Dedicado à São José

São José como intercessor


            Grande deve ser, no Céu, o poder de São José sobre os elementos materiais que pode impedir nos sejam nocivos ou fazer que nos sejam úteis; sobre os demônios, neutralizando seu ódio e desmanchando seus embustes e perfídias; sobre os bons Anjos que pode enviar para nos socorrer.

            Mas, acima de tudo, tem ele o poder da oração, como pai de Jesus e esposo de Maria Santíssima, e esse poder é geral para todas as nossas necessidades e não particular, como é atribuído aos demais santos.

            “Invocam-se os santos, diz São Francisco de Salles, para necessidades particulares, como se as graças e o dom dos milagres fossem partilhados entre eles e cada um tivesse uma parte limitada; mas São José tem o remédio geral para todas as necessidades do corpo e da alma, no crédito absoluto que tem junto de Nosso Senhor”.

            Todos esses pensamentos estão contidos na admirável oração a São José que legou Leão XIII:

            “Recorremos a vós em nossa tribulação, ó bem-aventurado José, e, depois de ter implorado o socorro de vossa santa Esposa, solicitamos, com confiança, vosso patrocínio. Pela afeição que vos uniu à Virgem Imaculada, Mãe de Deus, e pelo amor paterno de que cercastes Jesus Cristo, vos suplicamos que olheis, com bondade, para a herança que Jesus Cristo conquistou com seu sangue e que nos assistais com vosso poderoso socorro em todas as nossas necessidades.
            Protegei, ó sábio Guarda da divina Família, a raça eleita de Jesus Cristo; preservai-nos, ó pai amantíssimo, de toda manha de erro e de corrupção; sede-nos propício e assisti-nos do alto do céu, ó nosso poderoso libertador, no combate em que estamos empenhados com o poder das trevas; e, do mesmo modo que livrastes, outrora, o Menino Jesus do perigo da morte, defendei hoje a Igreja de Deus dos embustes do inimigo e de toda a adversidade. Concedei-nos vossa perpétua proteção, afim de que, com vosso exemplo e por vosso socorro, possamos viver santamente, piedosamente morrer e obter a beatitude eterna do céu. Assim seja.”

            São José é, ainda, mais que intercessor, é nosso corredentor. O título de esposo de Maria, Mãe dum Deus Redentor, dá a São José o título de corredentor, tomando, aliás, esta palavra em sentido essencialmente diferente do sentido que tem com relação a Maria Corredentora. Quer isso dizer que São José foi, com efeito, associado como causa, ou ao menos como condição indispensável com relação ao plano divino da Encarnação Redentora; e isso não se pode dizer de nenhum outro santo.

            Os outros santos estão depois da ordem hipostática, ou amo menos fora dela. Eles tem com relação a ela, cada um tomado a parte, uma função super-rogatória.

            O Verbo não quis se encarnar para nos resgatar sem a coparticipação de São José.

            Não queremos terminar estas considerações sem repetir o que escreveu Santa Tereza, em que, para propagar a devoção a São José, vale por tudo o que temos dito:

            “Tomo por advogado e protetor a São José, e recomendo-me instantemente a ele. Seu socorro manifestou-se do modo mais visível. Esse terno pai de minha alma, esse amado protetor, apressou-se em me tirar do estado em que desfalecia meu corpo, bem como me livrou de perigos maiores de outro gênero, que ameaçavam minha honra e minha salvação eterna. Para cúmulo de felicidade, tem-me sempre ouvido além de minhas preces e de minhas esperanças. Não me lembro de lhe ter pedido, até este dia, coisa alguma, que me não tenha concedido.

            O Altíssimo dá somente graça aos demais santos para nos socorrer em tal ou qual necessidade; mas o glorioso São José, eu o sei por experiência, estende seu poder a tudo. Nosso Senhor quer nos fazer entender por aí, que, assim como ele lhe foi submisso na terra do exílio, reconhecendo nele a autoridade dum pai adotivo e dum governador, igualmente se apraz ainda em fazer sua vontade no céu, ouvindo todos seus pedidos...

            Conhecendo hoje, por uma tão longa experiência, o admirável crédito de São José junto de Deus, quereria persuadir todo o mundo a honrá-lo com um culto particular.

            As pessoas, dadas à oração, deveriam principalmente sempre amá-lo com uma filial ternura... Quem não encontrar quem lhe ensine a orar, escolha este admirável santo por mestre...” (Vida de Santa Tereza, escrita por ela mesma).

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A vida de São José pela Associação de Adoração Contínua a Jesus Sacramentado - Livraria Francisco Alves, 1927
  

29 de Março - Mês Dedicado à São José

São José, pai e educador

FONTE
            O Filho de Deus quis ser criado e educado por São José. Que sublime missão! Vossos exemplos e lições admiráveis, desnecessários aliás para o Menino Jesus, que tinha as Virtudes e os Dons do Espírito Santo desde o primeiro instante, sirvam para nós de modelo.

            Em todas as condições de tempo e de lugar, encontramos em São José o modelo mais perfeito: o modelo de vida interior, da contemplação, que transforma a vida pela prática das virtudes; o modelo da vida exterior nas santas viagens, nos trabalhos; o modelo das santas alegrias, das cruzes aceitas e suportadas, em união com Jesus, encontramos nele que é “a Consolação dos desgraçados”; o modelo da fé mais singela e firme encontramos nele que é “fidelíssimo”; o modelo da mais completa confiança em Deus e do mais perfeito abandono; o modelo da caridade mais desinteressada, de esquecimento completo de si mesmo, da dedicação a toda prova; o modelo da coragem nas dores encontramos nele que é o “Espelho da paciência”; o modelo de uma pureza digna da Virgem das virgens e do Santo dos santos encontramos nele que é o “Guarda das virgens”; o modelo da humildade mais profunda; o modelo das virtudes familiares, encontramos nele que é a “Glória da vida da família” e o “sustentáculo das famílias”; o modelo da elevação e da dignidade santas na nobreza; o modelo da resignação em trabalhos rudes encontramos nele que é o “modelo dos operários”; o modelo da vida a mais santa na desgraça encontramos nele que é o “Consolador dos desgraçados”; o modelo da melhor morte encontramos nele que é a “Esperança dos enfermos”, o “Patrono dos moribundos”. Os pais de família encontram em São José a mais bela personificação da vigilância e da solicitude paternas; os esposos, um perfeito exemplo de amor, de concórdia e de fidelidade conjugal; as virgens têm nele ao mesmo tempo o modelo, e o protetor da integridade virginal. Os nobres de nascimento aprendem de José a guardar, até o infortúnio, sua dignidade; os ricos aprendem, em suas lições, quais são os bens que devem desejar e adquirir a custa de toso seus esforços. Quanto aos proletários, aos operários, as pessoas de condição mediana, têm eles um direito especial de recorrer a José e procurar imitá-lo.

            São José, com efeito, de raça real, unido pelo casamento à maior e mais santa das mulheres, considerado como o pai do Filho de Deus, passa sua vida a trabalhar e tira de seu trabalho de artista o necessário par manter sua família.

            “É, pois, um fato que a condição dos humildes nada tem de abjeto, e não somente o trabalho do artista não desonra, mas pode, se si alia à virtude, ser muito enobrecido. José, satisfeito com o pouco que possuía, suportou as dificuldades inerentes a essa mediocridade de fortuna com grandeza d’alma, à imitação de seu Filho, que, depois de ter aceito a posição de escravo, sendo Senhor de todas as coisas, se sujeitou, voluntariamente, à indigência e à falta de tudo” (Leão XIII).

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A vida de São José pela Associação de Adoração Contínua a Jesus Sacramentado - Livraria Francisco Alves, 1927

28 de Março - Mês Dedicado a São José

Da glória que o Bem-aventurado São José goza no Céu entre os mais santos

FONTE

            É opinião aceitável e recebida com aplauso da maior parte dos Autores, que o felicíssimo São José está no Céu em corpo e alma junto de sua amada Esposa Maria Santíssima em trono à esquerda de Jesus Cristo, pertencendo o da direita à Sua Santíssima Mãe. A razão substancial é, porque, como diz Santo Antônio, todos os Santos, na Jerusalém celeste e triunfante, se hão de colocar em suas ordens e hierarquias, de modo que nenhum deles esteja solitário.

            Conforme esta suposição, é conveniente que a soberana Rainha dos Anjos tenha na sua hierarquia quem a acompanhe; e não podendo ser a humanidade de Cristo, por estar colocada no trono da Divindade, é justo que seja a amável companhia de São José, porque só a ele, como Esposo seu e estimado Pai de Cristo, lhe compete este lugar entre todos os Anjos e Santos, nenhum dos quais o excedeu em dignidade, só à puríssima Virgem semelhante.

            Assim como a humanidade de Cristo Senhor nosso obteve mais abundante graça e glória, por estar mais chegada e imediata ao Verbo Divino, e depois Maria Santíssima, por estar mais próxima a seu Filho, da mesma sorte se julga, prudentemente, que o felicíssimo São José alcançou o terceiro lugar na abundância da graça, porque, depois da Virgem, foi o que esteve mais junto a Cristo, o que o tratou com mais familiaridade e teve com ele uma singularíssima união por muitos anos, além do singular parentesco, pois foi seu pai não só legítimo e próprio, mas Esposo verdadeiro de sua Mãe imaculada.

            Este lugar tão distinto e especial, que o nosso Santo ocupa na glória, lhe é tão próprio, que não pode competir a nenhum dos outros Bem-aventurados, ainda que sejam dos que gozaram das primícias do Espírito Santo, quais foram os Apóstolos, porque são tão singulares os títulos e predicados de São José, e a sua dignidade é de ordem tão elevada que não podem os outros entrar em paralelo, e assim excede a todos os demais Santos.

            A razão de tudo está em ser o ministério de São José comparado ao dos Apóstolos, constituído em classe separada, isto é, na ordem hipostática, ou concernente ao grande Mistério da Encarnação do Verbo Divino, que neste sentido excede a tudo.

            Funda-se mais esta superioridade da glória de São José na resposta, com que Jesus Cristo negou as duas cadeiras no Reino Celeste, que a mulher de Zebedeu lhe pedia para o seus dois filhos João e Tiago, porque já estavam destinadas pelo Pai Eterno para Maria Santíssima e para São José, uma à mão direita, outra à mão esquerda do Verbo Divino.

            Este excesso e vantagem, que Maria Santíssima e São José fazem aos outros Santos na glória, quis também dar a entender o Evangelista São Mateus no capítulo I, do seu Evangelho; porque piamente se pode crer, ou opinar que, pela mesma ordem, com que o Evangelista nomeia na terra estas três augustíssimas Pessoas – Jesus, Maria e José –, essa mesma guardam e observam na Bem-aventurança; donde o Doutor exímio disse bem que, ainda que não havia estado no Céu para ver a cadeira que ocupava gloriosamente São José, inferia, com graves fundamentos, que o lugar que tinha era tão superior, que dominava ao dos Apóstolos e mais Santos.

            A maior dificuldade, que neste pondo se encontra, é, se este excesso de glória, com que o nosso Santo supera os Apóstolos, se deva entender também com o grande Batista, Precursor de Cristo, e por ele canonizado pelo maior entre os nascidos de mulher, e de quem há tão frequentes louvores na Escritura e Santos Padres. São José alcançou mais perfeita graça que o Batista, pois teve mais excelente ministério, maior dignidade e ocasiões mais oportunas e frequentes para aumentar a mesma graça e amor a Deus.

            É certo que o verdadeiro conhecimento destas honras e distintas glórias que os Santos gozam no Céu em prêmio dos seus merecimentos e virtudes, só a Deus pertence, e que nos devemos abster destes paralelos; porém, com ânimo cheio de devoção e piedade, podemos supor sem temeridade, que, depois de Maria Santíssima, não há, no Céu, Santo que esteja mais próximo de Jesus Cristo nos graus da glória que o Bem-aventurado São José, donde o insigne Escobar proferiu esta proposição: José não é Deus, nem é Anjo; mas eu o vejo tão separado e distinto de todos os mais Santos, que constitui na Glória com sua amantíssima Esposa um coro muito especial.

            Daqui procede a distinta e profunda reverência, que todos os Bem-aventurados, na Corte Celeste, tributam ao glorioso São José. De sorte que, por todos estes fundamentos e razões, compete mais ao nosso Santo um resplendor singular, que, como insígnia de sua admirável dignidade, o distinga entre os outros Celestiais Cortesãos; e este é uma coroa de doze estrelas correspondentes a outras tantas prerrogativas, que engrandecem sua glória, para que, da mesma sorte que sua imaculada Esposa Maria Santíssima está no Reino da feliz eternidade coroada de doze estrelas, como Rainha dos Céus e dos Anjos, esteja também o Esposo pelo mesmo título analogicamente coroado com outras tantas brilhantes estrelas e excelências, para se verificar nele o vaticínio do Profeta Isaías.

            A primeira estrela ou excelência que se vê brilhar na coroa de São José, é a dignidade real semelhante à de sua Esposa, com quem se deve conformar em tudo que for possível. A segunda estrela é a excelência de sua digníssima eleição de pai reputado de Jesus Cristo e Esposo verdadeiro de sua Mãe. A terceira é o grande título, que o Evangelho lhe dá de Justo, que compreende em si todas as virtudes da perfeição. A quarta é a excelência de sua integridade e virginal pureza. A quinta é o amor singularíssimo, que lhe teve Maria Santíssima, sua Esposa, a sexta é o privilégio da íntima conversação e sociedade, que teve com sua Divina Esposa pelo espaço de trinta anos.

            A sétima estrela da coroa do glorioso São José é a felicidade de haver ocupado sua existência com Jesus e sua Santíssima Mãe. A oitava são as incomparáveis honras, que recebeu nesta vida de Jesus e Maria. A nona é a inefável consolação, que teve com a presença do Redentor enquanto viveu. A décima é o muito que foi estimado de sua amantíssima Esposa. A undécima é a união perfeita e mística, que teve com Deus pela Fé, pela contemplação e caridade. A duodécima é a parte que em sua alma teve toda a Santíssima Trindade.

            De todas estas doze brilhantes estrelas é composta a preciosíssima coroa de São José, a qual guarnecem também outras muitas resplandecentes prerrogativas, que são outros tantos júbilos de glória acidental, que o nosso Santo goza na Bem-aventurança, e com que se aumenta o resplendor formosíssimo da sua glória tão distinta entre os mais Cortesãos daquela Celestial Jerusalém. 

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A vida de São José pela Associação de Adoração Contínua a Jesus Sacramentado. Livraria Francisco Alves. 1927.

27 de Março - Mês Dedicado a São José

Desce a alma de São José ao Limbo: ressuscita gloriosamente com Cristo, e com ele sobre ao Céu em corpo e alma


            Honrando Cristo Senhor nosso, de muitos modos, em vida, a seu estimado Pai, continuou a honrá-lo também depois de morto, mandando logo aos Arcanjos São Miguel e Gabriel que conduzissem sua alma em companhia de muitos Coros de Anjos para o repouso do Limbo ou Seio de Abraão, onde esperavam as almas dos Patriarcas, Reis, Profetas e mais Justos pela redenção do gênero humano. Ali entrou o Bem-aventurado José com o especial caráter de legado e como precursor de Jesus Cristo, para os consolar e animar de novo suas esperanças.

            Que alegres festas fariam, contempla um Varão pio e douto, à puríssima alma de São José aqueles Santos Padres, que ali estavam, sabendo dos Anjos quem ele era, as dignidades e prerrogativas, que no mundo lograra? Como o cercariam todos, e lhe diriam contentes: Oh alma venturosa de tão ditoso corpo, cujos olhos mereceram ver e gozar o que nós há tanto tempo suspiramos; informai-nos, alma felicíssima, da vinda do Messias ao mundo e de suas perfeições e excelências. Dizei-nos se está já chegado o prazo e o fim deste nosso tão dilatado desterro. De tudo lhe daria o Santo Patriarca mui plena e exata informação.

            Nesta feliz menção sentia a alma de São José a ausência de Cristo, e tanto mais quanto amava a Jesus mais que todos; passando o tempo em contínuas súplicas, orando ao Céu que viesse o Senhor tirá-lo daquelas prisões, em que estava, até que o Redentor do mundo concluindo a redenção do gênero humano, triunfou da morte, e desceu glorioso ao Limbo, como Rei soberano e vitorioso.

            É crível que o Senhor depois que todos o adoraram, e ele abraçou a todos, tratasse a São José seu estimado Pai, com maior carinho e atenção. Ao entender do iluminado espírito de São Francisco de Salles, falaria assim a Cristo o venturoso São José: “Senhor, e Redentor meu, lembrai-vos, se é do vosso agrado, que, quando baixastes do Céu à terra, vos recebi em minha casa e em minha família, e que, depois que nascestes, vos recebi entre os meus  braços; agora que haveis de subir ao Céu, levai-me convosco. Eu vos recebi na minha família, recebei-me agora na vossa; e como eu tive cuidado de alimentar-vos, enquanto durou a vida mortal, cuidai agora de mim e conduzi-me à vida eterna”.

            Assim o fez o Senhor como Filho amantíssimo e agradecido, ressuscitando-o juntamente no dia da sua prodigiosa Ressurreição, em corpo glorioso. Diz o Evangelista São Mateus, no capítulo 27, que ressuscitaram como Jesus Cristo muitos corpos de Santos, os quais, levantando-se e saindo de suas sepulturas depois de Cristo ressuscitado, vieram à Santa Cidade de Jerusalém e apareceram a muitos; e, entre estes que ressuscitaram, não há outro, que com mais razão pudesse gozar deste privilégio que o glorioso São José.

            A razão é persuasiva; porque, sendo o fim deste prodígio testemunhar aos de Jerusalém que Jesus Cristo havia ressuscitado verdadeiramente, é crível que fossem aqueles justos, que pouco tempo antes tivessem falecido e fossem conhecidos em Jerusalém, e ninguém melhor que São José, o qual, na Cidade e em seus contornos se tinha feito conhecido de todos e era reputado por Pai de Jesus. Também é muito verossímil que os Justos, que ressuscitaram, fossem aqueles, que tinham maior conexão com Cristo ou por parentesco, ou por virtudes, e em nenhum outro se achavam mais unidas estas condições, que no gloriosíssimo Patriarca São José.

            É tradição da Igreja, recebida e celebrada por todos ou fiéis e Doutores sem controvérsia, que a primeira pessoa, a quem Cristo pareceu ressuscitado e glorioso, foi a sua Mãe Santíssima; porque, segundo a regra do Apóstolo, assim como tinha sido a primeira nas dores, o fosse também nas consolações; e, como na companhia do Senhor vinha São José, como piamente cremos, é indubitável que na Virgem seriam iguais os júbilos com a vista alegre do Filho e do Esposo ressuscitado. Então podemos dizer que também ressuscitará o esposo da Virgem Maria, assim como de Jacó diz a Escritura que ressuscitara, quando soube ser vivo seu filho José, que tinha chorado como morto.

            Nenhum Santo há que se atreva a declarar os extremos de alegria e gozo inefável, com que a cheia de graça foi também cheia de glória nestes dias de seu maior júbilo, dando e recebendo parabéns da Ressurreição do Filho e do Esposo. O Filho, para consolar inteiramente a Mãe do trabalhos passados com a glória presente, lhe diria que já era tempo de primavera festiva e alegre, que já nasciam e renasciam flores do mesmo sepulcro, trocando-se as suas chagas em lírios vistosos; e, entre as belas flores do ameno jardim de Nazaré resplandecentes e formosas, lhe mostraria o Senhor, em traje de jardineiro, a açucena cândida de seu felicíssimo Esposo, o sempre Virgem São José.

            Acrescenta São Bernardino de Sena, dizendo que Cristo Senhor nosso levara consigo ressuscitado a São José, cheio de grande glória, para que aliviasse a pena de sua Esposa Maria Santíssima, e que lho mostrara entre todos os Santos Padres com um especialíssimo diadema de ouro na cabeça em forma de Cruz, significando assim como era superior aos mais Santos, como o ouro aos outros metais.

             Não é pequena a controvérsia e mui debatida entre antigos e modernos sobre a natureza dos Justos, que ressuscitaram com Cristo, se foi no estado de vida mortal, como sucedeu a Lázaro, ou no de vida gloriosa para nunca mais morrer. De certo nada está decidido, e a respeito há duas opiniões. A primeira afirma que aqueles Santos ressuscitaram por pouco tempo, e para tornarem outra vez a morrer. Seguem-na Santo Agostinho, São Tomás.

            A segunda opinião, porém, é que aquela ressurreição dos Justos fora para vida imortal e gloriosa, e pela qual militam muitos Doutores. A razão é, porque de outra maneira ficariam aqueles Bem-aventurados em pior condição, do que quando estavam no escuro cárcere do Limbo, se ficassem na vida terrestre para morrerem outra vez. Das mesmas palavras do Evangelista, que diz apareceram a muitos esses Santos ressuscitados, e não a todos, se infere que eles tinham corpos glorificados, em cujo poder estava manifestar-se, ou ocultar-se, quando e como queriam, para confirmar a evidência da Ressurreição de Cristo.

            E, como este Senhor dizia que as suas delícias era estar com os filhos dos homens, é de crer, diz o grande Suares, que tivesse deles alguns companheiros de sua glória em corpo e alma, para que, assim como se manifesta a Divina Justiça havendo no Inferno alguns homens em corpo e alma, antes de geral ressurreição dos condenados, como Dathan e Abiron, Levitas sediciosos, assim convinha que, para demonstração da Divina misericórdia e Redenção copiosíssima de Jesus Cristo, recebesse no Céu alguns Justos glorificados em corpo e alma, antes da ressurreição universal dos Bem-aventurados.

            Assim sendo, faz-se crível que o Senhor, no dia da sua admirável Ascensão, levasse consigo para a Jerusalém Celeste o glorioso São José em corpo e alma, para gozar dos prêmios inefáveis da Bem-aventurança. Pregando isto em Pádua, São Bernardino de Sena, diz André de Soto que, quando o Santo discorria sobre o assunto, viu o auditório resplandecer sobre a cabeça do Santo um Cruz de ouro; e acrescenta Carthagena que nenhuma dificuldade tem em dar crédito a este prodígio, pois que o mesmo Santo dissera as seguintes palavras:

            “Piamente se há de crer que o piedosíssimo Filho de Deus honrasse com semelhante privilégio a seu Pai virginal, assim como honrou a sua Santíssima Mãe; e, assim como levou a Virgem gloriosa para o Céu em corpo e alma, assim também no dia, em que ressuscitou, levou consigo o Santíssimo José gloriosamente ressuscitado, para que, da mesma sorte que os membros da Sacra Família, Jesus, Maria e José viveram juntos na terra em vida trabalhosa e em união de graça, assim em amorosa glória reinem no Céu e corpo e alma; ou, como diz Riquelio, para que assim como há no Céu uma Santíssima Trindade de Pessoas na natureza Divina, Pai, Filho e Espírito Santo, houvesse também na terra outra adorável Trindade de Pessoas, a saber: Jesus, Maria, José”.

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 A vida de São José pela Associação de Adoração Contínua a Jesus Sacramentado - Livraria Francisco Alves, 1927

26 de Março - Mês Dedicado a São José

Da Felicíssima Morte do Glorioso Patriarca São José


                Não consta da Escritura quando falecera o venturoso São José.
            A opinião mais provável é dos que dizem que o Bem-aventurado São José falecera antes da Paixão de Cristo, e antes das Bodas de Caná da Galileia, não só porque nessa ocasião, havendo motivo, os Evangelistas já não falaram nele, mas porque, como desse tempo por diante começou Jesus Cristo a estabelecer e seguir outro modo de vida mais próprio para se manifestar não como Filho de São José, mas como verdadeiro Deus e Homem, e Redentor do mundo, cessava o fim do ministério de São José. Até ali quis o Senhor honrá-lo com o título tão glorioso, como era o de seu Pai, e gozar de sua companhia e da sombra, que faz um pai amoroso a um filho obediente.
            Chegando, pois, o tempo, em que Jesus Cristo quis dar a conhecer ao mundo que era o Messias prometido e promulgar a Lei Evangélica, e justamente evitar que seu pai legal visse com seus olhos as afrontas, que ele havia de padecer na sua Paixão, quis pô-lo em salvo, abreviando-lhe a vida, favor especial, fundado em piedade e amor. De sorte que o argumento de Santo Epifanio, em que mostra ser já falecido São José, quando Cristo padeceu, é racionável e convence, pois o Senhor não deixaria entregue e recomendada a Virgem a São João Evangelista, se estivesse ainda vivo seu amantíssimo Esposo São José.
            Em que idade falecesse, também não é uniforme o parecer de todos.
            O mais provável é que fosse aos setenta anos, porque o glorioso Santo esteve desposado com a Virgem trinta anos e a desposou com quarenta. O dia fixo e determinado da sua bem-aventurada morte padece igual incerteza, julgando a maior número que fosse em 19 de março.
            Quanto ao lugar, onde faleceu, parece ter sido Nazaré, donde depois se transladara seu corpo para o vale de Josafat.
            Somos propensos a crer que São José morresse set ter sofrido moléstia alguma. Porque, se Jesus Cristo Senhor não teve enfermidade alguma pela perfeita harmonia de sua individual natureza, e o mesmo a soberana Senhora, ou já pela igualdade e equilíbrio do seu admirável temperamento, ou por especial privilégio, para que havemos de tirar esta prerrogativa ao nosso ditosíssimo Santo, a quem os seus grandes merecimentos lhe granjearam as mais singulares graças e privilégios?
            Adquire maior força este parecer com a tradição, que havia entre os Católicos Orientais: “Envelheceu José, e chegou aos últimos dias da sua vida, porém seu corpo não estava debilitado em forças; conservava nos olhos a sua vista perfeita, e na boca todos os seus dentes. Em tanta idade tinha ainda todo o seu vigor, e tão robusto se considerava em seus membros sendo velho, como quando era moço. Chegou-lhe, enfim, o dia da morte, e, aparecendo-lhe o Anjo do Senhor, que era o seu mesmo Anjo da guarda, disse-lhe que cedo partiria deste mundo, e a sua alma iria, alegre, acompanhar os Santos Padres do Limbo. Caiu logo enfermo na cama, e, agravando-se-lhe a moléstia, lhe chegou a hora da morte”.
            A verdadeira enfermidade, de que morrera São José, fora a veemência do amor.
            O memorável Gerson chamou à morte de São José morte alegre, e só pode ser alegre e preciosa aquela morte, quando o amor tira a vida. É bem verdade que os Sagrados Intérpretes da Escritura não declaram de que gênero de morte falecera São José; cremos, porém, que o Santo acabara os seus dias pelo incêndio do amor, que lhe derreteu o coração, e que, à maneira de Elias abrasado em vivas chamas do amor Divino, fora arrebatado para o outro mundo.
            Não é para desprezar outra razão de congruência, porque menor graça é morrer à eficácia do amor intenso de Deus, do que ser predestinado para o ministério da união hipostática. Nós vemos que o felicíssimo São José ainda sem o aumento de graça, que depois teve, foi escolhido para Esposo da Virgem, e ministro daquela inefável união: logo parece que lhe devemos considerar, no fim da vida, a graça e o privilégio de morrer abrasado em amor de Deus, e ser este a causa, que o privou dos alentos vitais.
            Deve-se crer, piamente, que na morte de São José estivessem presentes Jesus Cristo e Maria Santíssima, sua Esposa. E com esta bem-aventurada assistência, que ilustrações, confortos, e esperanças da eterna felicidade não receberia São José de sua Santíssima Esposa e seu amado Filho!
            Bastava a presença, ou só de Cristo, ou só de Maria Santíssima para beatificar a morte de São José; e que faria nesta última hora a adorável assistência de ambos? É para admirar como pudera São José expirar, assistindo-lhe o Pai e a Mãe do Autor da mesma vida. A Virgem Maria com a sua Santíssima presença infundia elementos de vida a seu amantíssimo Esposo, e, por isso, a morte não se atrevia a chegar-se a sua cabeceira. No peito de São José, lutavam neste último transe as forças de duas vontades, a de não se apartar de Jesus e de Maria, e a de obedecer ao Divino beneplácito; e, porque toda a sua vida foi conformar-se com a vontade Divina, entendendo estar chegando aos seus dias o último período, cedeu às disposições do Altíssimo.
            Foi conveniente que a alma de São José se desatasse das prisões do corpo, para que não imaginasse o mundo que era mais que homem e de nenhuma sorte sujeito às leis da condição humana, caduca e mortal, o Pai virginal de Cristo, o Esposo verdadeiro da Mãe de Deus, o familiar dos Anjos, o Secretário dos Mistérios do Onipotente, e o primeiro Ministro econômico do Unigênito do Pai Eterno.
            Essa santíssima e respeitosa preferência de Jesus e da Virgem Maria causaram ao venturoso São José o singular privilégio, a poucos até agora concedido, que foi o não sentir, naquele último dos assaltos do demônio, nem o aspecto da sua vista horrorosa.
            Como seriam cheias de ternura e saudades aquelas últimas palavras, com que São José se despediria de Cristo e de sua Esposa! Dai-me vossos braços, Filho amado (diria São José ao Redentor do mundo), e, ainda que é ofício do Pai dar a benção, agora sou eu quem a peço, para que, amparado dela, não ofendam as fúrias do Inferno, e possa dormir descansado na vossa paz o sono da morte. Sinto muito ausentar-me de vós; morro, porém, contente, não só porque entendo ser disposição inevitável do Altíssimo, mas porque deixo já no mundo o tesouro infinito do seu remédio, com que se há de remir a culpa do primeiro homem. Naquelas antigas trevas esperarei a brilhante luz da vossa glória, e darei, entretanto, alegres novas aos Santos, que ali vos esperam, pois ordenais que eu vá adiante anunciar-lhe tão grande dita.
            E vós, Esposa minha muito amada, espelho de pureza, ficai-vos com Deus, que eu me vou para não vos tornar a ver mais nesta carne mortal. Muito vos devo, pois de todas as minhas felicidades fostes a causa e a intercessora, e assim será grande a minha glória, quando vos ver coroada Rainha do Céus. Ainda que vos falte desde hoje a minha companhia, ficais muito bem acompanhada, pois fica convosco o Filho de Deus como vosso verdadeiro e fiel amparo.
            Estas últimas e saudosas palavras de São José é crível que não ficariam sem agradecida resposta do Filho e da Esposa, e assim dando os últimos alentos no ósculo do Senhor, espirou São José felizmente nos braços de Jesus e de Maria Santíssima. Foi, na verdade, correspondência digna de amor de Cristo que nos seus braços morresse São José, pois que nos de São José viveu sempre Jesus Cristo.
            O Senhor lhe fechara os olhos depois que espirar, e juntamente com a Virgem choraram a morte do Santo; porque se Cristo, Bem nosso, chorou por ver a Lázaro morto, quanto mais piedosa causa era chorar a morte de São José, seu estimado Pai, acompanhado com suas lágrimas as que também por ele derramaria a Virgem, sua Esposa.
            Foram as lágrimas de Jesus e da Virgem Maria para o cadáver de São José mais precioso bálsamo, que aquele, com que se ungem os corpos dos Reis Soberanos; porque ainda que seja puro e excelente, com o tempo enfim se corrompe; porém com as lágrimas tão preciosíssimas de Cristo e da Virgem ficou incorrupto o adorável corpo do Santo, permanecendo intacto, até que, reunida nele a alma na Ascensão do Senhor, se vestia da eterna incorruptibilidade no Céu.
            Vendo a Virgem Maria a seu Esposo defunto, preparou seu corpo para a sepultura, e o vestiu conforme o costume, não consentindo que chegassem a ele outras mãos mais que as suas, e as dos Santos Anjos, que a ajudaram a amortalhar. Logo, com a assistência e acompanhamento dos parentes, conhecidos e outros muitos, e com especialidade de Cristo e sua Beatíssima Mãe, com grande multidão de Anjos, foi levado o sagrado corpo de São José a sepultura.
            Recebeu a Virgem Maria pêsames e pôs insígnias de luto, como naquele tempo se usava trazer pelos defuntos, que era vestido preto em sinal de tristeza, fazendo todos os ofícios fúnebres, que a piedade e costume havia introduzido naquele povo, porque a Virgem, pela razão de Esposa e Cristo pela de Filho, reputado na opinião do mundo, não podiam deixar de cumprir estas obrigações sem a censura de seus vizinhos e parentes, sendo que, como Maria Santíssima sabia que a alma bem-aventurada de seu Santo Esposo não tinha coisa que purificar, por isso lhe não fizera sufrágios.
            O lugar, onde foi sepultado, dizem ser no vale de Josafat que fica entre os montes de Sião e das Oliveiras. Acha-se hoje dentro da suntuosa Igreja, que a Rainha Santa Helena mandou edificar no mesmo sítio, e chama-se o sepulcro da Virgem, por ser também ali sepultada Maria Santíssima. Desce-se a esta Igreja, que é subterrânea, por cinquenta degraus repartidos em vários tabuleiros, ou lanços espaçosos. Da parte esquerda para quem desce, vê-se embutida na parede, uma pequena Capela, que dizem ser o sepulcro de São José, diante da qual arde, de contínuo, uma lâmpada, de que têm cuidado os Religiosos de São Francisco, os quais mandam todos os dias do Convento de São Salvador de Jerusalém a um Religioso sacerdote dizer ali Missa, e o Acólito, por obrigação, incensa também o Altar do sepulcro do Santo. Assim parecia justo que ambos os Divinos Esposos participassem do mesmo digno depósito, e que um próprio relicário guardasse as mesmas relíquias, que haviam de ser juntamente colocadas no supremo santuário do Céu.

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A vida de São José pela Associação de Adoração Contínua a Jesus Sacramentado. Livraria Francisco Alves, 1927