CENTELHAS EUCARÍSTICAS
Semelhanças
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EM certas horas encontro-me tão triste,
que até a própria vida me pesa. Mas, refletindo um pouco, vejo que é tudo
questão do amor próprio ofendido, ou d'alguma paixão contrariada.
Disseram-me alguma palavra
humilhante, mimosearam-me com exprobrações injustas ou palavras injuriosas, fui
malsinada por aqueles mesmos cuja estima me é tão cara e preciosa... E por tudo
isto me deixo dominar da melancolia? Que cabeça pequenina não é a minha! Não
foi Jesus tratado pior do que eu? Não lhe chegaram a dizer que era dado ao
vinho, que era um furibundo, um possesso do demônio? Portanto, porque hei de
entristecer-me? Reparando bem, toda esta aparente desonra que me aflige, não
representa senão um traço de semelhança entre mim e Jesus... E será isto um mal?
Como? Eu assemelhar-me a Jesus? Eu
pensava que para isso bastava orar um pouco como Ele, trabalhar um pouco como
Ele, dizer algumas palavras santas como as suas, fazer algumas carícias às
crianças, arremessar algumas setas contra os escribas e fariseus, como era seu
costume... Mas esquecia que tudo isto é muito pouco e que, para ter parecenças
com Jesus, tenho de tomar uma certa cruz, e com a cruz quantas coisas amargas e
pesadas!
E, contudo, é assim mesmo: a
semelhança com Jesus demanda humilhações e humilhações, e depois ainda
humilhações. E preciso ser-se mal compreendido e interpretado nas coisas mais
evidentes e mais justas; passar por hipócrita quando se é franco e sincero; ser
tido por egoísta quando se fez um sacrifício pelo próximo; ser acoimado de
imbecil quando se perdoa e se ama um ofensor; ser perseguido pela calúnia pelo
temor que uma virtude nossa vá ofuscar o falso esplendor duma hipocrisia; ser
amaldiçoado quando só bênçãos se mereceram... São coisas que queimam a alma
como botões de fogo; mas como lhe fazem bem!
Que prazer, quando se tem os olhos
cheios de lágrimas, poder dizer, olhando o Tabernáculo: Também Jesus chorou
assim; quando o coração trasborda de amargura e de dor, poder dizer: Também
Jesus sofreu assim; quando se cai por terra sob o peso duma
cruz enorme, poder dizer: Também a Jesus aconteceu
assim. São gostos estranhos para o mundo, mas para a alma eucarística tem uma
tal doçura e sublimidade, que ela estaria sempre sobre
a via do Calvário para granjeá-las todos os dias... Para a alma eucarística...
Mas para mim, que sou muito diversa, como encontro eu estes gostos?
Agora, compreendo porque quando olho
o Crucifixo sinto no coração um não sei quê, como que um remorso... Acontece-me
como a uma vaidosa que, vendo-se ao espelho, se encontra disforme...
Basta; já sei onde está o retrato de Jesus. Irei contemplá-lo e farei confrontos. Serão odiosos à minha soberba, mas paciência!
Afinal, tendo eu sofrido tantas coisas no passado para aviltar a minha alma,
serei agora uma louca se sofrer um pouco para me assemelhar a Jesus?
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