CENTELHAS EUCARÍSTICAS
PEQUENA COLEÇÃO
DE
Pensamentos e afetos devotos
a
JESUS SACRAMENTADO
XV
Alma
distraída
__________
QUANDO oro, desejaria estar toda
recolhida em Jesus, como que encarcerada no Tabernáculo e encadeada à píxide...
Mas, ao contrário, sou flagelada pelas distrações contínuas, e não consigo
estar atenta um minuto sequer.
Como seria belo ter a mente toda
ocupada em Jesus, a imaginação toda
impregnada de Jesus, o coração todo
palpitante por Jesus, a alma toda absorvida
em Jesus! Seria belo, mas essa beleza não é para mim.
Mas, porque é que todos os outros
estão recolhidos e só eu estou distraída? Não será isto um castigo pelas distrações
voluntárias doutros tempos? Não me admiraria de que assim fosse. O certo é que
dantes não fazia nenhum esforço para estar recolhida, e passava todo o tempo da
oração a fantasiar, a correr com o pensamento atrás de mil bagatelas e até
mundanidades; assim a Missa, as prédicas, as meditações, as leituras passavam...
Isto é, Jesus passava-me vizinho, muito vizinho, e eu não o via; Jesus falava-me,
e eu não lhe dava ouvidos; Jesus mostrava-me o Coração transbordante de amor e
de graças e eu tudo desprezava... Agora, que eu o procuro, é que não o encontro
nunca.
Creio, realmente, que as presentes distrações
são um castigo das distrações passadas. Jesus está perto de mim, eu avizinho-me
d'Ele, Ele escuta-me, porque vê em mim a boa vontade de falar-lhe... Mas a doce
satisfação de deixar-me gozar da sua presença, essa não ma dá.
Talvez as minhas orações atuais sejam
mais meritórias, porque as faço com dificuldade e sem gosto, mas o fato é que
são para mim uma verdadeira penitência. Ah! Como é doloroso falar a Jesus e não
o ouvir responder! Saber que Ele me quer bem e não ouvir uma palavra de amor!
Esforçar-me por lhe falar só a Ele, e enquanto falo não ver com o pensamento
senão criaturas banais, ordinárias e até mal comportadas!
Ah! Se quando eu era jovem me tivesse
habituado a refrear um pouco a fantasia! Se tivesse feito melhor a meditação!
Se tivesse tomado a peito as coisas da alma e da eternidade!... Que doçura não
sentiria agora quando me encontro ao pé de Jesus... Como iriam bem as minhas
orações!
Mas, paciência! Fiz o mal, agora faço
penitência. Mas, lembra-te bem, ó minha alma, que esta penitência consiste exatamente
em continuar a orar mesmo com distrações, sem perder a coragem e sem ter jamais
uma só gota de doçura. Ainda mais: deves persuadir-te de que, quando fazes o
possível por estar recolhida, quanto mais a tua oração é árida e distraída,
tanto mais cara é a Jesus e meritória; e se te não proporciona consolações no
tempo, prepara-tas para a eternidade.
Portanto, tomarei a cruz como Deus quer
que a tome, e orarei... Como posso e não como quero. As minhas intenções
sabe-as Jesus, e vê também os meus desejos. Ponho tudo em suas mãos.
Pensando bem, até nisto se mostra um
pouco a misericórdia de Jesus. Nas condições em que me encontro, não poderia
fazer grandes penitências materiais... E os meus débitos com Deus são
certamente gravíssimos. Portanto é para mim uma grande graça poder fazer uma
penitência conciliável com a minha pouca saúde e as minhas ocupações, uma
penitencia de todos os lugares, de todas as horas, ignorada de todos... De
manhã volverei o meu olhar para Jesus, oferecendo-lhe o meu coração, todas as
ações do dia, pedindo-lhe que me abençoe; e Jesus escondido e mudo... Que
penitência! Durante o dia, à Missa, à comunhão, à visita e em muitas outras
circunstâncias lhe confiarei as minhas grandes necessidades; e Jesus continuará
a estar escondido e mudo... Que penitência! À noite, faminta de conforto,
depois das minhas fadigas, e talvez depois de muitas amarguras, eu orarei...
Isto é, esforçar-me-ei por orar com recolhimento e fervor, sem o conseguir; e
Jesus sempre, como antes, escondido e mudo! Que penitência!
Ó caro Jesus! Vê-se bem que, sobre
este ponto, não
queres ceder, e me
condenas a sofrer na ocasião em que eu mais esperava ser confortada...
Paciência! Mas recorda o que tantas vezes tens prometido — que a penitência é a
moeda mais preciosa para comprar o Paraíso...
Portanto, ó Jesus, com as minhas
involuntárias distrações eu compro o Paraíso; e tu me darás esse Paraíso depois
da morte, exatamente porque durante a vida fui involuntariamente distraída...
Vai bem assim?
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