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05/03 - Em honra a São José - excertos do livro

SÃO JOSÉ
Na Vida de Cristo e da Igreja
Pe. Maurício Meschler, S.J.
Edição de 1943

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4.     NO TEMPLO DE JERUSALÉM
Decorridos quarenta dias do nascimento de Jesus em Belém, chegou o momento em que o Menino devia ser apresentado ao Senhor no templo e Maria sua mãe devia oferecer um sacrifício para a sua própria purificação.
Em testemunho dos seus direitos sobre o povo escolhido, ou como autor de toda paternidade, ou por haver libertado Israel da servidão do Egito, Deus queria não somente que os levitas lhe fossem especialmente consagrados, mas ainda que todo primogênito dos hebreus lhe fosse apresentado e resgatado ao preço de cinco siclos. A apresentação devia fazê-la o pai, trinta dias — ou mais tarde — após o nascimento do menino. Quanto à mãe, quarenta dias depois de haver dado à luz um filho, devia ela purificar-se da impureza legal contraída, oferecendo em sacrifício um cordeiro ou, se fosse pobre, duas rolas.
São José partiu de Belém, grato para com todos os que tinham podido testemunhar-lhe qualquer bondade, grato sobretudo para com Deus por todas as alegrias que lhe trouxera o nascimento de Jesus, a adoração pelos pastores, a revelação maravilhosa e a circuncisão.
Atravessou de novo o planalto de Refaim, que a primavera começava a embelezar com os seus primeiros adornos.
Outrora, Abraão seguira aquele mesmo caminho quando ia imolar seu filho Isaac nomonte Moria. Das alturas que coroam o vale de Hinon, a Sagrada Família avistou Jerusalém, com suas muralhas ameiadas, a poderosa cidade de Davi, o Templo e, no fundo, o Montedas Oliveiras.
José, com o Menino e sua mãe, pernoitou na cidade ou num dos subúrbios. No dia seguinte, à hora do sacrifício matutino, a Sagrada Família dirigiu-se ao Templo e, pela primeira vez, o Salvador contemplou com seus olhos mortais o santuário de Deus entre seu povo, os pórticos, as pontes, as muralhas, o recinto, o átrio dos Gentios pelo qual se chegava, por degraus, à grande porta de Nicanor.
Aí se achava um ancião de aspecto venerando, que parecia esperá-los. Avançando ao encontro deles, inclinou-se respeitosamente e abriu os braços como que para receber o Menino-Deus. Era Simeão, que o impulso do Espírito Santo conduzira ao templo para saudar o Salvador. Maria confiou-lhe o Menino.
Fra Angélico representa-nos o arroubo do santo ancião: Simeão segura Jesus nos braços e contempla-o como se contempla um semblante querido, conhecido e amado desde muito. À vista da beleza eternamente jovem do seu Deus, Simeão sentiu o coração rejuvenescer-se, seus lábios se entreabriram e ele entoou aquele cântico de ação de graças que a Igreja repete cada noite para agradecer ao Senhor. Dir-se-ia os olhos de Jesus lhe haviam proporcionado grandiosa visão, a visão de todos os mistérios do Homem-Deus até o desfecho sangrento do Calvário. No seu cântico, o ancião rendia graças ao Senhor por haver chegado a sua hora e ter podido ver a Salvação do mundo. Agora, ele morreria em paz, pois a vida não tinha nada de mais belo a lhe oferecer. Aquele Menino — a Luz verdadeira — que suas mãos trêmulas elevavam agora no templo, ele a via espalhar-se não somente sobre Israel, mas até nas ilhas mais remotas e sobre as nações pagãs. Mas, com tristeza e dor, previa também que aquela Luz seria um juízo; que aquele Menino se tornaria uma pedra de escândalo e um sinal de contradições para muitos, através de todos os tempos, não só entre os pagãos, mas no próprio seio de Israel. Profundamente comovido, devolveu o Menino à mãe, a quem predisse misteriosos sofrimentos sob a imagem de um gládio que traspassaria o coração e a alma de Maria.
Nesse ínterim, sobreveio Ana. Era "uma viúva muito avançada em idade; não saia do templo, servindo a Deus com jejuns e orações dia e noite” (Lc 2,37). Por sua vez, reconheceu ela em Jesus o Salvador, o Messias. Nas suas faces pálidas e emagrecidas, no seu olhar apagado pelos anos, viu-se o reflexo de uma alegria celestial. E “ela pôs-se a louvar o Senhor e a falar dele a todos os que esperavam a redenção de Israel” (Lc. 2,38).
Maria e José admiravam em seu coração como, por testemunhos tão diversos, no céu e na terra, Deus revelava sempre mais a glória do Menino e os futuros acontecimentos da sua vida mortal.
Essa última revelação assumia uma importância singular, por suceder no próprio templo, por ser feita mediante personagens de santidade notória e em presença de grande número de testemunhas, por predizer, enfim,destinos excepcionais. Mas, profetizando assim o futuro do Menino, Simeão abrira nos corações de Maria e de José uma ferida que não mais se fecharia.
— “Que será deste Menino bem-amado?” — ter-se-á perguntado José, muitas vezes, apertando Jesus de encontro ao coração, vendo-o crescer incessantemente em graça e sabedoria. Não terá derramado lágrimas, lágrimas a um tempo de amor e de dor? Talvez, antes de deixar esta terra, Deus o tenha feito ver entreabrir-se o véu misterioso, permitindo aos seus olhos devassarem claramente o futuro...
Transpondo a balaustrada de pedra que separava o átrio dos Gentios do templo propriamente dito, Maria e José galgaram os degraus que conduziam à grandiosa porta de Nicanor. Perto dali, à direita, procedia-se aos ritos da purificação para as mulheres após o nascimento de um filho. Deviam elas apresentar-se ao sacerdote, que recitava sobre elas alguma oração e uma fórmula de bênção, franqueando-lhes novamente o acesso ao átrio das mulheres. Ali também se viam mealheiros destinados a receber as ofertas para os diversos sacrifícios. Conforme a quantia recolhida, imolava-se, após o sacrifício público da manhã, número maior ou menor de cordeiros e de rolas.
Maria submeteu-se à cerimônia da purificação, como seu filho se submetera à lei ritual da circuncisão. Na intenção do legislador, porém, e consoante o espírito da própria lei, ela a isso absolutamente não estava obrigada.
A partir do século XIII, a arte religiosa não deixa de nos mostrar São José presente à cerimônia da purificação. Ele traz numa cesta ou gaiolinha as rolas do sacrifício.
Após essa cerimônia — ou mesmo enquanto ela se efetuava — o pai oferecia seu filho primogênito ao Senhor e resgatava-o a preço de dinheiro. Segundo o rito prescrito, São José, na qualidade de pai, entregou o Menino a um sacerdote que, elevando-o nos braços e volvendo-se para o Santo dos Santos, o ofereceu ao Senhor e, após o pagamento dos cinco siclos, o restituiu ao pai, pronunciando uma bênção.
Dignou-se o Salvador submeter-se à cerimônia da apresentação no templo. De certo, Ele não precisava ser consagrado ao Senhor, nem ser santificado. A união da sua humanidade santa com a Segunda Pessoa da Divindade santificava-o e unia-o a Deus melhor do que o podia fazer um sacramento ou um rito qualquer. Nunca, no Antigo Testamento, fora oferecido sacrifício mais excelente no templo. A grandeza, beleza e glória desse sacrifício iluminavam o templo, a terra inteira, a universalidade dos séculos e, pelo seu contraste, faziam ressaltar a insignificância e insuficiência do antigo culto.
Naquele dia, porque o Messias acabava de entrar nele, o templo brilhava no esplendor em que o profeta (Ag 2,10) o contemplara. Esse sacrifício reunia em si só todos os sacrifícios da lei antiga; por ele, o sacerdócio antigo atingia o apogeu da sua glória. O próprio Deus acolheu a oferta ainda mais misericordiosamente do que no dia solene em que Salomão celebrou a dedicação do templo.

Ali mesmo, no monte Moria, o patriarca Abraão, oferecera ao Senhor seu filho primogênito. Agora, eis que outro Abraão, incomparavelmente mais justo que o primeiro; incomparavelmente mais caro a Deus, renova o sacrifício. É São José. E Deus faz do esposo de Maria o patriarca da nova lei. Se Maria, Simeão e Ana acompanharam José nessa cerimônia, glorificando o Senhor e repetindo as palavras do salmista: — “Deus é bom, eterna é a sua misericórdia: no meio de vosso templo sentimos a vossa misericórdia”, não era isso de alguma sorte a primeira procissão da Candelária, essa “festa de luzes” que sempre esteve e sempre estará em honra na Igreja?

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