CENTELHAS EUCARÍSTICAS
PEQUENA COLEÇÃO
DE
Pensamentos e afetos devotos
a
JESUS SACRAMENTADO
IX
Aquele
dia
__________
RECORDÁ-lo-ei
sempre: enquanto sobre a terra houver um Tabernáculo, hei de levar-lhe sempre a
homenagem da minha gratidão para com Jesus.
Que alvor de graça não foi aquele!
Jesus olhava-me enquanto eu dirigia os meus passos não sei para onde...
Invocava o lume do Céu, e o Céu estava escuro como uma noite de tempestade;
volvia-me para a terra, e a terra estava envolta em trevas densas,
impenetráveis... Devia decidir-me... Resolver sobre o meu futuro... E estava só...
Desamparada...
O Jesus, que
fazias então, em tão cruéis momentos? Sorrias talvez de amor e de piedade para
comigo; e eu bem o senti naquela inspiração que me iluminou o coração depois de
tantas incertezas e temores...; enchi-me de coragem, e tu me mostraste o
caminho da salvação. Desde aquele momento o Céu tornou-se sereno, voltou a luz
a iluminar a terra... A minha sorte estava decidida, caminhava em direção do
Paraíso.
Ah! Se Jesus não me fizesse
aquela graça, quem sabe o que teria
sido de mim! Talvez tivesse errado o caminho; sem luz e sem guia, teria talvez
ido dar aonde tantas almas encontram o naufrágio e se perdem para sempre...
Tenho visto tantas almas a perder-se... Almas melhores do que eu... E porque é
que Jesus me preservou a mim da perdição e àquelas não? Quantos abismos e
mistérios de misericórdia se escondem no teu coração, ó Jesus!
Aquele dia foi a aurora da minha
salvação; após a madrugada veio o meio-dia. Livre já do perigo de ser perdida,
certa da minha vocação, Jesus nunca me abandonou. Recordo aquela vez em que me
debatia com a tentação de abandonar o caminho encetado, amedrontada com as
dificuldades crescentes e com as tentações cada vez mais galhardas; recordo a
dúvida tremenda, que me assaltou, de ter errado a estrada e o projeto
fantástico de começar uma vida, que me parecia mais perfeita, só porque era
mais cômoda; recordo a angústia quase desesperada do meu pobre coração; recordo...
Oh como recordo bem! Aquela visita feita naqueles momentos à Eucaristia! Ó
Jesus! Como foi clara, como foi potente, então, a tua voz! Se não me tivesses
falado estaria perdida... E assim estou salva! Como poderei esquecer aquele dia?
Diante de mim apresentou-se uma
estrada mais estreita, mais espinhosa, mais ríspida... Era a estrada de uma
maior perfeição. E Jesus queria que caminhasse por ela. Eu, porém, via-me
manietada, como que tomada de terror. E não havia um meio termo: ou andar para
a frente ou voltar para trás... Retroceder seria o mesmo que renegar a Jesus;
andar para a frente era uma deliberação que exigia de mim um sacrifício enorme,
dilacerante, imprevisto... Acabrunhada, quase envilecida, sem a menor energia
para nada, só me restava a força de olhar para Jesus... E eu olhava para Jesus...
O que então aconteceu sabemo-lo Jesus
e eu somente. Aquele
sacrifício consumou-se... E quanto sangue não verteu o meu coração! Depois de tantos
anos, a cicatriz ainda não fechou de todo. Mas, não importa; eis-me no caminho
da perfeição... A hora final aproxima se com rapidez... Não sou eu que corro, é
Jesus que me leva, que me impele... Que seria hoje de mim, ó Jesus, se não me
tivesses inspirado aquele momento de heroísmo?
Graças, ó doce esposo da minha alma,
graças infinitas eu te rendo! Poderei esquecer as lágrimas e as dores do meu
passado, mas nunca esquecerei aquele dia que tu sabes; e enquanto a memória
conservar o tesouro de tal recordação, o meu coração baterá as palpitações da
mais terna gratidão para contigo.
Já sobre o limiar da eternidade, eu
te peço ainda uma graça. Há muitas almas, ó Jesus, que são como eu era antes
daquele dia. Tu conhece-las bem... Tem piedade dessas infelizes e renova em
favor delas a misericórdia que usaste para comigo... Manda-lhes um raio de luz,
aquele impulso poderoso ao coração, aquela fascinação para a virtude... Elas te
servirão melhor do que eu, com mais fervor, com uma constância mais perfeita,
com heroísmos mais belos... Ó Jesus, eu te recomendo aquelas almas... Não me
recuses uma graça tão bela... Que a alva daquele
dia desponte também para elas... Que bem
necessitam dela!
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