SÃO JOSÉ
Na Vida de Cristo e da Igreja
Na Vida de Cristo e da Igreja
Pe. Maurício Meschler, S.J.
Edição de 1943
10. JOSÉ, “FILHO QUE CRESCE”
Como
vimos, são José está inseparavelmente unido à pessoa e a vida do Salvador.
Está, portanto ligado à própria origem,
à base do cristianismo. Destarte, ele não podia deixar de receber,na Igreja,
honras e culto correspondentes à sua dignidade. Esse culto tem suas raízesno relato
do Evangelho, e desenvolveu-se maravilhosamente: o grão de mostarda tornou-se
árvore magnífica. Essa lei de progresso lento, de crescimento apenas perceptível,
é uma lei do cristianismo. Se ela se aplica a todo cristão, e ao próprio
Salvador, então se verifica particularmente no que concerne ao pai nutrício de Jesus.
No culto de São José poderíamos distinguir, de alguma sorte, diversas estações,
como o fazemos com os meses do ano: poderíamos reconhecer um período preparatório,
uma primavera, um verão.
O
primeiro período prolongou-se até o século XII. Enquanto o Salvador, sua santa
Mãe e grande número de mártires eram objeto de um culto público e de
solenidades religiosas, não se acham, no correr dos primeiros séculos, ao menos
exteriormente, senão vestígios relativamente pouco numerosos de uma homenagem
prestada a São José. As circunstâncias explicam que, nos primeiros tempos, a
memória dos mártires fosse honrada de preferência à dos outros santos. Na origem
do cristianismo, tratava-se de defender contra os ataques do paganismo e da
heresia a divindade de Jesus Cristo e o seu nascimento virginal, muito mais do
que afirmar a sua descendência da raça de Adão e a realidade da sua humanidade.
Sob este ponto de vista, ainda não era chegada a hora de prestar um culto
público a São José. É uma lei da Providência Divina o fixar a toda criatura o
círculo da sua ação, e pôr a vida e as diversas vicissitudes dessa vida em
harmonia constante com o fito designado. Do mesmo modo que nesta terra, pela
sua paternidade legal, São José velou por algum tempo a divindade do Salvador,
assim também, mais tarde, desaparecendo, ele mesmo devia, pelo contrário,
contribuir para focalizar ainda mais essa mesma divindade.
Todavia,
os próprios séculos não deixaram de dar gloriosos testemunhos à grandeza do
nosso santo. Os Doutores e Padres da Igreja — Justino, Orígenes, Efrém,
Crisóstomo, Jerônimo, — nas suas homilias e comentários, comprazem-se em
prestar homenagem a São José. Mais tarde, na Igreja do Oriente e em particular
nos mosteiros e conventos, achamos duas festas instituídas em sua honra. A arte
cristã — como tivemos ensejo de observar — mostra-nos em São José o chefe e o protetor
da Sagrada Família. Temos disso um exemplo notável nos mosaicos de Santa Maria Maior,
que datam do século V.
A
primeira estação dessa devoção principia no século XII, ao menos para a Igreja
do Ocidente. Nessa época é o culto de São José um fato historicamente atestado.
Vozes possantes proclamam-lhe as grandezas: citemos São Bernardo, Ruperto de
Deutz, Hugo de São Vitor, Ludolfo de Saxe, sem falar de tantas outras almas
santas, como santa Margarida de Cortona, etc. A devoção de São José era cara à
Ordem dos Dominicanos e à dos Franciscanos, destacando-se os eminentes mestres
escolásticos Pedro Lombardo, Alberto Magno, Tomás de Aquino, João Duns Scotts,
Boaventura, Durando e outros.
Mas
é sobretudo no século XV que ela se expande. No concílio de Constança (1416), o
douto Gerson, num discurso eloquente, pediu fosse instituída na Igreja uma
festa em honra do santo; e o mestre de Gerson, o célebre cardeal Pedro d’Ailly,
publicou o seu livro sobre as glórias e privilégios de São José. Em diversos
lugares já se celebrava uma festa de São José, e por quase toda a Europa eram
consagradas igrejas ao Patriarca. Esse movimento foi poderosamente secundado
pelas pregações de três religiosos franciscanos: Bernardino de Sena (1418),
Bernardino de Felto (1487) e Bernardino de Busto (1500), assim como pelo famoso
livro do dominicano Isolani, pelos escritos teológicos do jesuíta Suarez (1617)
e por Santa Teresa (1582), que colocou quinze de suas fundações sob a proteção
de São José.
A
devoção ao nosso santo teve o seu verão a partir do século XVII. O jesuíta
Cotton (1626) introduzia-a na corte de França. Bossuet pronunciava o seu
célebre panegírico de São José com tal êxito, que o papa Urbano VIII ordenou
que a festa do santo fosse, na França, uma festa feriada. O imperador Leopoldo
I, em ação de graças pelo nascimento do herdeiro do trono (José I) e pela
libertação da cidade de Viena ameaçada pelos turcos, punha seus Estados sob a
proteção do glorioso Patriarca (1677) e, com autorização do Papa, prescrevia
que a festa dos Desposórios de José e de Maria fosse solenemente celebrada. Clemente
XI (1714) compunha o ofício santo e ordenava-lhe a recitação na Igreja universal.
Bento XIII (1726), por solicitação do imperador Carlos VI e de várias Ordens
religiosas, introduzia o nome de José nas ladainhas dos santos.
Finalmente
o zelo dos séculos XV, XVI, XVII e XVIII pela glória de São José teveo seu
coroamento no século XIX. Realizando os desejos expressos, havia muito, por
fervorosos servos do Pai nutrício de Jesus, Pio IX (1847) quis que a festa do
Patrocínio de São José se estendesse a toda Igreja, que o mês de março todo fosse
consagrado ao santo, que enfim José fosse proclamado o Padroeiro da Igreja universal.
Isto em 1870.Por seu turno, a 15 de agosto de 1889, Leão XIII, em eloquente
encíclica, recomendava a devoção a São José.
Como
se vê, nada faltava de então por diante à glória do nosso santo. Foi quase
desde a origem do cristianismo, no Oriente e, autenticamente pelo menos, a
partir do século XII no Ocidente, que essa devoção se espalhou entre os fiéis.
Ela foi sempre crescendo e se precisando. A Igreja secundou esse surto das
almas piedosas evidentemente inspirada pelo Espírito Santo. Aprovou essa
devoção, favoreceu-a. Cada século veio trazer sua contribuição ao monumento
assim levantado em honra de São José. O povo, os artistas (desde o século XV,
sobretudo), os teólogos, os escritores ascéticos, as Ordens religiosas, os
santos e os sumos pontífices — todos trabalharam para a glória dele; e o trono
em que o colocaram só é inferior aos tronos de Maria e do Salvador. Assim
verificou-se a palavra do Senhor: — “Ele
honra os que o honram”; “Aquele que
foi o guarda de seu amo será louvado”; “O
servo fiel será estabelecido sobre todos os bens de seu amo” (Prov 27,18).
Com
que magnificência recompensou Jesus os fiéis serviços de seu pai nutrício! Com
que liberalidade indenizou-o de uma demora que era conforme às disposições da Providência!
Se a Igreja não prestou logo um culto público a São José, invoca-o agora como
seu Padroeiro especial: — “Em vossas mãos
está a nossa salvação”, diz-lhe ela; “Lançai
sobre nós os vossos olhares, e com alegria serviremos o Rei” (Gn 47,25).
José,
filho de Jacó, o ministro do Faraó, foi, segundo a Sagrada Escritura, “um filho que cresce”. Cada uma de suas
provações trazia-lhe em definitivo um acréscimo de glória e de autoridade, quer
Ele ainda estivesse debaixo das tendas do pai, quer na casa do sacerdote do
sol, quer na prisão de onde saiu para se tornar o senhor do Egito. Aqui ainda,
São José é bem superior ao filho de Jacó. É nele que se realizam as promessas
feitas por Jacó a seu filho de predileção: — “José, filho que cresce... O Todo-Poderoso abençoar-te-á com as bênçãos
do céu e com as bênçãos do abismo profundo. As bênçãos de teu pai são fortalecidas
pelas bênçãos de seus pais, até que venha o objeto do desejo das colinas eternas:
repousem elas sobre a cabeça de José, sobre a cabeça daquele que é Nazareno
entre seus irmãos”(Gn. 49,22).
As
promessas de Deus cumprem-se devagar, mas com magnificência!
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