CENTELHAS EUCARÍSTICAS
PEQUENA COLEÇÃO
DE
Pensamentos e afetos devotos
a
XVII
Tenho medo
__________
TENHO
visto mais de um a morrer... Às vezes
encontram-se motivos de consolação; mas quantas vezes o nosso espírito fica
aterrado! Ao ver a resignação, que em muitos acompanha os espasmos da agonia, o
coração enternece-se e sente-se inveja daqueles moribundos; ao assistir aos
últimos arrancos da morte, sente-se o peito oprimido de terror. Como suportar
sem um lamento e uma impaciência os tormentos da última hora?
Não se pode escapar aos horrores da
morte: ou ser-se colhido de improviso — morte de que Deus nos defenda — ou
morrer-se lentamente... E então quantos sofrimentos! Chega-se a um ponto em que
não há um só membro que não sofra, em que da cabeça aos pés se é atormentado,
como... Tantos e tantos que tenho visto.
Agora as minhas enfermidades são
limitadas e posso suavizar-lhes a amargura de mil maneiras. Mas então já não
haverá nenhum remédio, e todo o esforço dos médicos será dirigido a
prolongar-me os martírios por mais algum tempo... Impedir-me-ão por algumas
horas de morrer, mas não de sofrer. E eu que sinto tremer e gelar-se-me o
coração ao ver os outros nas ânsias da morte, que será quando me vir eu mesma
nos estertores da agonia? Quando sentir meus lábios secos e a língua enregelada?
Quando com o peito oprimido me faltar a respiração? Quando os meus membros
forem sacudidos pelas garras da morte? Quando... Ah! Que farei eu então?
Que sentirei
no coração quando chegar a hora da Extrema-Unção? Quando começarem a recitar o Proficiscere?
Quando os entes caros, longe de me
dizerem que hei de vencer a doença, começarem a infundir-me coragem e
resignação, a falar-me nos gozos do Céu, no Paraíso?... Mas estas palavras,
conquanto consoladoras, não serão para mim um puro e simples sinônimo de morrer?...
E como estarei eu disposta a deixar
tudo e partir para o mundo de além?
Se penso seriamente em todas estas
coisas, sinto-me realmente apavorada. Contudo, ou amedrontada ou tranquila, a
minha última hora chegará... E, então, quem me ajudará? Não é
mister pensar muito para responder: o
único que nesse momento me poderá prestar auxílio é Jesus. Se Ele me falta,
falta-me tudo, e eu ficarei só com as minhas dores e os meus receios.
Mas Jesus não me faltará... Tenho
visto que nunca faltou a ninguém. Ao contrário, tem-se aproximado daqueles que
sempre o têm odiado, com a esperança de os salvar. E não o terei eu, então,
junto de mim, tendo-lhe sempre querido tanto bem? E, tendo então perto de mim o
meu Jesus, poderão as minhas últimas horas ser assim tão más? Espero que não.
Terei, portanto, pungentes dores por
todo o meu corpo; mas Jesus se mostrará à minha fé, ou preso à coluna e
flagelado, ou pendente do madeiro da Cruz, e me dará um pouco daquela
resignação, que tinha Ele mesmo entre tão cruciantes tormentos. Sentirei
angústias no coração e a vista da eternidade me causará um terror pânico, mas
Jesus saberá dizer-me alguma daquelas palavras, que fazem sorrir os moribundos
e lhes arrancam lágrimas de consolação. Experimentarei talvez certos temores,
mas Jesus que tem acalmado tantos, acalmará também os meus.
Afinal, eu pergunto a mim mesma: é
possível que Jesus me abandone, quando eu estiver para morrer, tendo-lhe eu
sempre pedido a graça de expirar entre os seus braços, e tendo experimentado
tantas vezes na vida as doçuras da sua caridade? Ter-me-á concedido todas estas
doçuras para me enganar? Oh! Não! O dizê-lo seria uma blasfêmia, e eu nem mesmo
o quero pensar...
É possível, pois, que Jesus me
abandone e me deixe só a lutar com os tormentos da morte? Ó Jesus, com o
Coração que tens será isto possível? É possível que esteja eu a sofrer e o Teu
Coração fique insensível no Tabernáculo e não corra a confortar-me?... Todos os
dias a Comunhão, e na hora da morte a separação... Será possível, ó Jesus?
Agora tantas esperanças e depois um enorme desengano... Será possível, ó Jesus?
Agora dizer cem e mil vezes ao dia meu Jesus, e
dever então concluir que tu já não serás meu...
Ó Jesus, será possível?
Eu não arredarei um só passo do
caminho da minha esperança. Crerei sempre, esperarei sempre, e direi sempre que
jamais serei
abandonada por ti, nem agora, nem depois. Desde já considero como feita essa
graça de ser ajudada por ti em todas as minhas necessidades, de ser assistida
pessoalmente por ti, de exalar o último suspiro sobre
o teu
Coração e de morrer, como tenho visto
tantos outros... Com o teu nome sobre os meus
lábios, com o teu amor dentro do meu coração, com o teu Paraíso seguro entre as
minhas mãos.
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