Capítulo XXXV - Um empenho de amor

CENTELHAS EUCARÍSTICAS
 PEQUENA COLEÇÃO
DE
Pensamentos e afetos devotos
a
JESUS SACRAMENTADO



XXXV
Um empenho de amor
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PORQUE amo tão pouco o meu Jesus? Porque é que eu procedo dum modo que ocasiona um verdadeiro dano à minha alma e é um agudo espinho que fere o coração do meu Jesus? Para dizer tudo, porque deixo eu às vezes de fazer a Comunhão? Não é por falta de tempo, porque, indo à Missa todas as manhãs, poderia perfeitamente abeirar-me da Mesa Eucarística; e mesmo que dispusesse de pouco tempo, antes que abandoná-la, poderia contentar-me com uma preparação e ação de graças muito breves, reservando-me os momentos vagos durante todo o dia para me entreter com Jesus. Também não é por causa das minhas quotidianas venialidades, sabendo eu perfeitamente que os pecados veniais não impedem a Comunhão, mas devem, ao contrário, ser um incentivo para fazê-la, desde que se peça a Jesus o seu perdão. Portanto, porque não faço eu todos os dias a Comunhão, quando com um pouco de boa vontade poderia sempre fazê-la?
A razão é esta: é que até hoje não mostrei um empenho sério a este respeito; amo a Jesus, mas não tanto que sinta alguma pena no coração quando, sem necessidade, renuncio a recebê-lo. Não penso que, se o omitir a comunhão quotidiana não é um pecado, é pelo menos uma indelicadeza, que Jesus não merece. Todos os dias renovo a resolução de não cometer pecados, mas jamais fiz o propósito firme de fazer todos os dias a Comunhão, e por isso, não tendo o coração empenhado neste ponto, facilmente tomo a liberdade de fazê-la, conforme, ao despertar de manhã, sinto ou não essa inclinação. Se eu considerasse a comunhão quotidiana como um dever, ou ao menos tomasse a resolução séria de fazê-la sempre, não a descuraria com tanta facilidade.
Portanto, para chegar a uma conclusão prática, eu hoje quero tomar um duplo empenho: um a meu respeito, outro a respeito de Jesus. Quanto a mim, desde hoje me empenharei em procurar para a minha alma todo o bem que eu puder; e como o maior é sempre ter Jesus no coração, prometo seriamente recebê-lo todas as vezes que puder, isto é, todas as manhãs. Com relação a Jesus, como Ele nenhuma coisa deseja com mais ardor do que habitar no meu coração por meio da Comunhão, e deseja isto todos os dias, por isso resolvo dar-lhe todos os dias essa consolação, embora me custe algum sacrifício.
Tomando este empenho, eu vejo-me como que obrigada a fazer a Comunhão quotidiana, de modo que, deixando-a sem uma razão séria, eu devo sentir no coração algum remorso; e se por acaso a preguiça, a meticulosidade ou qualquer outro pretexto pretender afastar-me de Jesus, subitamente uma voz de exprobração me gritará ao coração: Como! Depois de teres prometido fazer a Comunhão quotidiana, abandona-la agora... E por tão pouca coisa? Jesus espera-te, e tu és tão preguiçosa que o deixas só? E se, nesta Comunhão que não queres fazer, Ele estivesse resolvido a enriquecer-te com alguma graça extraordinária?
Não quero que na minha conduta se repita o absurdo de me entusiasmar por certas vantagens secundárias, postergando outras de importância imensamente maior; isto é, de tomar grande empenho e obrigar-me até o ponto de sentir escrúpulos, se não faço uma determinada oração, uma prática de piedade ou uma mortificação todos os dias, e mostrar-me indiferente em fazer ou não a Comunhão quotidiana. Haverá uma ação mais bela, mais vantajosa e mais cara ao Coração de Jesus que a santa Comunhão? Portanto, por que ligar-me com empenho a poucos Padres Nossos, a uma terça parte do Rosário, a uma abstinência, a um jejum, e não empenhar-me em receber todos os dias o meu Jesus? À noite, quando estou para deitar-me, mais de uma vez me acontece recordar-me de que não recitei uma oração imposta por alguma confraria a que pertenço; pois, apesar de violentada pelo sono, tenho sempre resistido, não adormecendo enquanto não cumpro o meu dever. E por que, de manhã, não procedo eu do mesmo modo com relação à Comunhão? Não merece porventura Jesus mais atenções e mais amor que um Santo, um Anjo e a própria Maria Santíssima? Oh! Como seria belo, se se instituísse também, à semelhança de muitas outras, uma Confraria ou Associação para a Comunhão quotidiana?
Ó Jesus, eu prometo hoje ligar-me a ti por uma nova cadeia; eu me obrigo a fazer todas as manhãs a Comunhão, desde que as forças e o tempo não me faltem; e peço-te, ó meu doce amor, que, se faltar à minha promessa, me enchas o coração de tanta amargura e tão grande pena, que eu não venha a faltar mais à minha palavra; e se porventura me for impossível fazer a Comunhão sacramental, eu te prometo fazer a espiritual. Com este propósito, eu entendo unir-me sempre mais ao teu Coração e constrangê-lo a amar-me sempre mais, a abençoar-me todos os dias com novas bênçãos e a inscrever-me desde hoje no livro dos eleitos. Portanto, ó meu Jesus, eu espero que a Comunhão quotidiana será desde hoje como uma necessidade imprescindível do meu ser, uma obra necessária ao meu organismo espiritual. Oh! Como passarão belos e serenos os dias que me restam de vida! Todas as manhãs encontrar-me com Jesus! Todas as manhãs lavar a minha alma no seu Sangue! Todas as manhãs empenhá-lo em dar-me a vida eterna! Todas as manhãs procurar-lhe a mais bela consolação da sua vida eucarística!
A minha resolução está tomada: salvo o caso de verdadeira impossibilidade, todas as manhãs receberei o meu Jesus... Haverá sobre a terra dias sem sol, mas, na minha vida, não haverá nenhum sem Comunhão.

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