CENTELHAS EUCARÍSTICAS
PEQUENA COLEÇÃO
DE
Pensamentos e afetos devotos
a
JESUS SACRAMENTADO
III
Ao
anoitecer
__________
MUITAS vezes eu
procuro alguma coisa que possa oferecer a Jesus e lhe dê consolação, mas apesar
da minha boa vontade quase nada encontro; é por isso que, chegando à noitinha,
me dirijo a Ele para obsequiá-lo com algum presentinho, mas vejo-me com as mãos
cheias de... Pobreza.
Ofereço-lhe as orações feitas, mas se
as examino um pouco, vejo que elas foram mais um amontoado de palavras distraídas
que uma coroa de afetos ardentes. E se as comparo com aquelas que Ele faz sem
cessar no Tabernáculo? Se as confronto mesmo com aquelas tantas inspirações que
Ele me segreda ao coração durante o dia? Verdadeiramente é preciso ter coragem
para se lhe oferecer de presente uma série de palavras sem correção... E,
contudo, sei que Jesus não se descontenta mesmo com este pouco... É tão bom o
meu Jesus!
Quando, porém, sofri alguma coisa por
Ele, ao anoitecer vou encontrá-lo de melhor vontade, porque sei que o
sofrimento lhe é mais caro do que toda a oração; e falo-lhe das penas do meu
coração, das angústias da minha mente, das violências suportadas pelo amor
próprio, dos incômodos que aqui e acolá sofreu o meu corpo, dos desprazeres que
procurei com a extravagância do meu caráter e dos que me foram presenteados
pelo capricho e temperamento dos outros, e digo-lho... Digo-lhe uma infinidade
de coisas na ingênua persuasão de merecer-lhe um louvor e uma bênção. Mas Jesus
bem depressa abate a minha presunção e a minha soberbazinha... Basta
recordar-me a sua Paixão e Morte; e então, adeus complacência! Compreendo,
então, que os meus sofrimentos, em confronto com os seus, não passam dum
brinquedo de criança! Mas, se não tenho coisa melhor, não lhe hei de oferecer nada?
Como Jesus é bom! Ele toma os meus
sofrimentos minúsculos, avizinha-os dos seus, e ei-los tornados grandes. Toma
as minhas penas de espírito c lança-as no abismo das suas; toma os meus
sofrimentos físicos e põe-nos em contato com os seus espinhos, com os seus
cravos, com as suas feridas, com a sua cruz; orvalha-os com um pouco do seu
sangue; e estes aproximamentos e contatos operam o prodígio de transformá-los
em sofrimentos seus, e deles alcançam
o mesmo mérito... Oh, como nos tornamos bem depressa ricos unindo-nos a Jesus!
O mal está em que, certas vezes, não
me recordo de fazer a Jesus os meus presentinhos. Àquele pouco que fiz ou
sofri, inutilizei-o todo com as complacências do amor próprio, quer nutrindo
despeitos por certas críticas imerecidas, quer saboreando a doçura de certos
elogios... E então, depois de ter inutilizado tudo, se venho a recordar-me de
Jesus, parece-me vê-lo sério, muito sério em atitude de perguntar-me: então são
estes os presentinhos que me fazes?
Sou sempre uma pobre criatura! Digo
sempre que hei de corrigir-me e não me corrijo nunca! Durante dois ou três dias
vou menos mal, mas depois volto ao princípio... Porém, consola-me um
pensamento: e é que a boa vontade não me falta; serei um pouco fraca de cabeça,
mas o coração, esse, graças
a Deus não o tenho mau: e quando se tem boa vontade, apresentando-se a gente a
Jesus, como faziam os leprosos, fazendo-se-lhe a exposição de toda a sorte de
misérias e pedindo-se-lhe a cura, Ele, agora como então, deixa-se comover e faz
a graça.
Se não fora este pensamento, quem ousaria ainda apresentar-se a Ele?
Se não fora este pensamento, quem ousaria ainda apresentar-se a Ele?
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