21/03 - Em honra a São José - excertos do livro

SÃO JOSÉ
Na Vida de Cristo e da Igreja
Pe. Maurício Meschler, S.J.
Edição de 1943


10. JOSÉ, “FILHO QUE CRESCE” 
Como vimos, são José está inseparavelmente unido à pessoa e a vida do Salvador. Está, portanto ligado    à própria origem, à base do cristianismo. Destarte, ele não podia deixar de receber,na Igreja, honras e culto correspondentes à sua dignidade. Esse culto tem suas raízesno relato do Evangelho, e desenvolveu-se maravilhosamente: o grão de mostarda tornou-se árvore magnífica. Essa lei de progresso lento, de crescimento apenas perceptível, é uma lei do cristianismo. Se ela se aplica a todo cristão, e ao próprio Salvador, então se verifica particularmente no que concerne ao pai nutrício de Jesus. No culto de São José poderíamos distinguir, de alguma sorte, diversas estações, como o fazemos com os meses do ano: poderíamos reconhecer um período preparatório, uma primavera, um verão.
O primeiro período prolongou-se até o século XII. Enquanto o Salvador, sua santa Mãe e grande número de mártires eram objeto de um culto público e de solenidades religiosas, não se acham, no correr dos primeiros séculos, ao menos exteriormente, senão vestígios relativamente pouco numerosos de uma homenagem prestada a São José. As circunstâncias explicam que, nos primeiros tempos, a memória dos mártires fosse honrada de preferência à dos outros santos. Na origem do cristianismo, tratava-se de defender contra os ataques do paganismo e da heresia a divindade de Jesus Cristo e o seu nascimento virginal, muito mais do que afirmar a sua descendência da raça de Adão e a realidade da sua humanidade. Sob este ponto de vista, ainda não era chegada a hora de prestar um culto público a São José. É uma lei da Providência Divina o fixar a toda criatura o círculo da sua ação, e pôr a vida e as diversas vicissitudes dessa vida em harmonia constante com o fito designado. Do mesmo modo que nesta terra, pela sua paternidade legal, São José velou por algum tempo a divindade do Salvador, assim também, mais tarde, desaparecendo, ele mesmo devia, pelo contrário, contribuir para focalizar ainda mais essa mesma divindade.
Todavia, os próprios séculos não deixaram de dar gloriosos testemunhos à grandeza do nosso santo. Os Doutores e Padres da Igreja — Justino, Orígenes, Efrém, Crisóstomo, Jerônimo, — nas suas homilias e comentários, comprazem-se em prestar homenagem a São José. Mais tarde, na Igreja do Oriente e em particular nos mosteiros e conventos, achamos duas festas instituídas em sua honra. A arte cristã — como tivemos ensejo de observar — mostra-nos em São José o chefe e o protetor da Sagrada Família. Temos disso um exemplo notável nos mosaicos de Santa Maria Maior, que datam do século V.
A primeira estação dessa devoção principia no século XII, ao menos para a Igreja do Ocidente. Nessa época é o culto de São José um fato historicamente atestado. Vozes possantes proclamam-lhe as grandezas: citemos São Bernardo, Ruperto de Deutz, Hugo de São Vitor, Ludolfo de Saxe, sem falar de tantas outras almas santas, como santa Margarida de Cortona, etc. A devoção de São José era cara à Ordem dos Dominicanos e à dos Franciscanos, destacando-se os eminentes mestres escolásticos Pedro Lombardo, Alberto Magno, Tomás de Aquino, João Duns Scotts, Boaventura, Durando e outros.
Mas é sobretudo no século XV que ela se expande. No concílio de Constança (1416), o douto Gerson, num discurso eloquente, pediu fosse instituída na Igreja uma festa em honra do santo; e o mestre de Gerson, o célebre cardeal Pedro d’Ailly, publicou o seu livro sobre as glórias e privilégios de São José. Em diversos lugares já se celebrava uma festa de São José, e por quase toda a Europa eram consagradas igrejas ao Patriarca. Esse movimento foi poderosamente secundado pelas pregações de três religiosos franciscanos: Bernardino de Sena (1418), Bernardino de Felto (1487) e Bernardino de Busto (1500), assim como pelo famoso livro do dominicano Isolani, pelos escritos teológicos do jesuíta Suarez (1617) e por Santa Teresa (1582), que colocou quinze de suas fundações sob a proteção de São José.
A devoção ao nosso santo teve o seu verão a partir do século XVII. O jesuíta Cotton (1626) introduzia-a na corte de França. Bossuet pronunciava o seu célebre panegírico de São José com tal êxito, que o papa Urbano VIII ordenou que a festa do santo fosse, na França, uma festa feriada. O imperador Leopoldo I, em ação de graças pelo nascimento do herdeiro do trono (José I) e pela libertação da cidade de Viena ameaçada pelos turcos, punha seus Estados sob a proteção do glorioso Patriarca (1677) e, com autorização do Papa, prescrevia que a festa dos Desposórios de José e de Maria fosse solenemente celebrada. Clemente XI (1714) compunha o ofício santo e ordenava-lhe a recitação na Igreja universal. Bento XIII (1726), por solicitação do imperador Carlos VI e de várias Ordens religiosas, introduzia o nome de José nas ladainhas dos santos.
Finalmente o zelo dos séculos XV, XVI, XVII e XVIII pela glória de São José teveo seu coroamento no século XIX. Realizando os desejos expressos, havia muito, por fervorosos servos do Pai nutrício de Jesus, Pio IX (1847) quis que a festa do Patrocínio de São José se estendesse a toda Igreja, que o mês de março todo fosse consagrado ao santo, que enfim José fosse proclamado o Padroeiro da Igreja universal. Isto em 1870.Por seu turno, a 15 de agosto de 1889, Leão XIII, em eloquente encíclica, recomendava a devoção a São José.
Como se vê, nada faltava de então por diante à glória do nosso santo. Foi quase desde a origem do cristianismo, no Oriente e, autenticamente pelo menos, a partir do século XII no Ocidente, que essa devoção se espalhou entre os fiéis. Ela foi sempre crescendo e se precisando. A Igreja secundou esse surto das almas piedosas evidentemente inspirada pelo Espírito Santo. Aprovou essa devoção, favoreceu-a. Cada século veio trazer sua contribuição ao monumento assim levantado em honra de São José. O povo, os artistas (desde o século XV, sobretudo), os teólogos, os escritores ascéticos, as Ordens religiosas, os santos e os sumos pontífices — todos trabalharam para a glória dele; e o trono em que o colocaram só é inferior aos tronos de Maria e do Salvador. Assim verificou-se a palavra do Senhor: — “Ele honra os que o honram”; “Aquele que foi o guarda de seu amo será louvado”; “O servo fiel será estabelecido sobre todos os bens de seu amo” (Prov 27,18).
Com que magnificência recompensou Jesus os fiéis serviços de seu pai nutrício! Com que liberalidade indenizou-o de uma demora que era conforme às disposições da Providência! Se a Igreja não prestou logo um culto público a São José, invoca-o agora como seu Padroeiro especial: — “Em vossas mãos está a nossa salvação”, diz-lhe ela; “Lançai sobre nós os vossos olhares, e com alegria serviremos o Rei” (Gn 47,25).
José, filho de Jacó, o ministro do Faraó, foi, segundo a Sagrada Escritura, “um filho que cresce”. Cada uma de suas provações trazia-lhe em definitivo um acréscimo de glória e de autoridade, quer Ele ainda estivesse debaixo das tendas do pai, quer na casa do sacerdote do sol, quer na prisão de onde saiu para se tornar o senhor do Egito. Aqui ainda, São José é bem superior ao filho de Jacó. É nele que se realizam as promessas feitas por Jacó a seu filho de predileção: — “José, filho que cresce... O Todo-Poderoso abençoar-te-á com as bênçãos do céu e com as bênçãos do abismo profundo. As bênçãos de teu pai são fortalecidas pelas bênçãos de seus pais, até que venha o objeto do desejo das colinas eternas: repousem elas sobre a cabeça de José, sobre a cabeça daquele que é Nazareno entre seus irmãos”(Gn. 49,22).

As promessas de Deus cumprem-se devagar, mas com magnificência!

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