Capítulo XIII - A hora avizinha-se

CENTELHAS EUCARÍSTICAS
 PEQUENA COLEÇÃO
DE
Pensamentos e afetos devotos
a
JESUS SACRAMENTADO



XIII
A hora avizinha-se 
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O tempo que passo vizinho a Jesus voa rápido como qualquer outro; à medida que eu oro, avanço para a morte. A morte! Quem sabe quando soará a hora tremenda! Sabe-o Jesus, mas não mo diz. Tantas outras coisas me revela claramente ao coração, mas esta não... Devo, portanto, caminhar às cegas, sempre preparada para baixar à sepultura. Paciência! Também eu irei para debaixo da terra; mas, antes disso, quero pensar um pouco, prever o meu caso.
Morrerei... Eu que sinto tanta repugnância em romper certos hábitos, dever quebrar o fio da vida, que é a prerrogativa mais cara, por ser a mais preciosa e antiga!... Morrer significa não entrar mais em um templo, não ver mais nenhum altar, não olhar mais a Hóstia, não mais fazer a comunhão... Significa encontrar-me com Jesus em relações muito diversas das presentes. Quais?
Agora, para ajudar-me a conciliar o recolhimento, figuro-me ver Jesus no Sacramento, todo sorrisos e doçura, todo amor e bondade, todo ternura por mim. Mas, quando morrer, quando exalar o último suspiro, vê-lo-ei porventura assim? Ou me aparecerá de rosto sombrio, severo e ameaçador?... A falar a verdade, junto do Tabernáculo, não é possível encontrar um Jesus terrível... A Eucaristia é por excelência o sacramento do amor; como se pode, pois, conciliar um Jesus-amor com um Jesus-terror?
Que eu tenha de morrer em pecado mortal... Isso não entra nos meus cálculos; espero... Antes, por força da esperança cristã, tenho a certeza que isso não acontecerá. Na pior das hipóteses, morrerei com algum débito a pagar à Justiça divina. Portanto, quando comparecer diante de Jesus, como o encontrarei? Como olhará para mim? Como me tratará?
As circunstâncias secundárias deste encontro não as conheço, nem posso adivinhá-las; mas é certo que Jesus não terá, então, perdido o seu Coração, que ama sempre as suas criaturas, mesmo quando morrem. Portanto, mesmo que me mande para o Purgatório, fará como um pai que afasta de si um filho e o manda limpar-se da lama em que caiu, desejando que volte depressa para o acolher em seus braços e cobri-lo de beijos e carícias. Eu penso que Jesus fará assim, porque, se agora me ama tanto, sendo eu tão má, também me amará então; e se me mandar sofrer um pouco, será pelo amor que me tem, para me ver depressa digna d'Ele, de todos os seus dons e ternuras.
Demais, também não é certo que eu deva ir para o Purgatório. Que eu o mereça, não há dúvida nenhuma! Mas que eu tenha de ir para lá, o amor e a misericórdia de Jesus lançam no meu espírito certas dúvidas... Pois as indulgências plenárias in articulo mortis são concedidas porventura a quem não necessita delas? A quem morre abrasado nas chamas de uma caridade perfeita? Pelo contrário, são oferecidas àquelas almas que dia a dia se agravam de dívidas para com Deus... E é Jesus que concede à Igreja esse tesouro inexaurível. Portanto, se eu realmente o desejo, posso morrer em condições de esperar a minha entrada imediata no Paraíso, o gozo imediato do meu Jesus.
Que dizes tu, ó Jesus? Raciocino mal? Espero que não. Seja, porém, como for, eu não posso habituar-me à idéia de ver-te indignado contra mim, quando pela primeira vez eu te vir fora da Hóstia... Não creio que tu, ao comparecer perante ti após a minha morte, me acolhas entre os raios da tua cólera. Estarei em erro, talvez... Mas não posso figurar-me Jesus, senão cheio de bondade, divinamente bom e misericordioso.
Mas, suponhamos, na pior hipótese, que eu tenha também de sofrer o meu Purgatório. Nesse caso, ó Jesus, enquanto estou em tempo, eu peço te ainda uma graça... É a última, e não ma negues! Se eu tiver de sofrer depois da morte, quero cumprir a minha pena perto de ti, ou, melhor, dentro do Tabernáculo. Se tiver de chorar, quero que as minhas lágrimas de fogo caiam dentro da píxide; se tiver de gemer, quero que os meus gemidos se confundam com as melodias do Pange lingua e do Lauda Sion; se tiver ainda de ser infeliz, quero sê-lo abraçada ao Ostensório; se tiver de cair sob os golpes da justiça, que o seja muito embora, mas que possa olhar o teu Coração, murmurar o teu nome, bendizer o teu amor...
Eis a graça que te peço, ó Jesus. Portanto, ou me fazes tornar santa antes de morrer, ou santifica-me depois da morte entre as hóstias dos teus tabernáculos.

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