Do Modo de Combater a NEGLIGÊNCIA

Excertos do Livro
O Combate Espiritual
Dom Lorenzo Scúpoli
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Capítulo XX

Do Modo de Combater a Negligência

A negligência é um obstáculo à perfeição, pois entrega os que têm este vício, nas mãos dos inimigos. Para que não te tornes escrava deste pecado, é preciso que fujas da curiosidade, do apego aos bens terrenos e de qualquer ocupação que não convenha ao teu estado.
É preciso que faças esforço para corresponder com presteza a toda a boa inspiração e a qualquer ordem de teus superiores, fazendo tudo no seu tempo, e do modo que os superiores querem.
Não demores, por pouco que seja, a obedecer. Esta falta de diligência acarretará uma segunda, logo uma terceira e outras muitas. Os sentidos se habituam à negligência e cederás então, mais facilmente que no princípio, pois já estás presa do prazer que provaste.
E assim te irás habituando a começar teu trabalho muito tarde, ou então, deixá-lo-ás muitas vezes, como coisa merecida. Pouco a pouco, irá se formando o hábito de negligencia, que se tornará totalmente forte, que, no momento da falta, reconheceremos que somos muito negligentes, sentiremos repugnância de nós mesmos, mas somente faremos o propósito de, mais tarde, em outra ocasião, sermos solícitos e diligentes.
Esta negligência atingirá a toda a nossa alma. Seu veneno infeccionará não somente a vontade, fazendo-a aborrecer aquele trabalho, mas chegará a obcecar a inteligência, de modo tal que ela não verá como são vãos aqueles propósitos de resistir, no futuro, diligentemente, às tentações a que agora, voluntariamente, sucumbirmos.
Não basta fazer, a qualquer momento, o que devemos fazer. É preciso esperar o seu tempo, que será marcado pela hora de realizá-lo, importa fazê-lo com toda a diligência, para que seja cumprido o dever, com toda a perfeição possível.
Fazer um trabalho antes do tempo, não é diligência, mas finíssima negligência. Fazê-lo apressadamente e sem cuidado, com os olhos fitos no descanso que poderemos desfrutar depois, também não passa de negligência.
Estes atos acarretam grande mal à alma, porque não se considera o valor da obra boa, feita no seu tempo, e não se enfrenta com animo resoluto, a fadiga e as dificuldades, que o vício da negligência apresenta, sempre, aos soldados novos.
Deves lembrar-te que uma só elevação da mente a Deus e uma genuflexão em sua honra, vale mais que todos os tesouros do mundo. E que, sempre que fazemos violência a nós mesmos e às nossas paixões viciosas, os anjos nos trazem do reino dos céus uma coroa de gloriosa vitória.
Aos negligentes, Deus vai tirando as graças que lhes dava, e aos diligentes as graças vão crescendo, para que aquelas almas gozem, um dia, no Senhor.
Se nos primeiros princípios, não tens energia para reagir generosamente contra a fadiga e as dificuldades, sempre que as ocultes, para que pareçam menores do que os negligentes as dizem.
Às vezes, é preciso que faças muitos e muitos atos para conquistar uma virtude, e te afadigues muitos dias. Os inimigos te parecem então muito fortes. Começa por isso, a produzir atos, como se fizesses pouca conta deles. Imagina que é por pouco tempo que te precisas afadigar. Combate contra um inimigo, como se não te restassem outros a serem combatidos. E tem sempre uma grande confiança no auxilio que Deus te dispensará, mais forte que o poder dos inimigos. Deste modo, tua negligência começará a se enfraquecer e tua alma se irá dispondo a adquirir a virtude contrária.
Digo o mesmo a respeito da oração. Se ela, por exemplo, deve durar uma hora e isto parece pesado à tua negligência, começa a rezar como se fosse fazer somente durante um oitavo de hora. Passarás depois, com facilidade, ao segundo oitavo, ao terceiro e assim por diante. Mas se, no segundo ou em algum outro oitavo de hora, sentisses que a repugnância e a dificuldade eram fortes demais deixa para depois a oração, para não te cansares em demasia. Mas não te esqueças de retomar, pouco depois, o exercício.
Do mesmo modo deves proceder quanto aos trabalhos manuais, quando acontece que precises fazer muitas coisas e pareçam dificultosas demais, à tua negligência, e te causam aflição.
Começa o teu trabalho corajosamente, e empreende uma das obras, como se fosse a única. Cumprirás assim, todo aquele mister que, à tua negligencio, parecia de grande fadiga.
Se assim não fizeres e não combateres a negligência, prevalecerá em ti este vício, que, não somente a fadiga que sentires durante o exercício da virtude te assustará, mas temerás sempre as dificuldades que te advirão dos trabalhos futuros. E estarás sempre ansiosa, temerás sempre os futuros assaltados do inimigo e recearás a todo o momento, que alguém te venha impor alguma coisa desagradável. Viverás sempre inquieta.
E lembro-te, filha, de que este vício da negligência, pouco a pouco, com seu veneno escondido, não somente ataca as primeiras e pequeninas raízes, que fariam crescer os hábitos das virtudes, mas ferem também os hábitos já adquiridos. É perfeitamente, como o cupim. O vício vai roendo insensivelmente e consumindo o âmago da vida espiritual. O demônio arma este laço contra todos os homens, especialmente contra os mais piedosos.
Vigia, portanto, reza e pratica o bem e não te demores a tecer a fazenda para a veste nupcial, pois deves estar sempre pronta para ir ao encontro do esposo.
E lembra-te todo o dia, de que quem te dá a manhã não te promete a tarde, e quem te dá a tarde não te promete a manha.
Usa, portanto, de todos os teus segundos e minutos, de acordo com a Vontade Divina, e como se fossem os últimos momentos de tua vida. Além disto, deverás prestar conta minuciosíssima de todos os teus instantes.
Concluo, aconselhando-te a que tenhas como perdido o dia em que, mesmo se trabalhaste muito, não conseguiste muitas vitórias contra as tuas más inclinações e contra a tua vontade própria, ou não agradeceste ao Senhor dos benefícios que te concedeu, particularmente a penosa Paixão que Ele sofreu por ti, e paterno e doce castigo, com que te puniu, te fez digna do tesouro inestimável de algumas tribulações.

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Retirado do livro: O Combate Espiritual e o Caminho do Paraíso - Ven. Servo de Deus Lourenço Scúpoli - Edição de 1939

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