Capítulo VII - Como chamar-Lhe?

CENTELHAS EUCARÍSTICAS
 PEQUENA COLEÇÃO
DE
Pensamentos e afetos devotos
a
JESUS SACRAMENTADO



VII
Como chamar-Lhe?
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NÃO sei, realmente, que nome deva dar às minhas comunhões, principalmente em certas manhãs.
Chamo-lhe comunhão, só para dar-lhe um nome menos impróprio: mas a minha comunhão não é certamente aquela que fazia dizer a São Paulo: Vivo eu, já não eu, mas vive Cristo em mim. Ah! Como eu estou longe das comunhões do grande Apóstolo!
Jesus vem a mim; isso é verdade: mas entre Jesus e a minha alma que união se forma? Quando muito não passa duma tal ou qual aproximação, mas nunca união feita de modo a formar quase uma só coisa.
Vejamos um pouco o que sucede. A Hóstia desceu dentro de mim, portanto Jesus está todo dentro do meu ser. Mas qual é o laço que nos une? As nossas mentes? Oh, pobre de mim! A mente de Jesus está toda cheia de pensamentos santos, e a minha, quando não está cheia de tentações, é pelo menos batalhada por fantasias sem nexo, e raras são as vezes que pode conservar um bom pensamento por um quarto de hora. E sendo as nossas mentes tão contrárias, como poderão unir-se de modo a formarem uma só?
Unir-se-ão os nossos corações? Tremo só em pensá-lo. O meu coração unido ao Coração de Jesus! Mas como é possível? O seu, sabe o Paraíso como é, sabem-no os santos e os anjos, e eu também o sei um pouco: é, para o dizer em uma palavra, o santuário de toda a pureza e de toda a santidade. E o meu o que é? Sabe-o o meu confessor, que muitas vezes lhe apalpa as chagas e se esforça em vão por curá-las; sabe-o o demônio, que quase todos os dias lhe deita dentro mãos-cheias de lama; sabe-o o meu bom Anjo, que tantas vezes se entristece por minha causa; sabe-o Jesus, que todos os dias se vê condenado a viver, não em um trono, mas em uma prisão; sei-o também eu que sinto o seu peso, as suas rebeliões, os seus remorsos. E dois corações que são entre si pouco menos que uma contradição viva, como poderão fundir-se juntamente? Já não é pequeno favor que o de Jesus esteja perto do meu sem fulminá-lo...
E se há tal disparidade e contraste entre Jesus e mim, que espécie de união se forma entre nós, quando O recebo? Agora compreendo como os Santos eram uma coisa e eu sou totalmente outra! Eles pensavam e amavam como pensa e ama Jesus: e eu penso e amo... A meu modo, conforme me apraz. Daqui resulta que na comunhão Jesus e eu nos encontramos perto um do outro, mas como dois bons vizinhos de casa, que se tratam cortesmente, trocando-se reciprocamente palavras cordiais e atos gentis. Mas não são duas almas, fundidas uma na outra, como as de Jonatas e David, de uma extraordinária semelhança e quase identidade de tendências e de afetos.
Portanto, como hei de chamar a minha comunhão? O nome pouco importa; a coisa em si é que é tudo, isto é fazê-la de modo que corresponda quanto possível ao fim para que foi instituída. Jesus não se contenta com encontrar as almas que estejam sem pecado, porque então encontra-se pouco mais ou menos como dentro da píxide, que é limpa e dourada, mas sempre fria. Ele quer que eu pense como Ele pensa e o ame conforme Ele ama; quer que eu em todas as coisas me esforce por estar de acordo com Ele, quer que eu ame a caridade, a paciência, a pureza, o sacrifício... Quer, em suma, que recebendo-o uma vez, viva d'Ele e jamais de mim mesma.
Viver de Jesus?... Não viver mais de mim mesma?... Meu caro Jesus, como se conseguirá viver assim? Da minha parte penso que, só por mim, não o conseguirei em cem anos... Portanto, ó Jesus, que farei? Deixar-te estar e não te receber mais? Não o posso fazer. Receber-te sempre e proceder como antes... Não quero. Portanto?...

Portanto, resolve tu a dificuldade, ó Jesus. Eu, por mim, deixo-te livre a entrada no meu coração... Prometo-te que não farei oposição aos trabalhos da tua graça... Vem, fere, derruba, esmaga, edifica... Fazei tudo o que quiseres, contanto que a minha Comunhão seja... uma verdadeira Comunhão.

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